3 -AS GUERRAS HOLANDESAS NO NORDESTE 1624-1654

Se a União das Coroas Ibéricas (Portugal e Espanha),1580-1640, atraiu para o Brasil tradicionais inimigos da Espanha, possibilitou também a sua expansão além do meridiano das Tordesilhas por bandeirantes paulistas e pelo capitão Pedro Teixeira na Amazônia.Expansão para o reino de Portugal, em nome do rei comum das duas coroas ibéricas.

Esta expansão ocorreu quase que no mesmo tempo histórico das lutas para expulsar os franceses do Maranhão, os ingleses, irlandeses e holandeses do Estuário e Baixo –Amazônas, e os holandeses do Nordeste, onde atuaram de 1624-54, como se verá.

Causas fundamentais das Guerras Holandesas:

A disputa comercial e religiosa ( Catolicismo Espanhol X Calvinismo Holandês) terminou envolvendo o Brasil com a União das Coroas Ibéricas.

Para invadir o Brasil, colônia portuguesa sob a coroa espanhola, a Holanda organizou a Companhia das Índias Ocidentais e forneceu-lhe navios, tropas e dinheiro.

A essa companhia coube invadir o Brasil por duas vezes: a primeira na Bahia,em 1624,e a segunda em Pernambuco, em 1630. Essas invasões deram lugar às Guerras Holandesas (1624-1654) ou Guerra dos Trinta Anos do Brasil, cf. Guerra dos T do Brasil, cf. Guerra dos Tinta Anos na Europa (1618-1648),

A maior riqueza do Nordeste do Brasil era a cana-de-açúcar, que encontrava ambiente ideal nos terrenos de massapê (ou massapé) , próximos ao litoral. Esse produto assegurava excelentes lucros a Portugal e Espanha.

O Nordeste estava despreparado, militarmente, para fazer frente a uma invasão potente e planejada.

Somente os portos de Recife e Salvador possuíam condições satisfatórias para repelir ações de corso, mas não de esquadras.

São 4 os períodos desta guerra:

1º) - Invasão e recuperação da Bahia (1624-1625);

2º) - Invasão e conquista de Pernambuco (1630-1636);

3º) - Governo do Príncipe Maurício de Nassau (1637-1644); e

4º) - Insurreição e Restauração Pernambucana (1645-1654).

 

A invasão da Bahia - 1º Período-- No dia 8 de maio de 1624, surgiu poderosa e ameaçadora esquadra da Holanda, frente a Salvador. Compunha-se de 26 navios armados com 500 canhões e guarnecidos por 3.300 homens, sendo 1.700 para o combate em terra e ocupação. Era uma fração expressiva de um dos mais famosos exércitos da época.O Almirante Jacob Willekens comandava esta potente força militar.

No dia 9, os holandeses atacaram, e nossas fortalezas responderam.

O invasor, com um plano detalhado das fortificações, procurou evitar ser atingido.Usando 16 embarcações, fixou as defesas de Salvador, e sobre estas atraiu as reservas da cidade.

Enquanto as fortalezas duelavam com a esquadra inimiga, 5 navios, que os holandeses haviam deixado fora da barra, aproximaram-se do Forte de Santo Antônio e desembarcaram na praia, sem reação, uma força de 1.500 homens, aproximadamente.

Sem deter a avalanche de invasão, tão bem planejada e contra a qual era inútil resistir, abandonaram Salvador, durante a noite, a guarnição e a população, rumo ao interior. No dia seguinte, os holandeses, por terra e mar, desfecharam ataque sobre a cidade abandonada.

Verificando o êxodo, o agressor penetrou, saqueando tudo e aprisionando o Governador-Geral, que não abandonara o posto.

A sede do Governo-Geral do Brasil caía em mãos estrangeiras.

Próximo uma légua das muralhas de Salvador, os baianos levantaram o Arraial do Rio Vermelho que, daí por diante, se tornou a sede do Governo-Geral do Brasil e quartel-general da reação contra o invasor, além de obstáculo à sua expansão para o oeste, em combinação com o sistema de emboscadas ou guerrilhas.

Através de judicioso aproveitamento do terreno e do emprego de táticas de guerras nativas brasileiras, organizaram as companhias de emboscadas, compostas de 25 a 40 homens, para levarem a luta sem quartel ao inimigo.

Surgiu, assim, no Brasil, novo tipo de guerra, a "guerra brasílica", que tanta surpresa e admiração iria causar entre os europeus, esta Doutrina Militar.

Em pouco tempo, as emboscadas cercaram por completo Salvador, levando a morte e a destruição a todo adversário que deixasse as muralhas, tentando buscar suprimentos para a manutenção da conquista.

Tombaram mortos, sob a ação das emboscadas, sucessivamente, o governador holandês Johan van Dorth e seu sucessor, o coronel Albert Schouten, comandante da força terrestre.

O êxito das emboscadas e o pavor de que foi tomado o invasor fizeram aumentar a confiança, a audácia e a determinação dos defensores, no sentido de expulsá-lo.

O testemunho do padre Antônio Vieira, então vivendo na Bahia, dá conta do heroísmo e sacrifícios da gente baiana para libertar a terra invadida:

"...Passaram noites e dias sem dormir e descansar, viviam e dormiam sem um teto, alimentavam-se precariamente de farinha, padeceram por vezes seguidas, frios, fome e sede, além de estarem faltos de munição que foi conseguida com o próprio inimigo, através das emboscadas..."

A única coisa abundante entre os luso-brasileiros foi ânimo para a luta e o grande desejo de libertar a Bahia.

Destacam-se, sobremaneira, na reação, índios flecheiros das aldeias baianas, valiosos instrumentos ofensivos, nos períodos agudos de carência de munição.

Com freqüência, formações compactas holandesas viram cair sob seus peitos, de surpresa, nuvens de setas que lhes causaram muitas mortes e ferimentos. Os inimigos mais ousados, ao preparar o arcabuz para revidar o ataque, caíam ao solo, com o peito varado por flechas.

Verificaram, por fim, que a Companhia das Índias Ocidentais errara em sua apreciação estratégica, não percebera a alma do povo, preocupada que estava com lucros fáceis e altos dividendos, resultando tudo na feliz expressão de Luís Delgado: "Um confronto de uma alma X um negócio", em que a alma sairia vitoriosa. Era dar tempo ao tempo!Era preciso completar o cerco de Salvador com o bloqueio marítimo.

Em pouco, esquadrilhas improvisadas de canoas e lanchas armadas singravam a baía e concretizavam o isolamento do invasor.

Dificultaram-lhe desembarcar em outros pontos do Recôncavo para buscar recursos de sobrevivência. O sítio de Salvador tornou-se cada vez mais rigoroso.

No interior da muralha, foram encurralados, por mais de 1.400 luso-brasileiros, cerca de 2.800 inimigos, dos quais 1.600 soldados, 700 mercenários de diversas nacionalidades, e 500 escravos armados.

No dia 29 março/1624, fundeou, próximo à Ponta do Padrão, poderosa esquadra luso-espanhola, sob o comando de D. Fadrique de Toledo, composta de 52 navios de guerra e cerca de 12.000 homens, entre soldados e marinheiros, dos quais 4.000, aproximadamente, eram portugueses. Havia perto de 1.200 bocas de fogo.

Mais significativo ainda foi o reforço da resistência baiana, por um contingente de brancos e índios, trazidos do Rio de Janeiro, via marítima, por Salvador Correia de Sá e Benevides, e, de Pernambuco, por Jerônimo de Albuquerque Maranhão*. Continuava a tradição de solidariedade e apoio mútuo das diferentes partes do Brasil nascente, em prol da integridade territorial e cultural do país.

Nota:* Não se trata de Jerônimo de Albuquerque Maranhão, o herói de São Luís contra os franceses, o qual faleceu em 1618.

Salvador foi submetida a rigoroso cerco, que se foi apertando aos poucos até que o invasor, cedendo terreno, abandonou os fortes e buscou proteção nas muralhas da cidade.

A partir de 6 abril/1625, a luta tornou-se cada vez mais intensa e, segundo Frei Vicente do Salvador, testemunha ocular,

"....durante vinte e três dias, não se passou um quarto de hora, de dia e de noite, sem que se ouvisse o estrondo de bombardas, esmerilhões e mosquetes de parte a parte..."

O invasor capitulou, perante a evidência da inutilidade de reação, no dia 30 do mesmo mês de abril.

Entregou Salvador com todos os seus valores, além do armamento e munições, navios, escravos, e libertou os prisioneiros. Em contrapartida, permitiram-lhe retornar à Holanda com a roupa, suprimentos para três meses, armas e munições para a defesa na viagem. Os oficiais conservaram as espadas.

A 1º maio/1625, D. Fadrique de Toledo, à frente dos bravos luso-brasileiros da Bahia, Pernambuco, Rio de Janeiro e São Paulo, e das poderosas tropas trazidas da Espanha, entrou triunfalmente em Salvador, antes que a dominação holandesa completasse um ano.

Invasão de Pernambuco - 2º Período, 1630-54--O corsário holandês Peter Heyn capturou nas Antilhas a "Frota de Prata" da Espanha, equivalente a mais do dobro do capital inicial da Companhia das Índias Ocidentais. Isso animou a tentar mais uma invasão do Brasil. Escolheram Pernambuco, próspera capitania hereditária e não real, menos defendida do que a Bahia, mais próxima da Europa e do litoral africano.

Além disso, existia o porto de Recife, base naval natural excelente, capaz de abrigar e proteger enorme esquadra de ataque.

Baseados em Recife, acreditavam dominar e manter o Brasil com poucos gastos, arruinar a navegação luso-espanhola na costa e apossar-se, através de ações de corso, de fabulosas riquezas transportadas da América do Sul para a Europa, por Espanha e Portugal.

Com poucos gastos, poderia Recife tornar-se inexpugnável contra investidas vindas de terra, desde que mantivessem em seu poder o controle do acesso marítimo.

Tal apreciação estratégica foi válida, pois esta base naval e terrestre, o Recife, resistiu durante 24 anos, até que os holandeses perderam a supremacia naval na área para a Inglaterra.

Assim, em Pernambuco, procuraram não o açúcar, mas uma inexpugnável base naval e terrestre: o Recife, protegida por dois enormes fossos naturais, os rios Capibaribe e Beberibe. Esta é a real visão da escolha de Pernambuco no estratégico Saliente Nordestino.

O povo pernambucano não era dado a tratados de "mútua amizade e aliança" com o dominador, pois, após um século de colonização portuguesa, já possuía acendrado amor à terra e aos seus símbolos.A grande maioria do povo pernambucano já comungava do ideal luso-espanhol - A dilatação da Fé e do Império.

O governador de Pernambuco, Matias de Albuquerque, ao saber da pretendida invasão, fez tudo ao seu alcance para transformar Recife e Olinda em fortes praças de guerra.

 

A Conquista de Recife e de Olinda

 

No dia 15 fev 1630, apresentou-se ameaçadora, frente ao Recife, a poderosa esquadra holandesa ao comando do almirante Hendrick Loncq. Compunha-se de 50 navios e um total de 7.000 homens.

O invasor sabia que o irrisório efetivo luso-brasileiro não poderia cobrir toda a costa pernambucana e que os defensores não haviam recebido reforços da Metrópole.

Enquanto a maior parte da esquadra duelava com Recife, 16 navios com 3.000 homens velejaram para o norte, sob o comando do coronel Waerdenburg, e desembarcaram, tranqüilamente, sem nenhuma reação, na desguarnecida praia de Pau Amarelo.

No dia 16 fev, pela manhã, o invasor iniciou a progressão rumo a Olinda com três regimentos.A resistência em Olinda foi feroz, mas desigual. O Recife foi atacado em 20 fev e o Forte São Jorge reagiu bravamente sob a liderança de Antônio Lima. O inimigo atacou o Forte São Jorge em 1o março. Para esmagar este forte e seus bravos defensores, concentraram uma tempestade de granadas, lançadas de canhões do mar e terra. Os pernambucanos não desanimaram, redobraram em coragem e firmeza, repelindo todos os ataques durante um dia.A 2 de março, após algumas horas de bombardeio, Antônio Lima verificou que se haviam desmoronado as muralhas do forte, tinham sido desmontados os canhões, com grande número de mortos e feridos entre seus bravos, em função do fogo inimigo.

Rendeu-se o Forte de São Jorge diante da esmagadora superioridade bélica inimiga; mostrou, porém, ao coronel Waerdenburg, conforme este escreveu à Holanda:

"...os soldados desta terra são vivos e impetuosos, e não são de nenhum modo cordeiros..." , muito diferente do que pensara antes:

"...fáceis de serem atraídos à mútua amizade e aliança..."

Após a rendição do Forte Sào Jorge, os holandeses, esperando ansiosamente a rendição de numerosa guarnição, ficaram surpreendidos e desconcertados, quando viram sair das ruínas, altivo, o bravo Antônio Lima, acompanhado de meia dúzia de sobreviventes.

Recife foi ocupada a 3 mar 1630, após 15 dias de resistência memorável e comovente. Mas os pernambucanos não renunciaram à luta.Matias de Albuquerque proclamou para toda a capitania a disposição de lutar até a morte.

Reunindo todos os bravos, solidários com a sua atitude, em local onde se uniam muitos dos caminhos que, de Olinda e Recife, demandavam o interior, estabeleceu, em curto prazo, o Arraial do Bom Jesus.

Este forte, foi construído com sólidos baluartes e bem protegido por formidáveis trincheiras e fossos, e resistirá impávido, durante cinco anos, às arremetidas e à ânsia de conquista do invasor .

Completou o sistema defensivo o estabelecimento de um anel de cerco em torno de Recife e Olinda, constituído de estâncias, para evitar que o inimigo saísse impunemente de Recife para abastecer-se de água e lenha.

Este conjunto fazia parte, ao mesmo tempo, do sistema de defesa do interior pernambucano e da linha de bloqueio terrestre de Olinda e Recife.

Era uma solução brasileira estratégica , inteligente e criativa para o problema militar e uma manifestação de Doutrina Militar Terrestre genuinamente brasílica.

Os holandeses se fortificaram, construíram os fortes do Brum e das Cinco Pontas, até hoje existentes.Este trabalho de fortificações não foi calmo e tranqüilo.Os luso-brasileiros organizaram emboscadas e, a toda a hora do dia e da noite, desfecharam ousados e mortíferos golpes-de-mão contra o inimigo.Ao invasor não foi permitido andar despreocupado, mesmo em seus domínios.A morte rondava seus passos, quando se aventuravam sair das fortificações.A ligação terrestre Olinda-Recife transformou-se em estrada fatal para os holandeses.

Em conseqüência, plantada a terra, dela nada usufruíam para a subsistência e manutenção da conquista.

Sua alimentação tornou-se dependente da Europa ou de alguma expedição corsária sobre o litoral. A terra e os filhos de Pernambuco negavam tudo ao invasor, tornando-lhe a vida um inferno.

Nas estâncias de cerco de Recife e Olinda, revezavam-se na enxada e no arcabuz, plantavam e lutavam.

Segundo Lopes Santiago, "O mantimento era escasso, sucedendo, muitas vezes, os soldados não terem uma espiga de milho para a ração".

O invasor era reforçado continuamente. Até o final de 1630, chegaram a Pernambuco 3.500 homens.Para os defensores, nada foi enviado da Metrópole, em um ano e meio.

No início de 1631, fundeou em Recife a esquadra de Adrian Jansen Pater, composta de 16 navios e cerca de 1.000 homens.A 13 de julho, aportou em Salvador a esquadra luso-espanhola, sob o comando de D. Antônio de Oquendo, constituída de 32 navios com 2.000 homens.

Em 12 setembro, as duas esquadras se enfrentaram em Abre Olhos, (Abrolhos)com a vitória espanhola. Isso possibilitou ao Arraial do Bom Jesus(Velho)ser reforçado com tropas do Conde Bagnuoli (forma preferível a Bagnuolo).

Golpes-de-mão mais audazes foram desferidos contra o inimigo, que passou a temer o duplo ataque por terra e por mar, e tratou de abandonar Olinda e fortificar-se ainda mais em Recife.Antes do abandono de Olinda, os holandeses propuseram entregá-la mediante pesado resgate, caso contrário, arrasariam-na. Matias de Albuquerque, o 1º brasileiro a ser general de Portugal, assim lhes respondeu com altivez:

"Os pernambucanos, com armas na mão, não compram, conquistam. Sabem dar cargas de balas de mosquete e não de caixas de açúcar. Com os inimigos a quem falta a fé são instáveis os contratos que firma o sangue, e de nenhuma firmeza os que afiança a palavra. Queimai Olinda, se a não podeis guardar, que nós saberemos edificar outra melhor..."

E concluía que desejava deixar na lembrança de Pernambuco, por todos os tempos futuros, os triunfos da capitania e o castigo que sofreria o invasor.

No dia 25 nov 1631, os bravos heróis da resistência, com lágrimas nos olhos e a revolta na alma, viram ser consumida pelas chamas a bela, rica e majestosa capital de Pernambuco, fruto de quase um século de trabalhos árduos e sacrifícios ingentes.

A soldadesca batava estava desiludida com esta maneira de guerrear que consumia vidas, roubava tempo e poucos resultados apresentava.

Quando o desânimo começou a lavrar entre eles, desertou para suas fileiras e passou a auxiliá-los, o alagoano Domingos Fernandes Calabar. Sua deserção mudou o curso da guerra. Hábil e astuto nas emboscadas, passou a guiar o inimigo desvendando-lhe os segredos da terra, que lhe servira de berço. Ensinou-lhe a "guerra brasílica"! ...

E aconteceu a campanha expansionista da conquista.

Durante essa vitoriosa campanha expansionista, destacou-se a brava resistência no Rio Formoso, um forte comandado por Pedro Albuquerque que dispunha de 20 homens. Intimados à rendição, responderam que lutariam até o último alento de vida.

Na quarta investida, o inimigo penetrou na fortificação e encontrou os corpos dos seus 20 bravos defensores, que cumpriram, com honra e glória, o juramento que fizeram, num protesto contra a invasão. Pedro de Albuquerque, ferido, jazia por terra.

O chefe Van Schkoppe comoveu-se com a bravura e heroísmo daqueles homens e apontou o belo exemplo a seus soldados. Ao ver Pedro de Albuquerque caído, mas com a espada empunhada , um combatente holandês correu para tomar-lhe a espada.

Van Schkoppe, ao perceber, gritou: "Alto! Não se toma a espada gloriosa de um herói". Pedro de Albuquerque foi socorrido e tratado com grande respeito. Concederam-lhe liberdade, sob palavra, até partir para Lisboa.

Grande diferença de atitude: a do alagoano Calabar, guiando o inimigo sobre o Rio Formoso, e a legendária e heróica reação do bravo pernambucano e seus 20 bravos companheiros ! ... E ainda há quem tente justificar a hedionda traição ...

O valente defensor morreu como governador do Maranhão.Seus restos encontram-se em Belém do Pará, na Igreja N. S. do Carmo.

A 24 mar 1633, guiados ainda por Calabar, 1.200 holandeses atacaram de surpresa o Arraial do Bom Jesus. Luís Barbalho e outros bravos capitães contra-atacaram fora do forte com tremenda violência. Repeliram a tentativa, ocasionando pesadas baixas. O próprio governador holandês, ferido mortalmente, faleceu logo após.

A guerra alcançou estágio bárbaro e desumano, e foi celebrado um acordo para coibir a selvageria. Proibiram-se a queima de templos, a fortificação de igrejas, a destruição de imagens, o tiro com armas de cano raiado, balas envenenadas e mastigadas, ofensas a prisioneiros e a execução de padres, crianças e mulheres.

E a expansão holandesa se acelerou. Em 12 dez 1633, capitulou o forte dos 3 Reis Magos, ficando a Paraíba entre fogo cruzado. E os luso-brasileiros se faziam presentes onde o inimigo tentasse o desembarque.

E a razão? Devia-se isso à excelente posição estratégica do Arraial do Bom Jesus(Velho), onde se concentrava o esforço defensivo dos pernambucanos, combinado com a excelente rede de espionagem em Recife. Assim que Matias de Albuquerque descobria a saída da esquadra holandesa para determinado ponto do litoral, enviava reforços do Arraial para o ponto ameaçado, os quais chegavam junto com os navios.

Na noite de 1º mar 1634, desferiu ousado golpe-de-mão sobre Recife o célebre capitão Martim Soares Moreno. Era o que se denominaria hoje um operação de comando, para incendiar a povoação e destruir suprimentos.

Com 500 homens, atacou o porto em pontos diferentes. A incursão espalhou morte, confusão e terror entre defensores, por atingir o interior do recinto fortificado.

Após o período de resistência épica e disputa furiosa, e um cerco de um mês, em 8 abr 1635, o Arraial de Bom Jesus (Velho) capitulou.

Cumprira com o dever, como QG da resistência ao invasor, por 5 anos, quando seus defensores escreveram página imortal com muito sangue, vidas, fome, renúncias e heroísmo.

Nele, a alma vigorosa do povo, catalisada pelo ideal de defesa da terra e da fé católica, reunira-se, para um longo, sofrido, imortal e épico protesto contra a invasão da terra brasileira.

Renderam-se com dignidade, esgotadas a alimentação e a munição, e perdidas as esperanças de receberem qualquer auxílio. Não há, na longa história da guerra holandesa, símbolo mais significativo do espírito de resistência. Por isso, as ruínas existentes no atual Recife, no sítio da Trindade, devem ser percorridas com respeito e reverência patrióticas por todos os que visitarem o local. Os bravos que ali se bateram deram expressiva contribuição, no passado distante, para a conquista dos elevados objetivos de Soberania, Integridade, Integração e Preservação dos Valores Morais e Espirituais do Brasil.

E, sob a liderança de Matias de Albuquerque, retiraram-se para Alagoas.O percurso foi marcado por túmulos e cruzes de muitos retirantes que sucumbiram ao longo do caminho, vítimas de cansaço, fraqueza, fome ou doença.

Era o "...êxodo dos que não desesperavam...", na expressão de Capistrano de Abreu.

Perderam aqueles bravos uma batalha. Muitos retornariam para ganhar a guerra decisiva. Muitos tiveram a ventura de voltar.

Na retirada, reconquistaram Porto Calvo, onde prenderam o traidor Calabar, que, submetido a julgamento, foi condenado à morte. A coluna do sofrimento e da humilhação assistiu à execução por enforcamento e ao esquartejamento de Calabar.

À coluna de Matias de Albuquerque reuniu-se à tropa do Conde Bagnuoli em Alagoas.Em 18 jan 1836, houve a Batalha de Mata Redonda, comandada por D.Rojas y Borja,ali morto em combate e que substituíra Matias de Albuquerque, chamado à Europa.

Sem liderança, os luso-brasileiros retiraram-se. Não se completou o desastre tático, graças aos bravos Rebelinho e Felipe Camarão que, na cobertura da retirada, praticaram prodígios de audácia e valor, criando condições para que os destroços do exército fossem acolhidos em Porto Calvo.

Na realidade, as operações do general D.Rojas, marcadas de modo tão trágico no campo tático, foram, no campo estratégico, de brilhantes conseqüências. Obrigou o adversário a abandonar Porto Calvo mais uma vez, interrompendo, assim, a execução do seu plano de criar uma zona morta ao sul do rio Manguaba. Ocupada fortemente agora a região de Porto Calvo pelos nossos, ficava o invasor, sem sua via de transporte terrestre, se não cortada, pelo menos seriamente ameaçada.

Bagnuoli assumiu o comando e concentrou resistência em Porto Calvo, cobrindo-se da direção norte, na linha do rio Una.

A localidade atraiu quantos desejavam lutar contra o invasor, reunindo 2.000 homens, e tornou-se o mais poderoso baluarte da resistência, centro de irradiação de lutas e última esperança de uma vitória.

Foram organizadas "Companhias de Emboscada", sob a liderança dos mais bravos e experimentados capitães. Elas irromperam, inesperadamente, em todos os pontos do território ocupado, destruindo canaviais, tomando recursos, punindo colaboracionistas, e mantendo viva, nas populações subjugadas pelo invasor, a esperança de liberdade.

O inimigo perdeu a possibilidade de locomover-se na conquista. A toda hora e lugar, a morte rondava-lhe os passos, sob a forma de flecha ou bala.

As iniciativas de soerguimento econômico da lavoura canavieira pelo invasor eram frustradas pela emboscadas que tudo incendiavam e destruíam com estratégia.

O Governo de Maurício de Nassau.-3 O Período--Em 23 jan 1637, desembarcou no Recife Maurício de Nassau. Ao chegar, reconheceu que era essencial eliminar o último foco de resistência - Porto Calvo-, condição essencial para restabelecer a segurança no campo, visando o soerguimento da lavoura canavieira, além de destruir as derradeiras esperanças dos pernambucanos na reconquista da terra.

Em 3 mar1637, caiu em suas mãos Porto Calvo, depois de uma luta desigual de 10 x 1, com sítio terrestre que durou 15 dias e que contou com bombardeio de canhões de grosso calibre. Forçado, Bagnuoli retirou-se para o sul do rio São Francisco.

Depois de tudo isso, Naussau levantou dois fortes na margem esquerda do rio São Francisco, consolidando, assim, a conquista de Pernambuco.

A Holanda dominava, agora, imenso, rico e estratégico território no Brasil, desde o Rio Grande do Norte até o rio São Francisco.

As perspectivas de rápida recuperação econômica da capitania, aliadas a uma tolerância religiosa mínima, e clima de respeito aos moradores, fizeram arrefecer o sentimento de revolta dos luso-brasileiros para com o invasor.

Em conseqüência, Nassau criou ambiente tranqüilo em torno da base naval do Recife, e aplicou-se a estender o domínio da Holanda ao restante do Brasil.

Em 1º mai 1638, Nassau atacou a Bahia, em Salvador. Ao ultimato aos baianos, teve como resposta:

"As cidades de el-rei não se rendem senão com balas e espada na mão, e depois de muito sangue derramado".

Nassau não conseguiu sitiar completamente a praça, deixou abertas algumas comunicações com o interior.

No dia 18 maio, 3.000 holandeses assaltaram as trincheiras com fúria. No mais aceso da peleja, acometeu a retaguarda inimiga, de surpresa, o bravo capitão Luís Barbalho.

O contra-ataque obrigou o invasor à retirada precipitada, causando muitas baixas em suas fileiras. A 26 maio 1638, por se ter tornado insustentável a permanência na Bahia, Nassau retornou a Pernambuco, humilhado com o insucesso da expedição.

Na defesa das trincheiras de Salvador, morreu o intrépido capitão Sebastião Souto, considerado um mestre da arte de guerra da emboscada ou "guerra brasílica".

Sucedeu-lhe, no comando e na fama, neste tipo de guerra, Antônio Dias Cardoso, que tão assinalados serviços iria prestar à continuação da luta.

Essa expedição de Nassau era o terceiro malogro dos holandeses, no sentido de ocupar território baiano.

O Recôncavo estava defendido por 11 fortes, e a cidade envolvida por muralhas, protegidas por trincheiras. Salvador era agora ,jardim com fortes muros e tesouro muito bem garantido. Aprendera muito com a invasão de 1624.

Em janeiro 1639, aportou em Salvador a Esquadra do Conde da Torre, que vinha incumbido de libertar Pernambuco. Enviou lideres em emboscadas para a Paraíba e Pernambuco, a fim de atrair o invasor para o interior.

Recrutou tropas no sudeste, inclusive o bandeirante Raposo Tavares, que liderou a tropa expedicionária vinda de São Paulo e Rio de Janeiro.

O Conde da Torre, ao tentar desembarcar em Pau Amarelo, foi impedido por esquadra invasora. Perseguido, aceitou combater e foi batido: um grande desastre!

Parte da esquadra do Conde da Torre foi desembarcada em Ponta do Touros, no Rio Grande do Norte, sob o comando de Barbalho e integrada por Henrique Dias; os combatentes sulistas comandados por Raposo Tavares. Decidiram abrir caminho de volta à Bahia a ferro e fogo, percorrendo 400 léguas de território ocupado pelo inimigo.

Ao fim de quatro meses de épica marcha, na retaguarda inimiga, assinalada por combates e padecimentos, entraram triunfantemente em Salvador, após vencerem inúmeros obstáculos, relatados por Luís Barbalho e Henrique Dias, em documentos revelados por José Antônio Gonçalves de Mello Neto.

Comandou este feito e com ele se imortalizou Luís Barbalho,atualmente denominação histórica da unidade de Infantaria de Feira de Santana, na Bahia.

Estes bravos, liderados por filhos da Terra Brasileira, salvaram de destruição a força expedicionária, chegaram em tempo à Bahia para fazer malograr uma expedição punitiva, reacenderam a chama da reação e causaram grandes prejuízos ao plano de Nassau de recuperação econômica de Pernambuco, e deram às gerações brasileiras do porvir exemplo imortal de responsabilidade na defesa do nosso solo.

Nesta marcha, participaram tropas de São Paulo, do Rio de Janeiro e de outras capitanias do sul, que ofereciam, assim, já naquela época, magnífico exemplo de solidariedade e integração, constante na história do povo brasileiro.

Em março de 1640, Nassau enviou à Bahia uma expedição punitiva de 1.300 homens.

Em fevereiro 1641, chegou ao Brasil a notícia da Restauração do Trono de Portugal, em decorrência do movimento de 1º de dez 1640, liderada pelo Duque de Bragança, coroado rei de Portugal como D. João IV, pondo fim à União das Coroas Ibéricas. Impossibilitado de sustentar guerras contra a Holanda e Espanha, Portugal concordou em celebrar tratado de aliança ofensiva e defensiva contra a primeira e um armistício de dez anos nas lutas das colônias.

Reconheceu a conquista de Pernambuco, Paraíba e Rio Grande do Norte, e acedeu na cessação das hostilidades contra os holandeses no Brasil, enviando determinação expressa. A Holanda comprometeu-se a não expandir suas conquistas no Brasil durante dez anos.Enquanto isso, Maurício de Nassau expandia a conquista em Sergipe, em 1841, e no Maranhão, em desrespeito ao tratado, que só publicou 2 anos depois .

Mandou recensear as populações das vilas, para controlá-las rigorosamente e, assim, descobrir, com base em sua movimentação, a presença de "companhias de emboscada" partidas da Bahia ou da insurreição pernambucana em marcha.

Os atos de Nassau concorreram para o amadurecimento da idéia de rebelião, que resultaria na Insurreição Pernambucana.

A resistência heróica dos luso-brasileiros havia debilitado os negócios da Companhia das Índias no Brasil. Nassau partiu para a Holanda em jul 1644. Em 28 fev 1644, com o concurso do Pará, o Maranhão libertou-se do jugo holandês.

A Insurreição estava em marcha no Nordeste. Os holandeses,a fim de atrair os índios para a sua causa, concederam-lhes liberdade ampla e total. E estes passaram a guerrear os luso-brasileiros com crueldade; no Rio de Grande do Norte, eles massacraram barbaramente luso-brasileiros reunidos numa igreja em Cunhaú; alguns tiveram, inclusive, os corações arrancados pelas costas. Isso incendiou ainda mais os ânimos.

A Insurreição Pernambucana - 4º Período-- Os luso-brasileiros prosseguiram na luta a despeito de ordens em contrário de Portugual.Com esforço hercúleo, vontade inquebrantável, fé, sacrifícios indescritíveis e processos de combate genuinamente brasileiros, criariam condições para a recuperação de Pernambuco e Angola para Portugal, além de preservar a unidade física e espiritual do Brasil.

Por essa razão, o presente período, que poderia ser chamado Epopéia Brasílica, reveste-se da maior relevância do ponto de vista da nacionalidade brasileira e das origens do Exército.

Em 1945, a FEB, ao retornar vitoriosa da Itália, depositou os louros da vitória no campo de batalha dos Guararapes, e seu comandante general Mascarenhas de Morais proferiu estas palavras imortais:

"Nestas colinas sagradas, na batalha vitoriosa contra o invasor, a força armada do Brasil se forjou e alicerçou para sempre a base da nação brasileira".

Causas da Insurreição Pernambucana:

Insolvência de dívidas de luso-brasileiros e holandeses em decorrência do fracasso da lavoura canavieira, por circunstâncias adversas de toda ordem, determinando a queda das ações da Companhia das Índias Ocidentais, do valor nominal de 100 para 33.

Agravamento da situação, por especulações extorsivas praticadas por comerciantes estrangeiros do Recife, operando em mercado paralelo à Companhia e fora do controle desta.

Antagonismo religioso católicos x calvinistas, exacerbado com a partida de Nassau.

Rivalidade moradores luso-brasileiros e holandeses do campo x Companhia e comerciantes de Recife, por terem ficado reduzidos, os primeiros, à condição de escravos econômicos dos segundos, em razão da insolvência de dívidas.

Expansionismo da Holanda, ameaçando conquistar todo o Brasil e domínios de Portugal na África, em desrespeito ao tratado celebrado, aproveitando-se da fraqueza militar de Portugal em guerra contra a Espanha.

Malquerença política irreversível pernambucanos x invasores, resultado de seis anos de luta cruel e feroz pela posse da terra, sentimento abrandado com Nassau, e exacerbado com sua partida..

Franqueza militar do invasor em Pernambuco, reduzido em seus efetivos, em conseqüência de armistícios e compressão de despesas.

Para responder à astúcia do conquistador, Portugal e patriotas elaboraram um plano secreto, que objetivava a conquista rápida do Recife, com a finalidade de expulsar os holandeses, que, sem respeitar tratado, continuavam expandindo suas conquistas no Brasil e na África.

Devia ser demonstrado por todos os meios que a insurreição era iniciativa única dos patriotas de Pernambuco, e à revelia de Portugal e da Bahia, tudo dentro da realidade diplomática da época, em que as palavras não correspondiam às ações.

Se descoberto o apoio e incentivo de D. João IV ao plano, ficava em perigo a própria independência de Portugal.

Uma esquadra, sob o comando do almirante Salvador Correia de Sá e Benevides, seria enviada para as águas do Recife, simulando intenção de auxiliar os holandeses a debelar a insurreição, mas, na realidade, para desembarcar e consolidar a conquista dos insurgentes.

Enquanto isso, Portugal, através de manobras diplomáticas habilidosas, procuraria mostrar inocência na intervenção, para evitar abrir frentes de luta com a Holanda, pois já guerreava com a Espanha.

Da Bahia, foi enviado o sargento-mor Antônio Dias Cardoso para, em 6 meses, antes do início da insurreição, organizar e treinar secretamente o exército patriota na Mata do Brasil, em íntima ligação com o líder civil do movimento em Pernambuco - João Fernandes Vieira, que mantinha contrato com o invasor para a exploração do pau brasil.

Aquela região, eleita base de guerrilhas patriotas, compreendia os atuais municípios de Vitória de Santo Antão, São Lourenço e Nazaré da Mata, onde era explorado o pau-brasil sob a direção e controle de Fernandes Vieira.

Completou-se o apoio externo pelo envio para Pernambuco das tropas de Felipe Camarão e de Henrique Dias, simulando-se que o primeiro se havia rebelado, e que o segundo fora mandado em seu encalço a fim de prendê-lo e recambiá-lo para a Bahia.

Dias Cardoso fora o bravo e experimentado militar, veterano das lutas do período 1624-1641. Hoje, é denominação histórica do Batalhão de Forças Especiais do Exército.

Possuía excepcional folha de serviços, aliada à reputação de mestre na arte de guerra de emboscada. Profundo conhecedor da região, era estimado e respeitado, pela sua bravura, intrepidez e valentia, por Vidal de Negreiros, Camarão e Henrique Dias, e pelo próprio Fernandes Vieira.

João Fernandes Vieira assim resumiu a vida desse bravo, desde sua chegada até a insurreição:

"Deu cumprimento às ordens que possuía, com fervor necessário a tão importante missão, começou a atrair e adestrar militarmente o povo para a insurreição em diversos locais, despendendo com isto sete meses, todos passados nas matas(do pa-brasil) ao rigor do tempo, para fugir ao inimigo, que se pôs a buscá-lo, colocando em grande perigo sua vida".

No dia 23 mai 1645, 18 líderes insurretos firmaram este compromisso imortal:

"Nós, abaixo assinados, nos conjuramos e prometemos, em serviço da liberdade, não faltar a todo tempo que for necessário, com toda ajuda de fazendas e de pessoas, contra qualquer inimigo, em restauração da nossa pátria; para o que nos obrigamos a manter todo o segredo que nisto convém, sob pena de quem o contrário fizer, será tido como rebelde e traidor e ficará sujeito ao que as leis em tal caso permitam".

Surgia, assim, pela primeira vez no Brasil, a palavra pátria, e a firme disposição de instaurá-la, a despeito mesmo de interferências contrárias de Portugal.

Faltando poucos dias para a insurreição, os patriotas foram traídos e caiu por terra o plano de conquista rápida do Recife.

Ao ser ordenada a prisão dos líderes, estes não foram encontrados. Perseguidos, em 13 junho, os patriotas, reunindo 1600 homens do povo e com 250 armas, encetaram sua marcha e foi engrossando pelo caminho com novas, sob forte pressão inimiga.

No Sítio do Covas, em que os patriotas acamparam 22 dias, surgiu séria disputa pela liderança, vencida por Fernandes Vieira. E prosseguiram sob fortíssima pressão.

 

A batalha do Monte das Tabocas--A 3 ago 1645, travou-se, no Monte das Tabocas, em Vitória de Santo Antão, o primeiro encontro entre um contingente do exército holandês a serviço da Companhia das Índias Ocidentais e o Exército dos Patriotas, constituído, principalmente, de civis pernambucanos, sob a orientação profissional de Antônio Dias Cardoso.

Dias Cardoso, ao perceber a aproximação do inimigo, despachou em sua direção pequena força de cobertura, ao comando do capitão João Nunes da Mata, com a finalidade de atraí-lo para o Monte das Tabocas.

O inimigo bateu e dispersou essa força, prosseguindo até a margem do rio Tapucurá, quando carregou com enorme alarido e estrondo sobre a vegetação da margem, ao imaginar que existissem emboscadas.

A vanguarda atravessou o rio, e Dias Cardoso foi ao seu encontro, a fim de jogá-lo nas emboscadas que preparara com o intrépido capitão Agostinho Fagundes, no comando de 40 homens.

Após oferecer alguma resistência, esta fração foi obrigada a retrair, através de uma única passagem no áspero e impenetrável tabocal, que corria na base do monte, envolvendo-o pelo oeste e sul.

O inimigo atravessou o rio e tomou formação de combate, numa larga campina entre a margem do Tapacurá e o tabocal.

A seguir, com um flanco apoiado em cada lado, progrediu em direção à passagem do tabocal, de onde saíra novamente Agostinho Fagundes a seu encontro.

Tinha caído na armadilha de Dias Cardoso: três emboscadas o esperavam!

Atrás da trincheira vegetal de 15 metros de espessura, e com um único acesso para dois homens, lado a lado, Dias Cardoso adotou o dispositivo:

Cerca de 90 armas em linha, ao longo do tabocal, em posições de tiro previamente preparadas, constituindo as emboscadas.

Reserva, aproximadamente 50 homens em duas frações, em condições de reforçar as emboscadas ou a defesa da entrada da trincheira natural formada pelo tabocal.

O restante das armas, 110, distribuiu-se com a força de cobertura, Agostinho Fagundes e frações de segurança de retaguarda e flancos.

Com a reserva, composta de 1.350 homens, para a defesa de Fernandes Vieira, deixou 30 armas.

A vanguarda inimiga, após grande resistência, obrigou Agostinho Fernandes a retrair e infiltrar-se no tabocal.Parte do corpo de batalha conseguiu penetrar na passagem estreita, por cuja posse se travou luta feroz e demorada, sob a direção de Dias Cardoso, que substituiu os combatentes menos cansados pelos mais cansados, até que repeliu o atacante.

A tentativa de envolvimento foi evitada pela segurança de retaguarda e por um atirador isolado da proteção de flanco, que atingiu, mortalmente, o comandante da vanguarda - capitão Falloo. Após reorganizar-se, o inimigo partiu para outro ataque em toda a frente, visando a penetrar ao longo da linha do tabocal.

Progrediu e conseguiu, após muita luta, introduzir-se em diversos pontos da linha de resistência, isolando e fixando seus defensores, inclusive Dias Cardoso, que os investiu bravamente.

Fixada parte das tropas dessa linha, o inimigo começou a adiantar-se em direção ao alto do monte, onde se encontrava a reserva constituída do povo, desarmada, sob a direção do capitão padre Simão de Figueiredo, e o próprio comandante da insurreição, João Fernandes Vieira.

Na iminência do perigo, este conclamou o povo ao esforço derradeiro, à luta pela honra de Deus, e prometeu liberdade a 50 servos de sua guarda pessoal, se se mostrassem valorosos no combate.Os escravos, na perspectiva de liberdade, desceram o monte em duas partes, armados com arcos, flechas, lanças e facões, tocando flautas, atabaques e buzinas.

Na esteira destes bravos, veio todo o povo, com os mais variados tipos de armas, na maioria instrumentos de trabalho.E o contra-ataque transformou-se num corpo-a-corpo feroz e desordenado, com patriotas a surgir de todas as direções, lançando-se aos magotes sobre o inimigo, obrigando-o a bater em retirada. Venceram os insurretos.

"Graças ao sargento-mor Antônio Dias Cardoso e mediante favor divino, alcançamos vitória, tudo alcançado após Deus, pela boa ordem com que Dias Cardoso dispôs a batalha, dando a todos os oficiais muito exemplo com sua militar doutrina e conhecido esforço que, em quatro horas de batalha, mostrou sem descansar, acudindo a todas as partes com bravo ânimo" ( testemunho de Fernandes Vieira).

O combate da Casa Forte-- Em 17 ago, o Exército Patriota reforçado e com

moral elevado, atacou a Cara Forte. Coube a Antônio Dias Cardoso a concepção e disposição do ataque ao engenho de Ana Pais. Após breve período de combate, renderam-se os remanescentes do exército da Companhia, efetivo de 450 homens, entre índios e brancos.Aos 250 holandeses foi dado quartel e condições de regresso à Europa.Os índios, somando 200, foram justiçados sob o argumento de traição à fé católica, conforme as leis de guerra da época, e como exemplo aos demais. Punia-se, assim, também, o massacre do Cunhaú, no Rio Grande do Norte.

E o incêndio patriota se alastrou com vitória atrás de vitória e adesões em massa à insurreição. Resistiam, em mãos do invasor, Recife, a ilha de Itamaracá, os fortes dos Três Reis Magos e Cabedelo, no final de 1644.

Falhou no plano de D. João IV, a queda rápida do Recife sem o concurso de artilharia de sítio. Recife era fortaleza inexpugnável, separada da terra por largo e profundo fosso - os rios Capibaribe e Beberibe. Não foram aprisionadas as autoridades holandesas, cujo resgate seria a entrega do Recife.

A 12 de agosto de 1647, D. João IV, vencido na luta diplomática, decidiu mandar restituir o que os patriotas haviam tomado no Brasil, com a condição de ser-lhe devolvida a ilha de Itaparica. Perigavam a independência de Portugal e todo o esforço dos patriotas do Brasil.

A luta no Brasil prosseguiu, e a ordem para a sua cessação, emanada de Portugal, recebeu a seguinte resposta dos patriotas:

"Combateremos até o fim; e somente após expulsar o invasor, iremos a Portugal receber o castigo pela nossa desobediência".

Não contando com o bloqueio naval de Salvador de Sá, e sendo inútil qualquer tentativa de reconquistar Recife, decidiram os insurgentes cercá-la.

Foi construído o Arraial Novo do Bom Jesus, onde se abrigaram os patriotas e a alma da resistência. Recife foi cercada por estâncias, as quais tinham a missão de ali fixar o inimigo e retardá-lo, até o recebimento de reforços do Arraial, em caso de rompimento do cerco ou de ataque a qualquer delas. Os insurretos ficaram com liberdade total no interior, e com o porto de Nazaré para comunicar-se com o exterior e receber reforços.

Na madrugada do Ano Novo de 1646, Recife foi acordada com o troar ensurdecedor dos canhões do Arraial, tomados aos holandeses em Porto Calvo.Eles anunciavam ao inimigo a disposição de um povo heróico. "Não vos iludais, senhores, que o Brasil não foi feito para vós, não percais tempo, voltai para casa", foi o que disseram os nossos, pela voz de um dos seus chefes.

Do heroísmo e disposição dos bravos do Arraial diz este depoimento holandês: "Apesar de suportarem duramente reveses do mar, muita necessidade de vestiário, de carne e de tudo, e de viverem em contínuo sobressalto, recusaram o perdão que lhes oferecemos . Nenhum veio ter conosco, persistem obstinados em sua rebelião".

À projeção histórica dos Montes Guararapes liga-se intimamente o Arraial Novo do Bom Jesus, abrigo sagrado do espírito de resistência, e, hoje, chão sagrado da nacionalidade brasileira.

O cerco do Recife tornou-se rigoroso em junho 1646, e a situação da praça angustiosa e insustentável. Foi estabelecido racionamento severo para enfrentar a fome com todos os seus horrores. A penúria era tamanha, que atingiu as pessoas mais influentes.

Consumiram-se ratos, cães e gatos; os escravos dos holandeses foram vistos desenterrando cavalos mortos de inanição para se alimentarem. Viram-se oficiais batavos, no leito em vazante do Capibaribe, disputando com o povo um caranguejo.

Quando a praça estava prestes a capitular, chegaram da Europa reforços e mantimentos. Os holandeses em expedição atacaram mais uma vez Salvador.

Os patriotas pernambucanos, por seu turno, aproveitando o enfraquecimento do Recife, com a saída da expedição à Bahia, urdiram ousado e inteligente plano.

Secretamente, durante vinte e três noites, levantaram a fortaleza do Asseca, no atual cais da Aurora, nela trabalhando, indistintamente, oficiais, soldados e civis, não tendo sido admitida mão escrava.

Concluída, na manhã de 7 nov 1646, rompeu violentíssimo bombardeio patriota sobre Recife, acompanhado de toques de tambores e gritos.

Do que foi este bombardeio e seus efeitos, diz bem Lopes Santiago:

"O inimigo desocupou os sobrados e refugiou-se em abrigos que construiu nas lojas onde passaram a dormi. E as naus holandesas que entravam e saíam pela barra eram atingidas. Essa resolução foi uma das coisas mais importantes que se fez neste Estado".

Um patriota, aproveitando-se da confusão, numa ação de comando, penetrou na praça e invadiu o antigo palácio de Nassau, matando muitos e trazendo diversos troféus.

Tão grandioso feito militar teve enorme repercussão estratégica, pois fez voltar, por simples ação de presença, às mãos dos baianos, a ilha de Itaparica, e criou condições para que aportasse em Salvador, tranqüila e sem luta, furando o rígido bloqueio naval, uma esquadra portuguesa, com reforços e o novo Governador-Geral D. Antônio Teles de Menezes.A 24 abr 1646, ocorrera em Tejucopapo , próximo a Goiana, belo e comovente episódio, no qual mulheres e jovens imberbes enfrentaram o invasor com determinação e bravura.

O combate de Tejucopapo :Um desembarque holandês atacou o fortim de pau-a-pique - Tejucopapo. Percebendo que se desagregara a resistência, o agressor, a golpes de machado, iniciou a abertura de brechas na paliçada, para penetrar no fortim e trucidar e desonrar seus ocupantes, em represália aos efeitos mortíferos das emboscadas.

Nesse momento crítico, em que o pânico começou a lavrar, destacou-se uma brava mulher com crucifixo na mão; percorrendo o reduto. Ela concitou as outras, a pegarem em armas e correrem à paliçada, para morrerem juntas, lutando pela Liberdade Divina e pela Pátria.Seu apelo foi atendido! Todas, apanhando foices, porretes e tudo que estava ao alcance das mãos, lançaram-se aos magotes sobre o adversário, que já penetrava no reduto por brechas abertas na paliçada, obrigando-o a retroceder.Outras começaram a lançar nos rostos dos invasores, que se aplicavam em alargar as brechas, água com pimenta malagueta.

Atacado por reforços, o inimigo desengajou e reembarcou humilhado e abatido.

Tejucopapo é um dos poucos episódios conhecidos de participação coletiva armada, da mulher e juventude brasileiras, em defesa do solo pátrio.

A 23 jan 1648, fugiu do Recife, onde se encontrava preso havia quase um ano, o mestre-de-campo general Francisco Barreto de Menezes, mandado a Pernambuco, por D. João IV, para comandar a guerra.

Barreto foi recebido no Arraial Novo do Bom Jesus com grande alegria. Assumiu a chefia das operações. Sua experiência militar brilhava também pela sua participação na epopéia da marcha de Luís Barbalho, do Rio Grande do Norte à Bahia.

A 18 de março, aportou no Recife poderosa esquadra holandesa da Companhia da Índias , composta de 41 barcos, transportando mantimentos e 6.000 soldados.

Com este poderio, o invasor decidiu romper o cerco do Recife, marchar na direção sul, zona de retaguarda patriota, para conquistar o Cabo e adjacências, com a finalidade de controlar bases de suprimentos próximas e além, cortar nesta região o apoio externo aos patriotas e criar condições de prosseguimento por terra, para conquista da Bahia.

Ao executar esse ambicioso plano, ocorreu a primeira Batalha dos Guararapes.

Este feito heroico hoje é comemorado com grande destaque pelas mulheres do local .

A Primeira Batalha dos Guararapes-- Ao clarear do dia 18 de abril, o exército da Companhia das Índias Ocidentais, ao comando do ten-gen Van Schkoppe, marchou na direção dos Guararapes, com 6.300 homens.

Ao atingir Afogados, fez uma finta para demonstrar que sua intenção era um ataque ao Arraial Novo do Bom Jesus, para ali fixar os patriotas.

Dias Cardoso, mandado para esclarecer a situação, descobriu o verdadeiro propósito inimigo. Em Conselho de Guerra, os luso-brasileiros decidiram: retardar o invasor na Barreta, travar batalha o mais distante do Recife e defender o Arraial do Bom Jesus contra a ação diversionária do inimigo.

Em cumprimento à decisão, o exército de patriotas, composto de 2.200 homens, rumou ao sul para, em caminho, interceptar o invasor e travar a batalha decisiva.

O general Barreto, prudentemente, confiou aos seus chefes imediatos a condução pormenorizada das ações, pois eles conheciam melhor o terreno e a tática desenvolvida naquela luta.

Após um Conselho de Guerra para decidir impasse entre Vidal e Vieira sobre o local adequado para a batalha, e atendendo a sugestão de Dias Cardoso, "na qualidade de soldado mais prático e experiente em tudo", rumaram para o Boqueirão dos Guararapes, que foi ocupado até as 10 horas da noite 18 / 19 abril 1648.

O exército inimigo, após vencer uma resistência na Barreta, degolando barbaramente muitos de seus bravos defensores, seguiu tranqüilo e vagaroso para o sul, esperando encontrar 200 patriotas à sua frente, de guarnição nos Guararapes.

Na manhã de 19, no momento em que os da Companhia das Índias Ocidentais se aproximavam de Boqueirão, passagem estreita, mas longa, entre o monte central e os alagados em sua base, saiu-lhe ao encontro Dias Cardoso, no comando de 200 homens, enquanto todo o restante do exército patriota permaneceu escondido. Com imprudência e entusiasmo, os holandeses desdobraram-se e partiram para atacar a fração de Dias Cardoso, o único

inimigo que esperavam encontrar. Este retraiu pelo interior do Boqueirão, tentando envolver, através dos alagados e montes, a vanguarda e corpo de batalha.

No momento em que o adversário progredia nos alagados e, em grande número, no interior do Boqueirão, com drástica redução de frente, teve enorme surpresa. Pois caíram em grande emboscada, executada com habilidade por Dias Cardoso, reeditando o feito em Monte das Tabocas.

O exército luso-brasileiro, até então semi-escondido, à ordem de "Às espadas", atacou inesperadamente e com grande fúria e iniciativa.

O Terço de Pernambuco, o mais forte, ao comando de Fernandes Vieira, auxiliado por Dias Cardoso, investiu no Boqueirão, rompeu o grosso do inimigo e envolveu a sua ala (flanco esquerdo) nos alagados.

O de Felipe Camarão assaltou a ala direita (flanco direito), e o de Henrique Dias, a ala esquerda, ficando o de Vidal de Negreiros em reserva, junto ao Boqueirão.

O primeiro embate foi vencido, ocasionando muitas mortes e deserções nas fileiras batavas.

Refeito da surpresa, o inimigo acometeu com a retaguarda, forte, de 1.200 homens, a ala de Henrique Dias, na proporção de 1 para 3. Contido, foi, em seguida, atacado vigorosamente pela reserva comandada por Vidal de Negreiros.

Após luta feroz de quatro horas, os patriotas impuseram retirada ao inimigo, com Van Schkoppe ferido e muitos oficiais mortos. As perdas holandesas totalizaram 1.038 homens, entre mortos e feridos, contra 480 dos patriotas, dos quais, 80 tombaram para sempre, sendo sepultados em local à frente de onde foi erigida a igreja N.S dos Prazeres dos Guararapes.

A vitória dos Guararapes, em 19-04-1648, não foi, portanto, obra fortuita dos acontecimentos, mas resultado da ação vigilante e decidida dos chefes, da bravura e espírito combativo dos soldados que constituíam aquele indomável exército de patriotas.

Hoje, em 19 de abril, comemora-se o Dia do Exército Brasileiro, por haver despertado o seu espirito no consenso de analistas de nosso processo histórico.

A 12 mai 1648, partiu do Rio de Janeiro, ao comando de seu Governador, Salvador de Sá, uma expedição composta de luso-brasileiros, com destino a Angola, para devolvê-la a Portugal.

Após furar o bloqueio flamengo, ela atingiu a África. E lá, através de vitoriosas manobras militares contra uma força superior e bem fortificada, em São Paulo de Luanda, reconquistou aquela possessão, em agosto do mesmo ano. Nucleava esta força o atual Regimento Sampaio. Foi a 1ª expedição transcontinental militar brasileira, conforme escrevemos em artigo "Angola e a 1a Força Expedicionária brasileira -1648" .A Defesa Nacional.744,jul/ago 1989.pp.150ss e em "A saga do Regimento Sampaio". Noticiário do Exército .n o 8666,de 11 jun 1993.

A segunda batalha dos Guararapes -A 17 fev 1649, 3.650 holandeses,

ao comando do coronel Brinck, decidiram deixar Recife e ocupar os Montes Guararapes, de onde esperavam atrair os patriotas luso-brasileiros, com seus 2.640 homens, a uma batalha decisiva e vingadora da humilhante derrota que sofreram em 19 abril de 1648.

Após uma marcha forçada, estacionaram nos Guararapes, numa cópia da manobra usada pelos patriotas na primeira batalha mencionada .

O exército patriota, ao ver ocupado o Boqueirão de Guararapes, infiltrou-se durante a noite de 18 através de passagens existentes ao oeste dos montes Guararapes Postou-se pela manhã à retaguarda do exército da Companhia das Índias Ocidentais, sem revelar sua força e dispositivo.

Frustrados pelo fracasso de seu plano militar e castigados pela sede e sol inclemente, os holandeses decidiram retornar ao Recife, no início da tarde de 19 de fevereiro, na crença de que os patriotas, muito enfraquecidos, segundo informações recebidas, não interfeririam na manobra.

À tarde, após retirar quatro regimentos de posição, para iniciar a marcha de retorno ao Recife e deixar somente dois para cobrir o retraimento, os holandeses foram atacados de surpresa.

Os luso-brasileiros, com seis unidades de Infantaria, comandadas por Fernandes Vieira, Henrique Dias, Camarão, Figueiroa, Vidal de Negreiros e Dias Cardoso, e duas companhias de Cavalaria, por Antônio Silva e Manoel de Araújo, atacaram em toda a frente, saindo de locais onde se mantiveram ocultos. E colheram mais uma brilhante vitória militar. Van Schkoppe, comandante holandês assim se referiu a este grande fracasso militar:

"A Cavalaria e a Infantaria se lançaram sobre os nossos regimentos e causaram tanta desordem que nem os oficiais, quer inferiores quer superiores, nem os soldados, puderam cumprir o seu dever, o que provocou tal consternação entre os nossos que a pena não poderia descrever . . . e a maior parte de nossas tropas se pôs a fugir, deixando-se matar sem resistência, como crianças".

E de um comentarista luso-brasileiro, contemporâneo da batalha: "A destruição não foi maior na perseguição porque cansados estavam os holandeses de fugir e os patriotas de matar e vencer."

Este desastre militar foi descrito por Van Goch, oficial holandês participante da batalha:

"Tivemos de recuar por causa da excessiva força do inimigo que atacou com tanta impetuosidade que nossas tropas começaram a fugir e acharam-se logo na maior confusão, que nem palavras nem força puderam retê-las, apesar de todos os esforços dos oficiais. As nossas tropas, entregues à desordem, à deserção e à confusão, dispersaram-se aqui e ali, por diversos caminhos, em direção ao mato e ao rio".

Antônio Dias Cardoso, denominação histórica do Batalhão de Forças Especiais, ao representar o Exército Patriota na troca de mortos e prisioneiros, respondeu, com toda a sua autoridade de mestre da "guerra brasílica" ou de emboscada, a um oficial inimigo que assegurou vitória no próximo confronto, combatendo disperso com o Exército Patriota:

"Melhor para nós, pois cada soldado nosso será um capitão, enquanto cada um dos vossos soldados necessitará de um capitão ao lado para combater".

Dias Cardoso estabeleceu assim a diferença entre o soldado patriota, encaminhado à luta por motivos patrióticos e o mercenário, engajado por dinheiro.

A vitória de 10-02-1649 definiu o destino brasileiro do Nordeste ou, segundo Gilberto Freyre, "Nos Guararapes definiu-se a sangue o destino do Brasil: o de ser um só e não dois ou três hostis entre si ...."

De tudo resulta a importância da evocação desse evento, que alicerçou a pátria brasileira. Se derrotado o Exército patriota em 19 fevereiro 1649, outro teria sido o destino do Brasil e dos brasileiros .

Estudamos as duas batalhas em As batalhas dos Guararapes - análise e descrição militar", em 1971 .Obra reformulada e apresentada pelo então Ministro do Exército Gen Ex Zenildo de Lucena para publicação pela BIBLIEX .Esta colocada no site da AHIMTB.

Ao rude golpe militar e econômico sofrido pelo invasor nas duas batalhas dos Guararapes, somam-se outros: A organização em Portugal da Companhia Geral de Comércio do Brasil, a guerra entre Inglaterra e Holanda, e a ruína da Companhia das Índias Ocidentais. Tudo isso contribuiu para que a Holanda perdesse a supremacia naval, no litoral do Nordeste.

A 14 jan1654, em ação combinada, exército de patriotas e esquadra da Companhia de Comércio do Brasil, composta de 44 navios, teve início o assédio do Recife. Em 10 dias de operações, a cidade caiu em mãos dos luso-brasileiros.

No dia 26, na Campina do Taborda, fronteira ao Forte de Cinco Pontas, os holandeses assinaram a rendição de todas as suas forças no Brasil. A guerra chegara a seu final.