Major Enfermeira
ELZA CANSANÇÃO MEDEIROS (1931-2009)
Cel Cláudio Moreira
Bento - Presidente da AHIMTB

Major Elza, Enfermeira veterana da FEB com suas condecorações
Faleceu a Major Elza
Cansanção Medeiros no Rio de Janeiro, sua cidade natal, em 8 de
dezembro de 2009, aos 88 anos.
Era uma
patriota. Em recente entrevista à ANVFEB, que ela ajudou a fundar,
assim se definiu:
“Eu sempre
fui uma patriota. Eu tenho de hereditariedade o patriotismo. E na
minha família registro uma coincidência: de quatro em quatro
gerações surge uma mulher guerreira”.
Foram elas
Muira Ubi, a seguir Jerônima de Almeida que combateu
os holandeses. Depois veio a guerreira alagoana mãe do Visconde de
Sinimbu, líder liberal amigo do General Osorio, que foi 1º Ministro
do Império e titular de diversas pastas, exceto a da Marinha, e que
presidiu o Rio Grande do Sul, ocasião em que nomeou como 1º
professor régio do Município de Canguçu, criado em 1857, e minha
terra natal, meu bisavô Antônio
Joaquim
Bento, creio que com a ajuda do Tenente Coronel Manoel Luiz Osorio
de quem seria cabo eleitoral em Canguçu.
Elza nasceu
em 21 de outubro de 1921, na rua Santa Clara em Copacabana. Era
filha do médico sanitarista alagoano Dr. Tadeu de Araújo Medeiros,
que foi amigo de Santos Dumont e auxiliar direto de Osvaldo Cruz no
combate à Febre Amarela no Rio de Janeiro. Sua mãe foi Aristhea
Cansanção.
Aos dezenove
anos, Elza foi a primeira a se apresentar para lutar com a FEB na
Itália. Em 1944 concluiu o Curso de Enfermeiras da Reserva do
Exército, classificando-se em 1º lugar com grau 9,5, junto com mais
duas colegas. E segundo o acadêmico Ten R/2 Israel Blagberg, ao
recebê-la em nome da AHIMTB no CPOR/RJ:
”Logo
veio o treinamento na Fortaleza de São João, no HCE e na
Policlínica, e o embarque por via aérea para o TO da Itália, onde as
Enfermeiras da FEB se destacaram pelo carinho e profissionalismo com
que souberam se desempenhar de suas funções, granjeando o respeito e
admiração da tropa. Elas foram dignas de uma Ana Néri, que partiu em
1865 para a guerra do Paraguai com autorização especial do
Imperador. 75 anos depois estas outras mulheres guerreiras reviveram
em todo o esplendor e beleza aquela figura sublime, inspiradas ainda
em Joana Angélica, Maria Quitéria, Rosa da Fonseca, Anita Garibaldi,
Bárbara Heliodora, Sóror Angélica, e tantas outras heroínas
brasileiras”.
Na Itália,
Elza atuou como Oficial de Ligação e Enfermeira-Chefe no 7º Station
Hospital em Livorno. De retorno da Itália em 1947, recebeu sua
carta patente de 2ª tenente enfermeira.
Em 1955,
graduada jornalista, publicou seu primeiro livro descrevendo a Saga
da FEB na Itália, intitulado Nas barbas do Tedesco, editado
pela BIBLIEX, dirigida então pelo Gen Umberto Peegrino Seabra
Fagundes, hoje patrono de cadeira na Academia de História Militar
Terrestre do Brasil. Publicou ainda:
E Foi Assim Que A Cobra Fumou
- Editora Imago, 1987 – com várias edições, cujas orelhas tive a
satisfação de redigir a seu convite; Dicionário de Alagoanês
- Impresso na Universidade Federal de Alagoas, 1997; Eu Estava Lá
- Editora Ágora da Ilha, 2001; e Esquerda... Direita...
Acertem o Passo - Edição Fundação Municipal de Ação Cultural de
Maceió – Alagoas, 2003.
Em 1957 foi convocada
para o serviço ativo do Exército, ficando adida à Diretoria de
Saúde, tendo servido até 1962 em diversas unidades.
Apresentou
trabalhos em Congressos de Medicina e Enfermagem. Notável e vibrante
conferencista realizou memoráveis palestras na Escola de Saúde.
Como 1ª Ten
Enfermeira em 1962, serviu na Policlínica Central do Exército, na
Clínica de Cardiologia e continuou a fazer palestras na Escola de
Saúde. Por motivo de saúde foi reformada aos 54 anos em 1976, como
Major, com cerca de 30 anos de serviço.
Foi nesta
época que a conheci, quando passei a dirigir o Arquivo Histórico do
Exército, que ela freqüentava assiduamente para suas pesquisas.
Lembro de
seu entusiasmo e sua coragem para circular pela cidade do Rio de
Janeiro pilotando a sua lambreta. Pouco depois aprendeu a pilotar
ultraleve.
Tirou cursos
de jornalismo, Psicologia, Turismo, Relações Humanas, e de História
da América. Visitou a Antártida e deu a volta ao mundo duas vezes.
Era notável o seu dinamismo aos 66 anos quando aprendeu a pilotar
ultraleve.
Seu empenho
em dar sugestões para a criação de um Corpo Feminino Auxiliar para
as Forças Armadas contribuiu, creio, para a abertura nas nossas
Forças Armadas do Serviço Militar Feminino, do qual ela é um ícone.
Percebendo o seu valor, a propus para ser sócia do Instituto de
Geografia e História Militar do Brasil (IHGMB), no qual ela foi a
primeira mulher, e penso que a única a ingressar neste sodalício.
Tive a honra de recebê-la em nome desta entidade.
Em data mais
recente, em cerimônia no CPOR/RJ, frente a um público feminino de
aspirantes R/2 de Saúde, ela ingressou, a nosso convite, como
acadêmica da AHIMTB na cadeira especial Historiadora Militar
Brasileira. Cadeira que lhe comuniquei em vida que, depois de seu
falecimento, seria denominada Cadeira Especial Major Elza Cansanção
Medeiros, como de fato a criamos. Sua posse foi perenizada em foto
ampliada, com legenda reunindo os principais assistentes do evento.
Recebeu-a em nome da AHIMTB o já citado acadêmico Ten R/2
Artilharia Engenheiro Israel Blagberg, 3º vice-presidente da AHIMTB
e seu Delegado no Rio de Janeiro. E amigo da Major Elza. Segundo ele
”A Major Elza era membro da Academia Alagoana de Cultura e da
Associação Brasileira de Imprensa. Em Maceió criou o Museu Militar
da Segunda Guerra Mundial, com peças históricas de elevado valor,
como aquelas recuperadas do Itapagé, torpedeado na costa de Maceió.
Os verdes mares alagoanos foram o túmulo daqueles brasileiros,
bravos tripulantes e passageiros inocentes, vitimas da sanha
nazista.”
Israel
destacou outra faceta, não menos destacada, que era seu trabalho
como escultora de bustos de militares famosos. Do Marechal
Mascarenhas de Moraes, o Grande Comandante da FEB, foram 40
esculturas, A estatueta representando uma enfermeira em continência,
é o prêmio oferecido às primeiras colocadas da Escola de
Administração do Exército em Salvador, que vem a ser o seu
auto-retrato.
A Major
Elza é detentora de 36 condecorações onde se destacam: Oficial da
Ordem de Mérito Militar, Medalha de Campanha da Itália, Mérito
Tamandaré, Medalha de Guerra, Medalha do Pacificador, Pedro Ernesto
e Santos Dumont etc.
A ela se deve a mais
completa memória iconográfica da FEB com mais de 5.000 fotografias,
o que motivou o meu entusiasmo em propô-la sócia do IHGMB e
acadêmica da AHIMTB, olhando para o futuro dos áudios visuais no
Exército, experiência que havíamos dado início na Comissão de
História do Exército do Estado-Maior, em 1972, que apoiou a
contratação de pintores para desenvolver o projeto, do qual fui o
encarregado, visando desenvolver a iconografia da História do
Exército. E o opulento resultado deste esforço parece que foi
enviado a BIBLIEx. E hoje os áudio visuais estão a todo o vapor.
A Major Elza possuía
habilidades de.tapeceira, mecânica e de escultora. Foi de sua
autoria o busto do Marechal Mascarenhas de Moraes, existente na
Escola Municipal do Rio de Janeiro que leva o nome do comandante da
FEB. Ela possuía regular habilitação como poliglota.
E muitos
outros bustos ela elaborou como já abordado. Segundo testemunho do
citado acadêmico Israel Blagberg ao recebê-la na AHIMTB.
“A cada 7 de Setembro, a multidão diante do Pantheon de Caxias se
encantava ao ver passar o Grupamento dos Ex-Combatentes. Uma figura
marcante de mulher, fardada, logo despertava a atenção do público,
desfilando embarcada numa das primeiras viaturas e com o peito
coberto de medalhas. O tempo passara mas não afetara seu brilho e
sua marcialidade, nem fez com que deixasse de manter, altaneira, a
postura ereta com que saudava as Autoridades no palanque, e sempre
uma das mais aplaudidas. Aparecer em público mantendo viva a imagem
e a memória da gloriosa Força Expedicionária Brasileira era apenas
uma das muitas facetas da rica contribuição da Major Elza Cansanção
Medeiros à causa da FEB”.

Acima, a Major Elza a maior atração dos desfiles dos Veteranos da FEB nas
paradas de 7 de setembro
A Major Elza baixou ao
HCE vítima de uma AVC. Ao conhecer esta circunstância telefonamos
para ela e revelou estar consciente ao nos relatar detalhes de sua
genealogia aqui por nós abordada. E acompanhamos a evolução de seu
estado de saúde.
E dela recebíamos
vários e-mails interessantes e espirituosos, mostrando que ela
continuava ligada a seus interesses culturais.
Foi assim
com surpresa e tristeza que recebemos a notícia de seu falecimento
pelo General Paulo Cezar de Castro, seu amigo, ocorrido em 08 de
dezembro de 2009, há poucos minutos. Ela foi guerreira até o final.
Seu corpo foi velado
como heroína do Exercito no Salão Nobre do Palácio Duque de Caxias e
a seguir cremado, como era o seu desejo.
Em seu velório, no
Salão Nobre do Palácio Duque de Caxias, uma belíssima homenagem do
Exército, que contou com a presença de numerosos oficiais da Ativa e
da Reserva e uma expressiva Delegação de Enfermeiras com seus
uniformes brancos, além de amigos e familiares. Guarneceram a Câmara
Ardente Soldados do 21º Grupo de Artilharia de Campanha - Grupo
Monte Bastione, envergando uniformes históricos e 3º Sargentos
enfermeiras com seus uniformes. E foi realizada missa de corpo
presente por capelães militares e presidida pelo Ten Cel Lindenberg,
Capelão do Comando Militar do Leste.
Israel Blagberg, ao
escrever seu necrológio, em seu final declarou emocionado
“Custa a crer que ela tenha nos deixado, mas o fez com a
sensação de missão cumprida, como atestam as muitas medalhas
merecidamente conquistadas que repousam sobre o seu peito. A mulher
de fibra se foi, mas o seu exemplo frutificará, do trabalho ingente,
da dedicação aos ideais, da preservação e divulgação da memória da
FEB. A melhor homenagem que lhe poderemos prestar será manter
desfraldada a bandeira a qual dedicou toda a sua rica existência.
Que a sua alma se incorpore a corrente da vida eterna.”

Da esquerda
para a direita: Cap Cav Humberto de Almeida (CPOR/RJ), Acad. Cel
Luiz Casteliano de Lucena, Acad. Cel Ernesto Caruso, Ten Cel Cav
Gerson Pinheiro Gomes, Cmt do CPOR/RJ, Acad. Gen Geraldo Néri da
Silva, Acad. Emérito Cel Cláudio Moreira Bento, Presidente da AHIMTB,
Acad. Major Elza, Acad. Cel José Spangenberg Chaves, Acad. Cel
Cândido Manoel de Andrade Netto, Acad. Marcelo Peixoto, Acad. Ten
R/2 Art Engº Israel Blagberg e Asp Of Médica Chiara Andrade Ayres
Dias, do EAS do CPOR/RJ, que muito cooperou com suas leituras do
modelo do expediente da cerimonia (Foto legendada pelo Acadêmico
Israel Blagberg e copiada de foto ampliada sobre a posse como
acadêmica da Major Elza).