MINHA VIDA DE CADETE NA AMAN

por: SANTOS, João Bosco Camurça Marques dos. Minha vida de cadete −
a saga
de um Cadete da Academia Militar das Agulhas Negras 1959/62 .(Análise do original).

Cel Cláudio Moreira Bento*

 

( Apreciação solicitada pelo autor do livro para tentar buscar apoio editorial do Governo Federal)

Preservador, pesquisador, cultor e divulgador da História, Tradições e Valores morais, culturais e históricos da Academia Militar das Agulhas Negras(AMAN) hoje, creio, o seu historiador e o maior colecionador de fontes, bibliográficas, hemerográficas e documentais de sua História e disponíveis na sede Administrativa da Academia de História Militar Terrestre do Brasil (AHIMTB) na AMAN, ao lado também de fontes por nós colecionadas de História da cidade de Resende. Tarefas estas que iniciamos em 1978, como instrutor de História Militar da AMAN. Assim, considero a obra em epígrafe, a mais completa e abrangente até hoje produzida de resgate da vida do cadete do Exército, na Academia Militar das Agulhas Negras e em Resende.

Seu autor, o Tenente Coronel João Bosco Camurça Marques dos Santos, uma revelação providencial como memorialista de alto nível, escreveu suas Memórias da AMAN, como se ainda fora um cadete, cujo espirito incorporou. Ele abordou com precisão detalhada e muito realismo, aplicando o método de Descartes na divisão de sua abordagem, escrevendo com intimidade, como se estivesse conversando com todos os cerca de 30.000 cadetes que cursaram as Agulhas Negras nos últimos 60 anos.

Merece destaque especial a sua análise precisa das finalidades de cada matéria que cursou, bem como o perfil de seus mestres. E, inclusive, os apelidos com que foram batizados pelos cadetes. Aborda-os como se estivesse a falar numa roda fechada com seus colegas. E, entre seus mestres, destaca por suas virtudes, entre outros, Cecil Wall Barbosa de Carvalho e Antônio Esteves, os fundadores do Ensino Superior Civil em Resende, na AEDB; Geraldo Levasseur França, admirado e estimado mestre de Descritiva em diversas escolas de Resende; Rubem Rosadas, mestre de Psicologia, e Francisco Ruas Santos, mestre de História Militar, todos ligados à nossa Academia de História Militar Terrestre do Brasil. Revela apreço a seus mestres, o que não constatei numa exposição de um antigo oficial no Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro em que recordava seus mestres militares com irreverência e desconsideração, não lembrando suas contribuições para sua formação. Foi quando comentei com o hoje patrono do CAN, Brigadeiro Nelson Freire Lavenère Wanderley, ao meu lado: −Curioso como alguns alunos militares demoram a reconhecer o mérito de seus mestres os tratando com desrespeito! E ele me respondeu: − E põe tempo nisso!

De igual modo, recordou o comandante e o subcomandante da AMAN de seu tempo e os respectivos apelidos. Estes, pouco mais tarde, respectivamente Vice-presidente da Republica, o General Adalberto Pereira dos Santos, e o Presidente da República, o General Emílio Garrastazu Médici. Este seria comandante da AMAN em 1964, antes de ser presidente, cuja memória evocamos na História da 3ª Região Militar, v.3, na qual imprimiu este espirito como seu comandante assinalado "Servir e servir cada vez melhor."

O autor recorda por nomes e apelidos diversos instrutores e, em especial, os do Curso de Intendência que freqüentou.

Ao longo de sua obra, resgata e preserva uma expressiva quantidade de bordões usados pelos cadetes e que permanecem na memória acadêmica, bem como a alentada gíria dos cadetes em seu glossário de gíria que veio complementar o publicado na hoje esgotada Revista do Clube Militar nº Especial dedicado ao sesquicentenário da AMAN, em 1962. Efeméride contada a partir de 1812, da criação da Academia Real Militar, em realidade a sucessora da Real Academia de Artilharia, Fortificação e Desenho, criada em 17 de dezembro de 1792, no aniversário da Rainha D.Maria I, pelo Vice-Rei Conde de Resende, o criador da cidade e município de Resende, em 1801, e do ensino militar acadêmico nas Américas e do ensino superior civil no Brasil, em 1792.

Camurça é preciso na percepção e resgate de todos os aspectos pontuais relacionados com a vida dos cadetes, recordando acidentes, tipos populares na AMAN e em Resende, aventuras acadêmicas, código de relacionamento de veteranos com seus bichos, sotaques regionais, cadetes estrangeiros, o humor acadêmico, sem omitir a vida romântica, amorosa e íntima de alguns cadetes. Esta por ele denominada na Periferia do pecado em Resende, Barra Mansa e Rio de Janeiro. A sua abordagem me recorda a feita pelo mais tarde General Bertoldo Klinger de seu curso em 1899/1890, na Escola Preparatória de Rio Pardo, onde foi o mais brilhante aluno que por lá passou e que não deixou passar nem um detalhe da vida naquela escola, permitindo-nos resgatar, ou melhor, ressuscitar aquele educandário, em nosso livro As Escolas do Exército em Rio Pardo, onde estudaram dois futuros Presidentes da Republica, Getúlio Vargas e Eurico Gaspar Dutra, e o Marechal Mascarenhas de Morais, o comandante da FEB . Foi muito proveitosa a leitura dessa obra dentro do pensamento de que recordar é viver .E, ao lê-la, fui levado diversas vezes ao riso prolongado e incontido, pelo resgate que ele fez de apelidos, bordões, gíria e humor acadêmico. E creio que todos os ex-cadetes que o lerem, com o espírito do cadete que foram um dia, terão igual ou maior reação .

Notável, diria, a percepção sociológica do memorialista Camurça, ao observar que os cadetes eram colocados nos apartamentos mesclados por origens escolares e de naturalidade, para melhor se integrarem e formarem novas amizades. E mais, que o Batalhão de Comando e Serviços, hoje o maior Batalhão do Exército, era então integrado por expressiva parcela de afro-descendentes sul fluminenses que se revelavam muito bons soldados, aplicados na nobre tarefa estratégica de ajudar a formação, desde 1944, dos oficiais do Exército Brasileiro. Recorda a Casa do Laranjeira de seu tempo e do meu 1953/55, que classificou de "Promíscua, suja, fétida", contrastando com a majestade da AMAN. Hoje, felizmente, amparada pela Academia em instalações condignas em sua área de jurisdição, além de seu Portão das Armas e junto à cidade e sob a administração da Sociedade Acadêmica Militar (SAM).

Camurça não deixa de fora nenhum aspecto que constitui o contexto da vida do cadete, como os seus ônus e bônus, dos quais minha turma Aspirante Mega 1955 só vivenciou o ônus, em razão da compressão do nosso curso, de 3 para 2 anos, divididos em 3 períodos de 8 meses com férias curtíssimas e, ao final do curso, com o trânsito de 10 dias, em vez de 30, motivado, diziam, pela Guerra da Coréia.

Por tudo, considero esta obra Minha vida de Cadete na AMAN de grande importância para a região do vale do Paraíba fluminense, cuja Geografia e História aborda, bem como a vida social e a paisagem humana de Resende, que ele vivenciou e muito bem observou durante 4 anos.

É obra importante especialmente para os cerca de 30.000 cadetes que cursaram a AMAN recordarem seus tempos de Academia e de Resende. Para os futuros cadetes, será um guia seguro para conhecerem de antemão o que os aguarda ao chegar em Resende, permitindo-lhes preparação adequada para os quatro anos de suas vidas como cadetes do Exército.

Concluindo, poderíamos afirmar que esta obra se constitui em expressiva contribuição para a conquista e preservação do Objetivo Atual nº 1 do Exército, assim definido e em vigor :

"Conquistar, preservar, cultuar e divulgar a História, as Tradições e os Valores morais, culturais e históricos do Exército Brasileiro".

Considero de muita validade a elaboração de Memórias para que sejam deixadas para a posteridade, como experiência e lições colhidas em vida pelo memorialista e para a sua satisfação de deixar o seu espirito presente depois da morte de seu corpo e desencarne de sua alma. Validade consoladora com apoio no pensamento de que "o homem é eterno enquanto sua obra existir e for lembrada." E este será o caso do Ten Cel Camurça, cuja obra ajudará a recordar a saga de cada cadete que cursou a AMAN.

 

*Fundador e presidente da Academia de História Militar Terrestre do Brasil, fundador e presidente emérito das Academias Resendense e Itatiaiense de História, sócio emérito do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB) e benemérito do Instituto de Geografia e História Militar do Brasil (IGHMB) etc. Obras principais abordando a Academia Militar das Agulhas Negras:

  1. O Jubileu de Ouro da AMAN em Resende.1994
  1. Resende História Militar 1744-2001, 2001
  2. Os 60 anos da AMAN em Resende 2004.(obra que relaciona 180 fontes hemerográficas, bibliográficas e documentais do acervo da AHIMTB, relacionadas com a História da AMAN).
  3. Escolas de Formação de Oficiais das Forças Armadas do Brasil. (álbum editado pela FHE/POUPEX).
  4. A projeção da AMAN em Resende e no Médio Rio Paraíba. 1996,
  5. Conde de Resende − o fundador do ensino militar acadêmico nas Américas e do ensino superior no Brasil e criador da cidade de Resende. RIHGB, abr/jun 1992.
  6. O espadim dos cadetes do Exército: histórico, tradições, simbolismo. RIHGB, jan/mar 1980.
  7. História da Academia Militar das Agulhas Negras RIHGB, jul/set 1982.
  8. As tradições da Academia Militar das Agulhas Negras em seus 40 anos em Resende. RIGHGB, jul/set 1984.
  9. O escritor militar Marechal José Pessoa. Revista do Clube Militar, set/out 1985.