Introdução
No trancurso, em 24 de Agosto, do 210º aniversário do Duque de
Caxias e do 99º aniversário de consagração de seu aniversário como o
Dia do Soldado, pelo Ministro da Guerra Marechal Fernando Setembrino
de Carvalho - O Pacificador do Século XX - A FAHIMTB e a AHIMTB/Resende
Marechal Mário Travassos presta, através de seu Informativo ‘O
GUARARAPES’, com este artigo, uma homenagem a Caxias, o Pacificador
do Século XIX, Patrono do Exército, da FAHIMTB e de suas academias
federadas.
O Coronel Amerino Raposo
Filho, em Caxias e os problemas militares brasileiros (Rio, SGeEx,
1969. v. 1 - série subsídios doutrinários), intitulou Caxias de “O
inspirador de nossa doutrina militar” (capítulo VI).
Nele, o pensador militar
Coronel Amerino destacou e demonstrou a notável visão estratégica
de Caxias e a sua capacidade de adaptação, ao realizar, durante a
sua vida, operações militares completamente diversas e em Teatros
de Operações distintos: Inicialmente, foram os raids
audaciosos para conter as revoluções em São Paulo e Minas Gerais;
depois no Rio Grande do Sul; e, finalmente, no Paraguai, as manobras
de flanco de Humaitá e Piquissiri, esta última culminando em cerco.
Vale lembrar que, na Guerra de
1851-52, empreendimento militar que liderou, Caxias adotou uma
estrutura operacional e logística que deu excelentes resultados.
Como Ministro da Guerra
(1856), ele a transplantou para o Exército, o que veio a constituir
profunda Reforma Administrativa, caracterizada pela criação das
figuras do Ajudante-General, do Comando das Armas da Corte e do
Quartel-Mestre-General, este encarregado da Logística, e todos
diretamente a ele subordinados.
Na segunda vez em que assumiu
o Ministério da Guerra (1861), apoiado na imensa experiência
operacional que colhera adotou, com adaptações às realidades
operacionais sul-americanas vivenciadas em cinco campanhas
vitoriosas que comandara, as Ordenanças de Portugal para as armas,
‘até que se dispusesse’, como declarou, ”de uma doutrina específica
genuinamente nossa”.
Para o autor antes citado, a
Manobra de Flanco do Piquiciri, na Guerra do Paraguai, seria ímpar
na História Militar Universal. Foi de concepção audaciosa, aliada à
rapidez e à surpresa da sua execução que culminou com o cerco de
todo o Exército adversário na frente secundária de fixação. O
adversário foi batido quando intentava a fuga, e não uma Retirada.
Caxias teria sido, assim, o pioneiro em Manobra de Cerco.
Para o pensador militar
Coronel Amerino, as atuações operacionais de Caxias estariam a
sugerir uma Doutrina Militar fundamentada na segurança tática e
estratégica em todas as direções. Sua não observância pelo
adversário, resultou para este em derrota, na Dezembrada.
Para o acadêmico emérito da
FAHIMTB, Cel Amerino, Caxias não foi um teórico mas essencialmente
um prático em Arte e Ciência Militar.
Para o pensador militar e
Patrono de Cadeira da FAHIMTB Marechal Humberto de Alencar Castelo
Branco “Caxias possuía em alto grau o senso do praticável e a
convicção de que a Arte Militar é toda execução”.
Desse modo, Caxias teria
lançado as bases da nossa Doutrina Militar Terrestre com a ponta da
sua invicta espada e no campo de batalha, tal como o fizeram
Frederico - o Grande, Napoleão, Suvorov e Sherman.
Amerino Raposo sugeriu, aos
profissionais com responsabilidade na formulação da Doutrina Militar
Terrestre Brasileira, que mergulhassem no estudo crítico de nossas
guerras internas e externas, para delas emergir aquilo que
orientaria o novo comportamento, no sentido do que deveria animar a
nossa Força Terrestre e, em consequência, ajudar a caracterizar, em
caso de guerra, de como ela deveria ser conduzida nos diversos
Teatros de Operações do País e da América do Sul.
Quando alguém pediu,
ingenuamente, à Missão Militar Francesa, logo que aqui chegou, que
ensinasse tática e estratégia brasileiras, os franceses informaram
que ambas estavam embutidas na nossa História Militar e de onde, com
apoio num estudo histórico militar crítico, à luz dos Fundamentos da
Arte e Ciência Militares, elas deviam ser retiradas. E foi deste
contexto de estudos aconselhados, que deles saiu, como exemplo
eloquente, o General Augusto Tasso Fragoso, com suas obras A Batalha
do Passo do Rosário e A Guerra da Tríplice Aliança contra o
Paraguai, que o consagraram como o Pai da História Militar Crítica
em nosso Exército.
História Militar Crítica que,
como projeção da atuação como instrutor e comandante ECEME do
Marechal Castelo Branco foi por sua influência, implantada na AMAN,
a partir de 1959, pelo então Tenente-Coronel Francisco Ruas Santos
e que foi ministrada por cerca de 40 anos até por volta de 1999, na
AMAN, por oficiais instrutores com o Curso da ECEME e orientação
recebida da Cadeira de História Militar da AMAN por todos os atuais
generais combatentes do nosso Exército. Ensino militar crítico
apoiado de 1978 a 1998, por cerca de 20 anos, pelos livros textos
azuis História da Doutrina Militar e História Militar do Brasil,
patrocinados pelo Estado-Maior do Exécito. Ponto de inflexão do
Ensino de História Militar na AMAN, decorrente da Modernização do
Ensino e caracterizado pelo capitão Elton Licério Rodrigues Machado
na p.24 de sua palestra na Escola Naval, sob o título “A História
Militar e o Curso de História Militar na Formação de Oficiais
Combatentes do Exército Brasileiro - 200 anos de História”,
publicada nos Anais do VI Encontro Pedagógico do Ensino Militar
Superior, realizado de 2 a 6 de setembro de 2012, ano do
Bicentenário da AMAN.
O Coronel Amerino sugeriu
doutrinas táticas terrestres com apoio nas atuações de Caxias. E
explicou:
“Doutrina com intensa
solicitação à surpresa, à audácia, à rapidez de movimentos; às
manobras flexíveis, com estruturas leves e aptas a viver em grandes
espaços, isoladas e, até à própria sorte. Doutrina que responda às
pecularidades de nossos teatros de operações, de nosso potencial
humano e de nossas possibilidades econômico-industriáis”.
O que sugeriu pode ser
facilmente identificado na expulsão de feitorias europeias no Baixo
Amazonas e afluentes, por Pedro Teixeira liderando guerrilha
fluvial, bem como na luta de trinta anos, de 1724-54, contra os
holandeses na Bahia e Pernambuco e contra as invasões espanholas no
Sul (1763-77).
Nelas, desenvolveu-se uma
doutrina militar terrestre brasileira genuina ‘A guerrilha fluvial’,
vitoriosa no Baixo Amazonas, ‘A guerra brasílica’ em Pernambuco e
Bahia e, no Rio Grande do Sul, ‘A guerra à gaúcha’.
Com apoio na guerrilha “a
estratégia do fraco contra o forte”, esse tipo de guerra teria sido
apropriado por Caxias, na Revolução Farroupilha, ao entregar a
condução das operações, no campo tático, a dois especialistas nessa
maneira de guerrear, o General Bento Manuel Ribeiro e guerrilheiro
imperial Ten Cel da Guarda Nacional Francisco Pedro de Abreu, o
‘Moringue’.
Vale lembrar que, na
pacificação do Maranhão, Caxias usou a guerrilha para combater a
guerrilha balaia, ação que mais tarde inspirou comandos paraguaios
para a solução de problemas semelhantes.
Mais tarde, na luta pela
independência do Acre, o gaúcho Plácido de Castro também desenvolveu
uma doutrina militar genuína para enfrentar os bolivianos,
apropiando-se em muito na Guerra à gaúcha que ele praticara na
Guerra Civil de 1893/195 no Rio Grande do Sul, como major
federalista.
Doutrinas com essas
características e inspiração, citadas pelo pensador militar Amerino
Raposo e com os precedentes históricos que apontamos, seguramente
podem e devem ser implementadas para a defesa preventiva da Amazônia
Brasileira. Aumentaria, em muito, a capacidade dissuasória das
forças terrestres encarregadas de sua defesa, com apoio no e na
experiência do Centro de Instrução de Guerra na Selva (CIGS), contra
tentativas várias que possam pôr em risco a Integridade, a Unidade e
a Soberania do Brasil na área, no insondável Terceiro Milênio.
Sobre a defesa da Amazônia
leia-se o valioso artigo do General Luiz Alberto Bringel ‘A
Estratégia da Lassidão’, que responde às nossas reflexões e
considerações aqui feitas e do qual tomamos conhecimento depois de
havermos escrito esta parte. Ensina-nos o General Bringel:
“Lassidão é a estratégia do
fraco que, valendo-se de alguns fatores a seu favor, reage no campo
militar, evitando um engajamento decisivo contra uma esmagadora
superioridade militar, impondo-lhe o máximo desgaste e
enfraquecendo-Ihe, assim, a vontade de combater, visando obter na
opinião pública do adversário, forte pressão sobre o seu Congresso
no sentido de suspender as ações armadas”.
A
Guerra Brasílica e a Guerra à Gaúcha tiveram características de
Lassidão que encontram suas raízes no pensamento militar português,
com base no Pensamento Político de Portugal de ‘Dilatar a Fé
Católica e o Império de Portugal’ pelo mundo. Embora um país pequeno
territorialmente, conseguiu se impor e manter importantes
territórios nos quatro cantos do mundo, inclusive o Brasil, por 322
anos.
Eis o
pensamento militar português, na feliz interpretação do General
Paula Cidade:
“Julgada a causa justa,
buscar a proteção divina e atuar ofensivamente, mesmo em
inferioridade de meios”.
Dessa
forma, eles conquistaram e mantiveram a Amazônia inviolável de 1640
a 1822.
O
Coronel J. B. Magalhães, assinalado pensador militar e também um dos
biógrafos do General Osório, ao prefaciar o trabalho focalizado do
Coronel Amerino, assim viu o valor, para o presente e futuro do
Exército, do aproveitamento crítico da história das Forças
Terrestres Brasileiras, como força operacional, com experiências
guerreiras citadas expressivamente vitoriosas:
“Tudo o que existe deriva do
que existiu antes. E é isto que dá valor positivo aos registros da
História, permitindo fazer-se uma filosofia capaz de orientar com
acerto as atividades humanas. E, analisando como atuaram em bem do
progresso as elites de ontem, é que as elites de hoje e do amanhã
poderão produzir eficazmente, consideradas as modificações
ambientais”.
Sobre
Caxias, ele assim interpretou-lhe a projeção como chefe militar:
“Caxias foi chefe militar de
escol. Atuou em época de acentuadas transformações nos mecanismos da
guerra. Soube utilizar os meios de que dispunha, dando-lhes uma
orientação apropriada ao seu maior rendimento”.
Caxias teve à sua disposição, e empregou, os meios que a descoberta
da máquina a vapor, que gerou a Revolução Industrial, produziram:
navios de guerra a vapor; telégrafo; balões cativos, importados do
Exército do Norte do EUA e empregados nos reconhecimentos para
flanquear Humaitá; linha férrea, construída e operada por nossa
Marinha, para apoiar unidades navais que operaram no rio Paraguai
entre duas fortalezas adversárias.
Fortalezas inimigas equipadas com munição e armamentos abundantes,
produzidos industrialmente e não mais artesanalmente.
Caxias, como Ministro da Guerra, lançou as bases da Doutrina Militar
Terrestre Brasileira no tocante à regulamentação da Disciplina e da
Justiça Militar e dos Serviços Gerais.
Desde
então as novidades tem como ponto de partida os regulamentos
específicos que baixou em 1856, 1862 e 1875.
Caxias foi o pioneiro na análise critica de batalhas ao analisar
militarmente a Batalha do Passo do Rosário, à luz dos Fundamentos da
Arte e Ciência Militar, por solicitação do Instituto Histórico e
Geográfico Brasileiro (IHGB) do qual era sócio honorário.
Instituição que, desde 1925, é detentora da invencível espada do
Duque de Caxias da qual, em 1930, o Coronel José Pessoa, como
comandante da Escola Militar do Realengo, mandou copiá-la em escala
para servir de modelo do Espadim de Caxias, arma privativa dos
cadetes do Exército. Espadim que, em 24 de agosto de 2013, novos
cadetes irão receber, como o Símbolo da Honra Militar, numa
cerimônia tradicional na AMAN que há 72 anos se repete anualmente.
Editor. Cel Claudio Moreira
Bento - Historiador Militar e Jornalista
Presidente da FAHIMTB e AHIMTB
Resende Marechal Mário Travassos