8- AS GUERRAS CONTRA ARTIGAS (1816 E 1820 )

Terminada a campanha, a Capitania do Rio Grande continuava em pé de guerra, face à agitação em Montevidéu, novamente sitiada por Rondeau, e a luta entre Artigas e os argentinos para exercerem soberania sobre o Uruguai. E, nesse embate, o Rio Grande do Sul foi atingido, motivando as guerras Cisplatinas de 1816-28, nas quais o Rio Grande e seu território foram intensamente envolvidos em razão dos seguintes interesses geopolíticos:

 

Causas:O Exército Pacificador de D. Diogo de Souza voltou para o Rio Grande, em 1812, em razão de armistício imposto pela Inglaterra, celebrado entre os espanhóis de Montevidéu e os sitiantes orientais, e desrespeitado pelos argentinos.

No início de 1814, Montevidéu capitulou e entregou-se à Argentina. O futuro oscilava entre quatro interesses conflitantes, isto é, entre ser:

Província Argentina;

Protetorado da Inglaterra;

Nação Independente; ou

Província portuguesa.

Portugal optou por essa solução, achando que uma intervenção no Rio da Prata traria, no mínimo, uma definição dos limites entre Uruguai e o Rio Grande do Sul.

O governador do Rio Grande e comandante das Armas era, desde 13 de novembro de 1814, o Marquês de Alegrete - Luiz Teles da Silva Caminha e Menezes. Ao tomar conhecimento de que Artigas exercia influência sobre os "Setes Povos das Missões" (de Portugal desde 1801), para que se unissem em torno de sua bandeira, propôs uma ação conta Artigas.

 

Em 1815 o Brasil foi elevado à condição de Reino Unido a Portugal e Algarves.

 

Portugal, com seu governo no Rio de Janeiro, decidiu ocupar, antes que outro o fizesse, o atual Uruguai. Para tal, contaria com as tropas do Rio Grande, auxiliadas pela Divisão de Voluntários Reais (que mandou vir de Portugal) integrada por combatentes veteranos das lutas napoleônicas, e ao comando do Tenente -General Carlos Frederico Lecor.

 

O Marquês de Alegrete concentrou suas forças na Fronteira do Rio Pardo. Estimulou a defesa local das áreas ameaçadas, com a formação de forças irregulares (guerrilhas) e voluntários.

8 a) A primeira Campanha contra Artigas (1816-17)

Tropas orientais, no final de julho de 1816, estabeleceram o seguinte dispositivo para invadir o Rio Grande do Sul:

 

 

 

No corte do Quaraí: Artigas, com

mil homens, próximo a Santana,

e a 18 Km a jusante, Verdun,

lugar-tenente do líder, com

forte contingente

 

No corte do Uruguai:

Andresito Artigas, filho adotivo

do líder e nascido em São

Borja, visava invadir o Rio Grande

e atacar São Borja, sede

de Comando Militar dos Sete

Povos. E, mais a jusante,

Sotelo, visando penetrar no distrito

de Entre-Rios, para dominá-lo e,

a seguir, auxiliar Andresito

nas Missões.

Compare os dois planos.

Plano de Artigas

Plano Português

· Opor-se com pequeno efetivo a Lecor

em sua marcha para Montevidéu.

· Com o grosso de suas forças,

levar a guerra ao Rio Grande do Sul.

· Conquistar os Sete Povos das Missões.

· Com os reforços aí recebidos, bater

as tropas do Marquês de Alegrete.

· Cair, em seguida, sobre a retaguarda

de Lecor e sua Divisão de Voluntá

rios Reais.

· Avançar com a Divisão de Voluntá

rios Reais contra Montevidéu e

principais cidades uruguaias no

itinerário Laguna-Montevidéu.

· Com as tropas locais, defender nas

linhas dos rios Uruguai e

Arapeí, impedindo a invasão oriental

ou a sua permanência no Rio

Grande, caso já o tivesse invadido.

· Em uma 2ª fase, o plano previa a

Divisão de Voluntários Reais, partindo

de Montevidéu para o norte, e a do

Rio Grande para o Sul, esmagar

Artigas, comprimindo-o numa manobra

de pinça.

Ao cair em mãos de um posto de fronteira português uma ordem de Artigas a um subordinado, tomou-se conhecimento da invasão iminente do território do Rio Grande. O alarma se espalhou! Foram tomadas providências com a evacuação do que fora aconselhável. Formaram-se, espontaneamente, corpos auxiliares de guerrilhas, inclusive dispondo de vaqueanos e bombeiros (observadores avançados).

 

A Fronteira de Rio Pardo, ao comando do Tenente- General Joaquim Xavier Curado, cerrou sobre a fronteira do Uruguai, onde concentrou sua tropa no rio Ibirabuitã-Chico, de onde poderia socorrer os Sete Povos das Missões.

 

O primeiro embate aconteceu em 22 de setembro de 1816, com desvantagem para os defensores, em virtude da superioridade oriental.

 

Verdun e Sotelo invadiram o Rio Grande do Sul. A tropa, que estava ao comando do intrépido agora Tenente- Coronel José de Abreu, atacou Sotelo, que foi obrigado a atravessar novamente o Uruguai com pesadas perdas.

 

Andresito Artigas invadiu São Borja e foi cercado pelo Coronel Chagas Santos. Abreu repeliu nova tentativa de invasão de Sotelo. Em 27 de setembro, após a épica travessia do Ibicuí, bateu-se pela terceira vez com Sotelo, cuja coluna destruiu; marchou, célere, para São Borja sitiada e, em 3 de outubro, caiu de surpresa sobre os sitiantes, aos quais se havia reunido Sotelo. Abreu bateu Andresito e Sotelo, causando-lhes pesadíssimas baixas.

 

Os dias seguintes foram de intensa perseguição. O intrépido Tenente- Coronel José de Abreu - o Anjo da Vitória, como passou a ser chamado, em nove dias de ação fulminante, revelando incomum energia, varreu o inimigo da margem esquerda do Uruguai e das Missões.

A seguir, o ataque recaiu sobre Verdun, que fora alcançado por força, ao comando do Brigadeiro João de Deus Menna Barreto; a derrota ocorreu em 19 de outubro no combate de Ibirocaí, através do uso de um providencial ardil: simulou retirada, o que fez o inimigo abandonar as posições para a perseguição; em seguida, uma parada brusca e um contra-ataque sobre o inimigo surpreso e desarticulado. Derrotados Sotelo, Andresito e Verdun, restava Artigas.

Em 27 de outubro, ele foi alcançado próximo a Santana, no local denominado Carumbé, por tropas ao comando do Brigadeiro Joaquim Oliveira Álvares. As forças de Artigas eram mais numerosas, mas as de Portugal, com a Cavalaria nas alas, a Infantaria no centro e apoiadas em duas peças, saíram vitoriosas. Carumbé concretizou a expulsão dos invasores do Rio Grande do Sul, cuja tropa foi proibida de ultrapassar a fronteira.

 

O Marquês de Alegrete assumiu o comando; conheceu reunião de Artigas em Arapeí; decidiu invadir o Uruguai! Em 3 de janeiro de 1817, o agora Coronel José de Abreu bateu os orientais em Arapeí.

 

No dia 4, ocorreu o combate de Catalão. Nele, o Marquês de Alegrete liderou, em pessoa, seus comandados. Foi uma luta árdua, devido à impetuosidade de Artigas. A vitória esteve por muito tempo indecisa, até que houve o ataque da Cavalaria do Coronel José de Abreu, lançando a Cavalaria de Latorre para longe do local da batalha.

 

Com o flanco esquerdo exposto, Artigas foi rapidamente batido. Buscou abrigo na margem direita do rio Uruguai, onde dispunha de cavalos, bovinos e demais condições de apoio para produção de itens bélicos.

Foi então que o Marquês de Alegrete determinou ao Brigadeiro Chagas Santos que organizasse, a partir de São Borja, uma expedição para destruir as bases logísticas de Artigas, com vistas a novas invasões do Rio Grande.

 

Assim, de 14 de janeiro a 13 de março de 1817, o já citado Brigadeiro, à frente de uma coluna de três armas, demoliu e saqueou as povoações de Japeju, La Cruz, São Tomé, Santa Maria, São Xavier, Mártires e Conceição, além das povoações de São José, Apóstolos e São Carlos.

 

Mas, em que pese a essa operação de destruição das bases de partida de Artigas contra as Missões, permaneceu intacta a povoação de Apóstolos, onde Andresito reuniu importante contingente. Mais uma vez, Chagas Santos atravessou o Uruguai, mas foi repelido e retornou a São Borja.

 

Artigas conseguiu ainda reunir dois exércitos: um lançado ao comando de Ramírez contra Buenos Aires; o outro, a seu comando, concentrou próximo de Santana, por onde lançaria sua última cartada.

 

No entanto, a Divisão de Voluntários Reais prosseguia sobre o litoral. Em 10 de novembro de 1816, combateu na Índia Mueta. Em 1º de dezembro, em Cassupá; em 20 de janeiro de 1817, a Divisão de Voluntários Reais entrou em Montevidéu, precedida de destacamentos da Capitania do Rio Grande do Sul, 16 dias após a decisiva batalha de Catalão.

8 b)A segunda campanha contra Artigas 1820

O conde da Figueira, novo governador da Capitania sulina, concentrou suas forças em Bajé, para dali auxiliar as forças de Montevidéu, seguindo ordens do Rio.

O conde soube que Andresito Artigas invadira as Missões, em abril de 1819, à frente de 2 mil homens, pelo passo de Santo Isidoro, e que se apoderara dos povos de São Luís Gonzaga e São Nicolau.

 

 

 

O Mal. Chagas Santos despachou contra ele uma força ao comando do Coronel Diogo Moraes de Arouche Lara. Reunindo-se a Arouche Lara, o Brigadeiro Chagas Santos atacou São Nicolau. E foram repelidos, morrendo na ação o Coronel Arouche Lara da Legião de São Paulo.

 

O Conde da Figueira socorreu as Missões. Operou junção com o Brigadeiro Chagas Santos. Em 3 de junho de 1819, atingiu São Nicolau, já abandonada por Andresito.

 

Ordenou ao Coronel José de Abreu que perseguisse Andresito junto à margem esquerda do Piratini (das Missões). Destacou uma força para uma possível limpeza de inimigos aos povos de São Miguel, São Lourenço, São João e Santo Ângelo.

Andresito, ao deixar São Nicolau, rumou para o sul com o fim de juntar-se a Artigas. Foi surpreendido e preso por uma patrulha quando tentava atravessar o Uruguai, após ter sido completamente destroçado próximo ao Rincão do Carovi, pelo Coronel José de Abreu. Foi remetido preso para fortaleza de Santa Cruz no Rio. Anos mais tarde voltou a Montevidéu, onde faleceu. Sua prisão foi um duro golpe para Artigas que perdeu um de seus melhores comandantes.

Assim, as Missões ficaram livres da segunda invasão. Após expulsar os invasores das Missões, o conde de Figueira enviou o Coronel José de Abreu para guarnecer a linha do rio Arapeí e deslocou a força, que estava em Bajé, para Las Canas. Mandou guarnecer a atual Jaguarão. O Tenente General Manoel Marquês de Souza, desde abril, guarnecia o forte de Santa Teresa.

 

Os guerrilheiros Bento Gonçalves da Silva, Albano de Oliveira, Bento Manoel Ribeiro, Jerônimo Gomes Jardim e outros, através de diversas ações, tiveram destacada atuação, minando o poder de Artigas e Rivera no Uruguai.

 

O conde da Figueira, sabedor desde outubro de 1818, que Artigas, com numerosa força, retornara ao Uruguai, determinou o seguinte dispositivo das forças da Capitania:

 

Em janeiro de 1820, Artigas (após ser pressentido por José de Abreu em seu acampamento em Taquarembó, próximo a Santana) invadiu o Rio Grande, obrigando ao Brigadeiro José de Abreu, em inferioridade de meios, a retirar-se com pesadas perdas para o passo do Rosário, onde foi acolhido pelo Brigadeiro Correia Câmara, após épica retirada.

 

No dia 27 de dezembro, Correia Câmara e Abreu atacaram, no vale do Ibicuí da Armada, uma tropa de Cavalaria inimiga que se recolheu com pesadas perdas para o acampamento oriental em Taquarembó. O conde da Figueira, em manobra fulminante, deslocou-se de Porto Alegre com reforços para assumir, pessoalmente, o comando. Com a mesma rapidez, lançou-se sobre um contingente inimigo que arreara mais de 1 mil vacuns do território que haviam invadido. Bateu o inimigo e recuperou a tropa valiosa. Prisioneiros revelaram-lhe que o exército de Artigas estava acampado nas nascentes do Taquerembó-Chico. Então, cerrou para Itaquatiá.

 

A posição artiguista era forte. A frente era protegida por um banhado profundo e, nos flancos, por um meandro do Taquarembó, com margens altas.

 

Em 20 janeiro de 1820, sob o comando direto do conde da Figueira, aconteceu o ataque. José de Abreu irrompeu através do banhado e atacou a frente inimiga. Correia Câmara caiu sobre um flanco, após atravessar o Taquarembó. O comandante inimigo, Latorre, vendo a ameaça, atravessou em vários pontos o Taquarembó, sob perseguição. O conde da Figueira, de espada em punho, lançou-se à luta, animando seus liderados. Em pouco tempo, o inimigo foi vencido.

 

Artigas, fazia algum tempo, já se retirara de Taquarembó. Com alguns liderados, dirigira-se para Curuzu-Quatia ( Corrientes).

 

Complicações políticas nas antigas províncias platinas terminaram por obrigar Artigas a se exilar no Paraguai, em setembro de 1820, de onde não mais retornou.

 

O Uruguai terminou sendo incorporado, em31 de julho de 1821, ao Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves, com o nome de Província Cisplatina.

Em função dessa guerra, foram estabelecidos os atuais limites do Rio Grande do Sul com Uruguai, que até hoje permanecem, a exceção de modificação no Chuí, em 1909.

Exercício

Citar os interesses argentinos na guerra que o Brasil moveu contra Artigas.