INFORMATIVO GUARARAPES- 2013              

                         AHIMTB/Resende
Mal.              Mal. Mário Travassos


 
Fundada em 23 de abril  de 2011
em continuidade a AHIMTB,
fundada
  em 1º Março 1996

 

 

O GUARARAPES

ÓRGÃO DE DIVULGAÇÃO DAS ATIVIDADES DA

 FEDERAÇÃO DAS ACADEMIAS DE HISTÓRIA MILITAR

TERRESTRE DO BRASIL (FAHIMTB) E DA AHIMTB/Resende

 MARECHAL MÁRIO TRAVASSOS

          CGC 0149.52/0001-09                                           www.ahimtb.org.br

CAXIAS E A DOUTRINA MILITAR BRASILEIRA

 

Ano 2013,  nº18 – FAHIMTB AHIMTB/Resende  FEV.

    

 

CAXIAS E A DOUTRINA MILITAR TERRESTRE BRASILEIRA

 

    

Introdução

         No trancurso, em 24 de Agosto, do 210º aniversário do Duque de Caxias e do 99º aniversário de consagração de seu aniversário como o Dia do Soldado, pelo Ministro da Guerra Marechal Fernando Setembrino de Carvalho - O Pacificador do Século XX - A FAHIMTB e a AHIMTB/Resende Marechal Mário Travassos presta, através de seu Informativo ‘O GUARARAPES’, com este artigo, uma homenagem a Caxias, o Pacificador do Século XIX, Patrono do Exército, da FAHIMTB e de suas academias federadas.

 O Coronel Amerino Raposo Filho, em Caxias e os problemas militares brasileiros (Rio, SGeEx, 1969. v. 1 - série subsídios doutriná­rios), intitulou Caxias de “O inspirador de nossa doutri­na militar” (capítulo VI).

Nele, o pensador militar Coronel Amerino destacou e demonstrou a notável vi­são estratégica de Caxias e a sua capacidade de adaptação, ao realizar, durante a sua vida, operações milita­res completamente diversas e em Teatros de Operações distintos: Inicialmente, foram os raids audaciosos para conter as revoluções em São Paulo e Minas Gerais; depois no Rio Grande do Sul; e, finalmente, no Paraguai, as manobras de flanco de Humaitá e Piquissiri, esta última culminando em cerco.

Vale lembrar que, na Guerra de 1851-52, empreendimento militar que liderou, Caxias adotou uma estrutura operacional e logística que deu excelentes resultados.

 Como Ministro da Guerra (1856), ele a transplantou para o Exército, o que veio a constituir profunda Reforma Administrativa, caracterizada pela criação das figuras do Ajudante-General, do Comando das Armas da Corte e do Quartel-Mestre-General, este encarregado da Logística, e todos diretamente a ele subordinados.

Na segunda vez em que assumiu o Ministério da Guerra (1861), apoiado na imensa experiência operacional que colhera adotou, com adaptações às realidades operacionais sul-americanas vivenciadas em cinco campanhas vitoriosas que comandara, as Ordenanças de Portugal para as armas, ‘até que se dispusesse’, como declarou, ”de uma doutrina específica genuinamente nossa”.

Para o autor antes citado, a Manobra de Flanco do Piquiciri, na Guerra do Paraguai, seria ímpar na História Militar Universal. Foi de concepção audaciosa, aliada à rapidez e à surpresa da sua execução que culminou com o cerco de todo o Exército adversário na frente secundária de fixação. O adversário foi batido quando intentava a fuga, e não uma Retirada. Caxias teria sido, assim, o pioneiro em Manobra de Cerco.

Para o pensador militar Coronel Amerino, as atuações operacionais de Caxias estariam a sugerir uma Doutrina Militar fundamentada na segurança tática e estratégica em todas as direções. Sua não observância pelo adversário, resultou para este em derrota, na Dezembrada.

 Para o acadêmico emérito da FAHIMTB, Cel Amerino, Caxias não foi um teórico mas essencialmente um prático em Arte e Ciência Militar.

Para o pensador militar e Patrono de Cadeira da FAHIMTB Marechal Humberto de Alencar Castelo Branco “Caxias possuía em alto grau o senso do praticável e a convicção de que a Arte Militar é toda execução”.

Desse modo, Caxias teria lançado as bases da nossa Doutrina Militar Terrestre com a ponta da sua invicta espada e no campo de batalha, tal como o fizeram Frederico - o Grande, Napoleão, Suvorov e Sherman.

Amerino Raposo sugeriu, aos profissionais com responsabilidade na formulação da Doutrina Militar Terrestre Brasileira, que mergulhassem no estudo crítico de nossas guerras internas e externas, para delas emergir aquilo que orientaria o novo comportamento, no sentido do que deveria animar a nossa Força Terrestre e, em consequência, ajudar a caracterizar, em caso de  guerra, de como ela deveria ser conduzida nos diversos Teatros de Operações do País e da América do Sul.

Quando alguém pediu, ingenuamente, à Missão Militar Francesa, logo que aqui chegou, que ensinasse tática e estratégia brasileiras, os franceses informaram que ambas estavam embutidas na nossa História Militar e de onde, com apoio num estudo histórico militar crítico, à luz dos Fundamentos da Arte e Ciência Militares, elas deviam ser retiradas. E foi deste contexto de estudos aconselhados, que deles saiu, como exemplo eloquente, o General Augusto Tasso Fragoso, com suas obras A Batalha do Passo do Rosário e A Guerra da Tríplice Aliança contra o Paraguai, que o consagraram como o Pai da História Militar Crítica em nosso Exército.

História Militar Crítica que, como projeção da atuação como instrutor e comandante ECEME do Marechal Castelo Branco foi por sua influência, implantada na AMAN, a partir de 1959, pelo então Tenente-Coronel Francisco Ruas Santos  e que foi ministrada por cerca de 40 anos até por volta de 1999, na AMAN, por oficiais instrutores com o Curso da ECEME e orientação recebida da Cadeira de História Militar da AMAN por  todos os atuais generais combatentes do nosso Exército. Ensino militar crítico apoiado de 1978 a 1998, por cerca de 20 anos, pelos livros textos azuis História da Doutrina Militar e História Militar do Brasil, patrocinados pelo Estado-Maior do Exécito. Ponto de inflexão do Ensino de História Militar na AMAN, decorrente da Modernização do Ensino e caracterizado pelo capitão Elton Licério Rodrigues Machado na p.24 de sua palestra na Escola Naval, sob o título “A História Militar e o Curso de História Militar na Formação de Oficiais Combatentes do Exército Brasileiro - 200 anos de História”, publicada nos Anais do VI Encontro Pedagógico do Ensino Militar Superior, realizado de 2 a 6 de setembro de 2012, ano do Bicentenário da AMAN.

O Coronel Amerino sugeriu doutrinas táticas terrestres com apoio nas atuações de Caxias. E explicou:

“Doutrina com intensa solicitação à surpresa, à audácia, à rapidez de movimentos; às manobras flexíveis, com estruturas leves e aptas a viver em grandes espaços, isoladas e, até à própria sorte. Doutrina que responda às pecularidades de nossos teatros de operações, de nosso potencial humano e de nossas possibilidades econômico-industriáis”.

O que sugeriu pode ser facilmente identificado na expulsão de feitorias europeias no Baixo Amazonas e afluentes, por Pedro Teixeira liderando guerrilha fluvial, bem como na luta de trinta anos, de 1724-54, contra os holandeses na Bahia e Pernambuco e contra as invasões espanholas no Sul (1763-77).

 Nelas, desenvolveu-se uma doutrina militar terrestre brasileira genuina ‘A guerrilha fluvial’, vitoriosa no Baixo Amazonas, ‘A guerra  brasílica’ em Pernambuco e Bahia e, no Rio Grande do Sul, ‘A guerra à gaúcha’.

Com apoio na guerrilha “a estratégia do fraco contra o forte”, esse tipo de guerra teria sido apropriado por Caxias, na Revolução Farroupilha, ao entregar a condução das operações, no campo tático, a dois especialistas nessa maneira de guerrear, o General Bento Manuel Ribeiro e guerrilheiro imperial Ten Cel da Guarda Nacional Francisco Pedro de Abreu, o ‘Moringue’.

 Vale lembrar que, na pacificação do Maranhão, Caxias usou a guerrilha para combater a guerrilha balaia, ação que mais tarde inspirou comandos paraguaios para a solução de problemas semelhantes.

Mais tarde, na luta pela independência do Acre, o gaúcho Plácido de Castro também desenvolveu uma doutrina militar genuína para enfrentar os bolivianos, apropiando-se em muito na Guerra à gaúcha que ele praticara na Guerra Civil de 1893/195 no Rio Grande do Sul, como major federalista.

 Doutrinas com essas características e inspiração, citadas pelo pensador militar Amerino Raposo e com os precedentes históricos que apontamos, seguramente podem e devem ser implementadas para a defesa preventiva da Amazônia Brasileira. Aumentaria, em muito, a capacidade dissuasória das forças terrestres encarregadas de sua defesa, com apoio no e na experiência do Centro de Instrução de Guerra na Selva (CIGS), contra tentativas várias que possam pôr em risco a Integridade, a Unidade e a Soberania do Brasil na área, no insondável Terceiro Milênio.

 Sobre a defesa da Amazônia leia-se o valioso artigo do General Luiz Alberto Bringel ‘A Estratégia da Lassidão’, que responde às nossas reflexões e considerações aqui feitas e do qual tomamos conhecimento depois de havermos escrito esta parte. Ensina-nos o General Bringel:

“Lassidão é a estratégia do fraco que, valendo-se de alguns fatores a seu favor, reage no campo militar, evitando um engajamento decisivo contra uma esmagadora superioridade militar, impondo-lhe o máximo desgaste e enfraquecendo-Ihe, assim, a vontade de combater, visando obter na opinião pública do adversário, forte pressão sobre o seu Congresso no sentido de suspender as ações armadas”.

     A Guerra Brasílica e a Guerra à Gaúcha tiveram características de Lassidão que encontram suas raízes no pensamento militar português, com base no Pensamento Político de Portugal de ‘Dilatar a Fé Católica e o Império de Portugal’ pelo mundo. Embora um país pequeno territorialmente, conseguiu se impor e manter importantes territórios nos quatro cantos do mundo, inclusive o Brasil, por 322 anos.

     Eis o pensamento militar português, na feliz interpretação do General Paula Cidade:

 “Julgada a causa justa, buscar a proteção divina e atuar ofensivamente, mesmo em inferioridade de meios”.

     Dessa forma, eles conquistaram e mantiveram a Amazônia inviolável de 1640 a 1822.

     O Coronel J. B. Magalhães, assinalado pensador militar e também um dos biógrafos do General Osório, ao prefaciar o trabalho focalizado do Coronel Amerino, assim viu o valor, para o presente e futuro do Exército, do aproveitamento crítico da história das Forças Terrestres Brasileiras, como força operacional, com experiências guerreiras citadas expressivamente vitoriosas:

“Tudo o que existe deriva do que existiu antes. E é isto que dá valor positivo aos registros da História, permitindo fazer-se uma filosofia capaz de orientar com acerto as atividades humanas. E, analisando como atuaram em bem do progresso as elites de ontem, é que as elites de hoje e do amanhã poderão produzir eficazmente, consideradas as modificações ambientais”.

     Sobre Caxias, ele assim interpretou-lhe a projeção como chefe militar:

“Caxias foi chefe militar de escol. Atuou em época de acentuadas transformações nos mecanismos da guerra. Soube utilizar os meios de que dispunha, dando-lhes uma orientação apropriada ao seu maior rendimento”.

     Caxias teve à sua disposição, e empregou, os meios que a descoberta da máquina a vapor, que gerou a Revolução Industrial, produziram: navios de guerra a vapor; telégrafo; balões cativos, importados do Exército do Norte do EUA e empregados nos reconhecimentos para flanquear Humaitá; linha férrea, construída e operada por nossa Marinha, para apoiar unidades navais que operaram no rio Paraguai entre duas fortalezas adversárias.

     Fortalezas inimigas equipadas com  munição e armamentos abundantes, produzidos industrialmente e não mais artesanalmente.

     Caxias, como Ministro da Guerra, lançou as bases da Doutrina Militar Terrestre Brasileira no tocante à regulamentação da Disciplina e da Justiça Militar e dos Serviços Gerais.

     Desde então as novidades tem como ponto de partida os regulamentos específicos que baixou em 1856, 1862 e 1875.

        Caxias foi o pioneiro na análise critica de batalhas ao analisar militarmente a Batalha do Passo do Rosário, à luz dos Fundamentos da Arte e Ciência Militar, por solicitação do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB) do qual era sócio honorário. Instituição que, desde 1925, é detentora da invencível espada do Duque de Caxias da qual, em 1930, o Coronel José Pessoa, como comandante da Escola Militar do Realengo, mandou copiá-la em escala para servir de modelo do Espadim de Caxias, arma privativa dos cadetes do Exército. Espadim que, em 24 de agosto de 2013, novos cadetes irão receber, como o Símbolo da Honra Militar, numa cerimônia tradicional na AMAN que há 72 anos se repete anualmente.

 

Editor. Cel Claudio Moreira Bento - Historiador Militar e Jornalista

Presidente da FAHIMTB e AHIMTB Resende Marechal Mário Travassos

 

"Para alimentar o cérebro de um Exército na paz, para prepará-lo para a eventualidade indesejável de uma guerra, não existe livro mais fecundo em meditações e lições do que o da História Militar."