17 - A PARTICIPAÇÃO MILITAR DO BRASIL NA SEGUNDA GUERRA MUNDIAL (1942-1945)

Introdução - 0 Brasil em guerra

As Forças Armadas do Brasil e Marinha Mercante na Guerra

A Comissão Mista Brasil - EUA

A mobilização militar do Brasil

O Exército Brasileiro

A Defesa Territorial do Brasil

A Força Expedicionária Brasileira

A 1ª Divisão de Infantaria Expedicionária 1a DIE/FEB

Operações da 1a DIE

Pesquisas da ECEME sobre a FEB 1962


Introdução - 0 Brasil em Guerra

Acreditamos, pela primeira vez apresenta-se um visão sintética estratégica global e integrada da participação do Exército, da Marinha (de Guerra e Mercante) e da Aeronáutica na Segunda Guerra Mundial, nas batalhas do Atlântico e no Teatro de Operações do Mediterrâneo.

O Brasil participou do esforço de guerra aliado a partir de 22 de agosto de 1942, quando entrou na guerra depois de reconhecer o estado de beligerância contra ele de parte do Eixo e, até 8 de maio de 1945 - Dia da Vitória. A sua extensão geográfica (a Quinta do mundo), sua posição Geopolítica debruçada sobre o Atlântico e a solidariedade ao Continente Americano não lhe permitiram ficar neutro.

Assim participou, do esforço de guerra aliado nos teatros de operações do Atlântico e do Mediterrâneo, em decorrência do Acordo Bilateral Brasil -EUA, de 23 de maio de 1942, que foi coordenado pela Comissão Mista de Defesa.


As Forças Armadas e a Marinha Mercante na Guerra

As Forças Armadas Brasileiras assim participaram:

O Exército defendeu o território brasileiro e as instalações militares nele existentes com ênfase na Zona de Guerra então criada e, dentro desta, o Saliente Nordestino (RN, PB, PE, AL) e nele o triângulo Natal - Recife - Arquipélago de Fernando de Noronha, além do envio da Força Expedicionário Brasileira - FEB ao TO do Mediterrâneo, integrando o V Exército dos EUA.

A Marinha encarregou-se da defesa dos portos, patrulhamento oceânico e escolta de comboios marítimos, isoladamente, ou integrando a 4ª Esquadra Americana.

A Aeronáutica executou ações de patrulhamento oceânico e proteção de comboios, isoladamente, ou integrando a 4ª Esquadra Americana, além do envio de um grupo de caça (1º Grupo de Caça) que integrou a Força Aérea Aliada do Mediterrânea, e uma Esquadrilha de Ligação de Observação (1ª ELO), que combateu sobre controle operacional da FEB, também na Itália.

A cooperação do Brasil com os aliados inicialmente ficou restrita ao Continente Americano. Cessada a ameaça de uma ação do Eixo de invasão das Américas pelo Saliente Nordestino, resolução da Comissão Mista de Defesa Brasil - EUA de nº 16, de 21 de agosto de 1943, ampliou a ação militar do Brasil, o que se traduziu, na prática, no envio de tropas de terra e ar para o Teatro do Mediterrâneo e ação de nossa Marinha além de águas continentais americanas. Em contrapartida, o Brasil recebeu dos EUA, para o cumprimento de suas missões militares no Atlântico e no Mediterrâneo, o material bélico correspondente, pela lei de Empréstimos e Arrendamentos (lend-lease), saldada em 1954, além de instrução americana correspondente à guerra anti-submarino, proteção de comboios, caça aérea, defesa antiaérea e de costa de Artilharia e emprego de divisões de Infantaria.

O esforço militar inicial do Brasil foi para defender em ações conjuntas de suas forças de terra, mar e ar Saliente Nordestino, que, junto à costa do Senegal, na África, formava o estreito Natal - Dakar, através do qual os alemães, antes de serem derrotados no Norte da África, podiam tentar uma ação aeronaval, ou mesmo ações tipo comando no NE. O Saliente Nordestino, através da base aérea de Parnamirim - Natal, cedida aos americanos junto com a base aérea de Belém - PA, constituiu-se em acidente capital estratégico, integrando ponte aérea militar americana Natal - Dakar, que foi essencial para a conquista aliada do Norte da África e do Oriente Médio, e invasão da Europa.

A cooperação brasileira ao esforço aliado, a nível estratégico,caracterizou-se: pela defesa do Saliente Nordestino contra uma possível invasão das Américas pelo Eixo, através do estreito Dakar - Natal; pela captura, pela FEB, de duas divisões do Eixo com 20.753 homens; pelo fornecimento de materiais estratégicos (cera de carnaúba, cristal de rocha, balata e borracha), esta colhida pelos soldados da borracha que se embrenharam na Amazônia, e pela cessão das bases aéreas de Natal e Belém aos EUA, que apressaram a vitória aliada.

A base de Natal permitiu que milhares de aviões militares dos EUA dela saltassem, sem escalas, para a África e de lá para a Europa e Extremo Oriente. Ela se projetou, inclusive, na vitória inglesa de El Alamein. Sem ela teria sido muito difícil a ajuda americana aos ingleses. Daí decorreu a expressão - O trampolim da Vitória - dada ao Saliente Nordestino, onde se localizava em Natal a base aérea.

O Brasil perdeu nessa guerra 1.889 brasileiros por morte; foram afundados 34 de seus navios, dos quais 31 mercantes, e abatidos 22 de seus aviões, além de haver gasto com a guerra 21 milhões de cruzeiros em cálculos da época.

Durante a guerra, as Forças Armadas do Brasil se modernizaram doutrinariamente. A renovação de seu material bélico foi expressiva com apoio do lend - lease. Elas se equiparam com o que havia de mais moderno: caça-submarinos; aviões de caça, de bombardeio e anti-submarino; contratorpedeiros de escolta, radares e sonares ; detetores de minas; bombas de gasolina gelatinosa, etc.

A instrução atualizou-se com base nos padrões das Forças Armadas dos EUA e na experiência operacional adquirida por frações de nossas Forças Armadas que integraram a 4ª Esquadra Americana no Nordeste na Batalha do Atlântico ou que integraram a Força Aérea Aliada do Mediterrâneo e o V Exército dos EUA, na Campanha da Itália.

O Brasil, no rol de suas vitórias militares, inclui mais os combates de Monte Castelo, Castelnuovo, Montese e Coléchio - Fornovo, vitórias mais expressivas de sua FEB com o concurso da FAB, através de seu 1º Grupo de Caça e 1º ELO e da Marinha de Guerra que ajudou a escoltá-la para a Itália.

O desenvolvimento da Aeronáutica em função da Guerra teve grandes reflexos na acelerada modernização da Aviação Civil do Brasil. Não tem fundamento histórico a versão muito difundida, mas reiteradamente rebatida pelo construtor da Usina Siderúrgica de Volta Redonda, General Edmundo de Macedo Soares, de que ela foi o resultado de financiamento dos EUA com a condição de o Brasil entrar na guerra. Afirmação negativa feita por aquela autoridade na condição de historiador, nos Institutos Histórico e Geográfico Brasileiro e de Geografia e História Militar do Brasil. Hoje ele é patrono de cadeira na Academia de História Militar Terrestre do Brasil .

Além da destacada defesa das Américas feito pelo Brasil, ao defender o Saliente Nordestino de uma invasão do Eixo e na proteção do tráfego marítimo no Atlântico Sul (Oriental), com apoio, em suas bases navais e aéreas e forças aéreas e navais que integraram a Força Naval do Atlântico Sul (EUA) e 4ª Esquadra Americana, o Brasil foi o único país da América Latina a participar, fora do Continente Americano, do esforço de guerra aliado, com tropas expedicionárias, da cruzada bélica contra o Eixo, em defesa da Democracia e da Liberdade Mundial.

Após a Guerra, por deferência aliada, o Brasil manteve, de 1945-1950, na Alemanha ocupada, uma missão militar brasileira, na qual o Exército foi representado pelo Coronel Aurélio de Lyra Tavares, hoje patrono de cadeira na Academia de História Militar Terrestre do Brasil .

O Brasil já havia participado do esforço militar aliado na Primeira Guerra Mundial , através de sua Marinha, representada pela Divisão de Operações Navais (DNOG) ao comando do Alte. Pedro Frontin para operar no litoral da África, de Serra Leoa para o Norte, com oito navios de guerra, como parte de esquadra aliada ao comando do almirante inglês Heatcoart Grant e o Exército, representado por sua comissão de Estudos de Operações de Guerra de Aquisição de Material na França, constituída de 24 oficiais que combateram no Exército da França, dos quais 8 foram promovidos por ato de bravura.

Comissão chefiada pelo General Felipe Ache, ao qual também se subordinou a Missão Médica especial enviada pelo Brasil e composta de médicos do Exército, Marinha e civis, formados ou acadêmicos, à disposição do Comando Único dos Exércitos Aliados.

Um reduzido número de pilotos do Exército e da Marinha se adestraram respectivamente nas aviações militares da França e Inglaterra e nelas combateram, constituindo-se, após, em sementes das aviações do Exército e Marinha que, fundidas em 1941, deram origem à Força Aérea Brasileira. Estes pioneiros, com auxílio de Missão Naval Americana na Marinha e Missão Militar Francesa para o Exército e sua aviação militar, contribuíram entre as duas guerras para atualizar toda a Marinha e o Exército na doutrina que dominou até a 1ª Guerra.


 

A Comissão Mista de Defesa Brasil -EUA

O ataque japonês a Pearl Harbour; a campanha submarina contra a navegação americana; a guerra em curso na Europa, África e Ásia, levaram os EUA a encarar a possibilidade de um ataque do Eixo às Américas, visando atingir indiretamente o Canal do Panamá, estratégica e vital posição na defesa dos EUA.

O local mais provável para um desembarque do Eixo nas Américas seria o Saliente Nordestino do Brasil. Então, os EUA tomaram a seguinte decisão: Organizar uma defesa total em terra, no mar e no ar, o suficiente para repelir um ataque proveniente de qualquer parte do mundo. Dentro desse contexto, celebrou o Acordo Militar Brasil - EUA, em 23 de maio 1942, que teve a implementá-lo à Comissão Mista de Defesa Brasil - EUA, desdobrada em Washington e Rio de Janeiro.

Antes, o Brasil já havia sido visitado, de 25 de abril a 7 maio 1939, por Missão Militar Americana, chefiada pelo Chefe do Estado - Maior do Exército dos EUA, Gen George Marshall que, após visitar instalações das Forças Armadas do Brasil no Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais, Paraná e Rio Grande do Sul, levou de volta, como convidado, o chefe do Estado - Maior do Exército Brasileiro, General Pedro Aurélio de Góes Monteiro, que retornou ao Brasil, em 14 de junho de 1939, após visitar as instalações militares daquele país e lançar as bases de uma cooperação mais estreita, que se traduziu numa Missão Militar Americana para o Exército Brasileiro, a fim de preencher a lacuna da Missão Militar Francesa, que acabava de deixar o Brasil, em função da guerra que provocou a invasão da França.

Esta missão veio complementar o trabalho de Missão Americana que instruía a Artilharia de Costa do Brasil, sob a orientação do general Kimberly.

A delegação do Brasil à Comissão Mista de Defesa em Washington foi chefiada pelo General de Divisão, Estevão Leitão de Carvalho, que, como comandante do Teatro de Operações Nordestino, havia planejado a defesa do Saliente Nordestino, executada em ação conjunta pelas forças terrestres, áreas e navais, com responsabilidade pela defesa do TO. Integraram a delegação o Vice-Almirante Álvaro Rodrigues Vasconcelos e o Cel Aviador Vaco Alves Seco. A delegação da Comissão no Rio de Janeiro foi chefiada pelo Maj Gen J. Gareshe Ord, dos EUA.

A primeira reunião da comissão foi em Washington, em 25 de agosto 1942, Dia do Soldado no Brasil.

A resolução 11 da comissão estabeleceu em síntese: Responsabilidade do Exército Brasileiro pela defesa territorial do Brasil e dos estabelecimentos militares nele existentes; cooperação da Força do Atlântico Sul (depois 4ª Esquadra Americana) com forças aéreas e navais brasileiras, na proteção das áreas costeiras brasileiras e, destas, com aquela força, na proteção do tráfego marítimo em subsetor do Atlântico Sul, em rotas de comboios estabelecidos por ela.

Essa Comissão Mista de Defesa coordenou durante toda a guerra a participação do Brasil em aliança militar com os aliados. Sobre o assunto, o chefe da delegação brasileira Gen Estevão Leitão de Carvalho e também desatacado historiador brasileiro e patrono de Cadeira na Academia de História Militar Terrestre do Brasil, deixou a preciosa obra - A serviço do Brasil na II Guerra, (Rio de Janeiro : Ed. A Noite, 1950).

O Gen Leitão de Carvalho foi chefe brasileiro de escol, líder dos "jovens turcos, oficiais do Exército que tiraram cursos de 1910-12 na Alemanha e que, de retorno, fundaram a revista A Defesa Nacional. Era casado com a herdeira do escritor Machado de Assis, e comandou em 1941 as grandes manobras de Saican da 3º Região Militar no Rio Grande do Sul, que contaram com a presença do presidente Getúlio Vargas. Tratamos desse evento na História da 3a RM - República .Porto Alegre: 3a RM,1993.v.2

A participação de forças militares do Brasil, em lutas fora do Continente Americano, resultou na Resolução 16 da Comissão Mista de Defesa Brasil -EUA. Por ela, a FEB seria constituída de um Corpo de Exército com três divisões de Infantaria e uma divisão Blindada para lutar na África e Europa.

Para a FAB, era previsto participar de operações aéreas no Mediterrâneo com mais um grupo de bombardeiros médios, além do 1º Grupo de Caça e 1ª ELO.

A ação da Marinha foi estendida ao patrulhamento e proteção de comboios fora de águas americanas.

Desde junho de 1941, o Brasil iniciou a cooperação com os EUA, ao colocar os portos de Salvador e Recife à disposição da Força Tarefa 3 dos EUA ao comando do almirante Jonas H. Ingran, mais tarde o comandante da Força do Atlântico Sul e 4ª Esquadra Americana. A base de Natal, a partir de 16 de setembro de 1941, foi colocada à disposição de um esquadrão de Catalinas dos EUA.

Adidos militares navais americanos, a este tempo, espalharam-se pelos principais portos brasileiros, que foram objetivos de ataques em plano Adolf Hitler.

A Comissão Mista teve o peso de seus trabalhos em Washington. Ela colheu preciosa experiência, que não pode deixar de ser levada em conta em futuras cooperações militares do Brasil.

Foi de grande relevância o seu trabalho. À Comissão Mista, coube implementar o Acordo Militar Brasil -EUA, através da elaboração de planos minuciosos, além de estabelecer, entre os estados-maiores das delegações respectivas, acordos destinados à defesa mútua Brasil -EUA. Os planos deviam estabelecer a responsabilidade do Brasil e EUA nos teatros de operações que viessem a ser criados. À Comissão Mista, competia recomendar aos governos contratantes as alterações a introduzir nos planos aprovados.

Todo o relacionamento Brasil - EUA nos TO do Atlântico Sul e Mediterrâneo sofreu intensa discussão na Comissão Mista, cujo trabalho relevante somente veio à tona com a edição do citado e relevante "A Serviço do Brasil na 2ª Guerra Mundial", obra de um dos mais destacados soldados do Brasil no período 1912-1945, além de historiador militar do Exército; essa obra merece ser conhecida e refletida. Seu arquivo pessoal, levamo-lo para o Arquivo Histórico do Exército desde 1989, por intermédio do General Médico Alberto Martins

Os negócios do Brasil junto à Alemanha ocupada, de 1945-50, foram representados de fato pela Comissão Militar Brasileira junto ao Conselho Aliado de Controle da Alemanha (EUA, URSS, Inglaterra, França). Essa Comissão foi a única de um país latino-americano creditada junto ao referido conselho, e realizou trabalhos que competiriam a uma embaixada.

O Saliente Nordestino (Brasil) foi e é expressão muito usada a nível estratégico. Abrange os estados do Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco e Alagoas. Possuiu grande projeção estratégica durante a guerra, seja no domínio aliado do Atlântico Sul (Ocidental), abaixo do paralelo 10 Norte, seja nas ligações aéreas dos EUA com Dakar, na África, Oriente Médio, sul da Europa e mesmo na Ásia. Seria a porta de entrada de um ataque do Eixo às Américas, visando conquistá-las, ou mesmo de ações aeronavais tipo comandos contra importantes instalações estratégicas dos EUA, em Natal (base aérea de Parnamirim) e Recife, quartel-general e base logística da Força Naval do Atlântico e 4ª Esquadra Americana (aérea e naval) encarregada da segurança do tráfego marítimo aliado em subsetor do Atlântico Sul assim batizado: Trinidad - ponto (30º LatW-10º Long N) Ilha de Ascensão -ponto (26º Lat W - 40º Long S) - ponto litoral Argentina no paralelo 40º Long S.

No Saliente se incluem as ilhas de Fernando de Noronha e da Trindade, além do atol das Rocas, que poderiam servir de apoio a atividades aeronavais do Eixo, com vistas a operações contra ou no oceano contíguo ao Saliente.

Todo o esforço conjunto das forças brasileiras de terra, mar e ar, com jurisdição direta sobre o Saliente Nordestino, foi de defendê-lo bem como suas instalações militares e, dentro dele, o triângulo Natal - Recife - Fernando de Noronha; em Fernando de Noronha, pela possibilidade de, se conquistado pelo Eixo, servir de base de operações contra o Continente.

Este esforço defensivo foi intenso até a expulsão do Eixo da África e neutralização dos submarinos alemães que atuaram no subsetor do Atlântico, de cuja defesa participaram forças navais brasileiras : A Força Naval do Nordeste e as Aéreas da 2ª Zona Aérea ao comando do Brigadeiro Eduardo Gomes, com jurisdição sobre todo o NE e com suas principais bases aéreas em Fortaleza, Natal, Recife e Salvador.

Passou pelo Saliente Nordestino e, especialmente, pela base aérea de Natal (Parnamirim), bem como pela de Belém, o chamado Corredor da Vitória - ponte aérea militar dos EUA, ligando Flórida - Belém – Natal, que foi essencial para a conquista da África, Oriente Médio, Sul da Europa e apoio a operações no Extremo Oriente.

Dentro deste corredor da Vitória, a base aérea de Natal, no extremo do Saliente, passou à História como Trampolim da Vitória. Foi encarregada da defesa territorial do Saliente e de suas instalações militares a 7ª Região Militar ao comando do Gen Div João Baptista Mascarenhas de Moraes, que, mais tarde, comandaria a FEB na Itália.

O valor estratégico do Saliente Nordestino já havia sido utilizado pelos holandeses que dominaram Pernambuco, de 1631-1654, não pelo valor de seu açúcar, mas sim pela inexpugnável base militar terrestre e naval que se constituí para eles o Recife, fortaleza natural protegida por dois largos e profundos fossos - os rios Capibaribe e Beberibe. Dali, eles controlaram o estreito do Atlântico e interferiram no tráfego marítimo da Espanha, com suas colônias sul-americanas, além de bloquearem o socorro de parte da Espanha e, depois de 1640, de Portugal, ao Brasil.


Mobilização militar do Brasil

A Guerra encontrou o Brasil em condições de realizar a sua defesa Territorial, com apoio em sua extensão geográfica e as poucas possibilidades de um desembarque em massa do Eixo no seu território a partir da África. Mas o encontrou despreparado para realizar operações aéreas e navais relacionadas com a guerra anti-submarino e proteção de comboios em suas águas territoriais.

O Exército possuía um efetivo de 60 mil homens concentrados no Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro e São Paulo. Sua instrução, desde 1920, obedecia a padrões da Missão Militar Francesa. O armamento era a base do adquirido pela organização de 1908, liderada pelo Marechal Hermes da Fonseca. Constituía-se de fuzis Mauser 1908, metralhadoras Madsen e canhões Krupp 75. Predominava o transporte e a tração à base do cavalo e do muar. A Artilharia de Costa mais moderna era a dos fortes Floriano e Copacabana, anteriores à Primeira Guerra.

A Marinha possuía um efetivo de 14 mil homens. Dispunha de dois couraçados, dois cruzadores, sete contratorpedeiros, um submarino, três navios mineiros, em sua maioria velhos e desequipados e que integravam nossa Esquadra Brasileira criada em 1910. Seu arsenal do Rio de Janeiro possuía condições de construção de mais unidades navais, o que ocorreu no curso da guerra.

A Aeronáutica, recém-criada com apoio na fusão das aviações do Exército e da Marinha que deram origem à Força Aérea Brasileira -FAB, dispunha de aviões ultrapassados em relação às forças aéreas mais modernas, para a realização em toda a plenitude de operações de proteção ao tráfego marítimo, guerra anti-submarina, caça aérea e bombardeio, missões que lhe caberiam pelas Resoluções 11 e 16 da Comissão Mista de Defesa Brasil -EUA.

A Indústria bélica brasileira possuía capacidade limitada de atender às necessidades bélicas das Forças Armadas do Brasil. Foi impositivo apelar para a indústria dos EUA.

No período de tensões que antecedeu a guerra, o Brasil adquiriu três submarinos da Itália, alguns navios nos EUA e armamento na Alemanha.

Com a guerra, o Brasil equipou suas forças armadas com material bélico dos EUA, adquirido pela lei de Empréstimos e Arrendamentos daquele país - o lend-lease. Assim, conseguiu participar do esforço de guerra aliado nos TO do Atlântico e Mediterrâneo com equipamentos atualizados.

O Exército adquiriu equipamento: 1 e 1/2 divisões de Infantaria, uma divisão blindada, uma divisão motorizada, dois regimentos de Artilharia antiaérea, além de 150 canhões de Artilharia de Costa, dos quais 100 Vicheres Armostrong do tempo da Primeira Guerra, que foram adaptados com pneus para serem tracionados por tratores e duplicados seus alcances, em trabalho admirável do Arsenal de Guerra do Rio de Janeiro. Segundo testemunho do Gen Francisco de Paula e Azevedo Pondé, hoje patrono de cadeira na Academia de História Militar Terrestre do Brasil.

A Marinha adquiriu 16 caça - submarinos, oito contratorpedeiros, um navio transporte, além de adaptar suas unidades navais para operações de guerra anti-submarinos e proteção de tráfego marítimo.

Num trabalho admirável do Arsenal de Marinha do Rio, com a ajuda do Estaleiro Lage, construiu, até 1945, 5 contratorpedeiros, 12 corvetas e 2 caça-submarinos.

A FAB foi equipada com três grupos de reconhecimento e guerra anti-submarino dos tipos Ventura, Hudson e Catalina e um grupo de bombardeio médio B-25, um grupo de caça equipado com Thunderbolt P-47 e uma esquadrilha com 10 Piper Club L-4. Além disso, incorporou as modernas bases aéreas de Fortaleza, Natal, Recife, Salvador, Fernando de Noronha, que serviram para a defesa territorial, proteção do tráfego marítimo e combate a navios furadores de bloqueio naval, e possuíam os requisitos essenciais a uma aviação moderna e que foram construídas pelos EUA e por eles utilizadas dentro do Corredor da Vitória que contribuiu, repetimos, para suas vitórias na África e no Sul da Europa e mesmo operações na Ásia.

A mobilização no Exército elevou seu efetivo de 60 mil para 180 mil. Ela foi feita à base da convocação de reservistas, intensificação da formação de oficiais na Escola Militar e Centros e Núcleos de Formação de Oficiais da Reserva, intensificação da formação de sargentos em todas as unidades e de especialistas em todas as regiões militares.

A Marinha desenvolveu grande esforço de mobilização, cabendo destacar o Centro de Formação de Reservistas de Natal e a reciclagem do pessoal de terra e guarnições de navios ultrapassados.

A FAB convocou pilotos civis formados nos EUA, instruiu pilotos nos Centros de Preparação de Oficiais da Reserva de São Paulo, Rio de Janeiro e Porto Alegre, e ampliou o número de oficiais formados pela Escola de Aeronáutica dos Afonsos, além de reduzir a duração do seu curso.

A instrução iniciou-se com o envio aos EUA de oficiais brasileiros para se adaptarem em escolas e campos de instrução à nova doutrina em curso. Os EUA enviaram ao Brasil oficiais veteranos seus para ministrarem instrução.

A Aeronáutica, através de sua FAB, bem como a Marinha, através de sua Força Naval do Nordeste, beneficiaram-se da instrução teórica e prática ministrada pela Força Atlântico Sul e 4ª Esquadra Americana que integraram. Depois, criaram a Usbatu para instrução aérea e a Eitas e o Citas para instrução naval, todos especializados em guerra anti-submarino e proteção do tráfego marítimo ou de comboios.

O valor dos equipamentos adquiridos para as Forças Armadas do Brasil foi estimado em cerca de sete milhões de cruzeiros ao preço da época. Todo esse esforço resultou em expressivo progresso e atualização militar do Brasil.

Os heróicos e legendários Catalinas, adquiridos pelo Brasil, além de relevantes serviços prestados na guerra, como o Arará que afundou um submarino alemão, ainda prestaram excelentes e históricos trabalhos, por muitos anos, à integração e desenvolvimento da Amazônia. Eles merecem um monumento que perpetue a memória de seus assinalados serviços de guerra e sobretudo de paz. Ficaram conhecidos como patas-chocas na gíria dos pilotos brasileiros.


O Exército Brasileiro

Durante a guerra, era Ministro da Guerra o Gen Div Eurico Gaspar Dutra, Presidente do Brasil logo depois da guerra, e o Chefe do Estado-Maior do Exército, o Gen Div Pedro Aurélio de Góes Monteiro.

Já em 1939, depois da visita do Gen George Marshall ao Brasil, a Missão Militar Francesa do Exército foi substituída por Missão Militar Americana, para que o Exército se atualizasse a fim de ficar em condições de lutar com a doutrina militar e material bélico dos EUA, pois lhe faltavam os meios de operacionalidade para o tipo de guerra em curso na Europa.

Mesmo antes de reconhecido o estado de beligerância do Eixo contra o Brasil, o Exército preparou-se para a missão de defesa territorial do Brasil, com ênfase na defesa do Saliente Nordestino, via de acesso lógica para uma tentativa do Eixo de invasão das Américas, a partir do Senegal, na África.

O efetivo do Exército no NE foi elevado de seis mil para 50 mil homens. A mobilização e o aprestamento do Exército para a defesa do Saliente Nordestino e das suas instalações militares foi feita pelo Gen Div João Baptista Mascarenhas de Moraes, como comandante da 7ª Região Militar sediada no Recife. Com a expulsão dos alemães e italianos do norte da África, em novembro de 1942, cessaram os longos dias de espera e vigílias, acerca da possibilidade de uma ação do Eixo no Saliente.

Foi decidido, então, o envio de uma Força Expedicionária Brasileira, cabendo o seu comando ao mencionado Gen Mascarenhas de Moraes,que, em dezembro de 1943, depois de escolhido o Comandante da FEB, à frente do Grupo de Observadores Militares, integrado por oficiais brasileiros que haviam estagiado no Exército e Força Aérea dos EUA, visitou, no norte da África e Itália, as prováveis frentes de combate onde seria empregada a FEB e o Grupo de Caça da FAB.

A FEB, prevista no valor de um Corpo de Exército com duas divisões de infantaria e uma blindada, cujo comando caberia possivelmente ao Gen Div Eurico Gaspar Dutra, conforme era o seu desejo, resumiu-se numa Divisão de infantaria - a 1ª Divisão de Infantaria Brasileira - 1ª, DIE, por dificuldade de os EUA fornecerem material, empenhados na invasão do Europa pela Normandia. A FEB foi reforçada com um depósito de recompletamento.

Sua estrutura foi fixada pela Portaria do ministro da Guerra 47/44, de 9 de agosto de 1943. Ela combateu em 239 dias de ação, 6 de novembro de 1944 a 2 de maio de 1945, na Itália, integrando o V Exército dos EUA.

Lutou contra ou em aliança com frações expressivas dos melhores exércitos do mundo presentes na Europa, fazendo boa figura e coroando, assim, o grande esforço de profissionalização do Exército, traduzido pela Reforma Militar 1898-1945, provocada pela Guerra de Canudos.

Da experiência operacional colhida pela FEB, muito se beneficiou o Exército para atualizar-se na Doutrina Militar do Exército dos EUA.

Passou esta instituição por uma autêntica revolução cultural, particularmente quanto à sua motorização e motomecanização, substituindo o cavalo e o muar.

Coube ao Exército, no campo estratégico, defender a "ilha" brasileira Norte - Nordeste, vital para os EUA na defesa do Canal do Panamá e, particularmente, o Estuário do Amazonas (abastecimento de borracha) e do Saliente Nordestino, bem como a proteção das bases aéreas de Belém e Natal, vitais para a vitória da ofensiva aliada de 1943, na África e no Oriente Médio.


A DefesaTerritorial do Brasil

Pela resolução 11 da Comissão Mista Brasil -EUA, a defesa do território brasileiro e das instalações militares nele existentes ficou a cargo do Exército.

Decorrido um mês e três dias da entrada do Brasil na Guerra, o Dec 10490-A, de 25 de setembro de 1942, criou a Zona de Guerra Brasileira. Ela abrangeu todo o litoral do Brasil, o vale do rio São Francisco e as águas oceânicas contíguas ao Brasil, no limite de uma faixa de segurança estabelecida pela Declaração do Panamá e mais a nossa fronteira no Rio Grande do Sul. O restante foi considerado Zona do Interior.

A Zona de Guerra foi dividida pelos Teatros de Operações (TO): Amazônico, Nordeste, Centro Meridional, Meridional, Mato Grosso e Marítimo, que foram na prática nominais, em função da remota possibilidade de um ataque do Eixo, à exceção do TO Nordeste que organizou um plano sob a orientação de seu comandante, Gen Div Estevão Leitão de Carvalho, antes de seguir para os EUA para assumir a chefia da Comissão Mista de Defesa Brasil-EUA.

O plano respondia às seguintes possibilidades do Eixo: Prática de atos de guerra por forças aeronavais do Eixo contra comunicações marítimas de interesse do Brasil( o que veio a concretizar-se); ações de envergadura contra o Nordeste (Saliente Nordestino) por forças do Eixo, após dominarem a África Oriental e o Atlântico Sul. Em função delas, a defesa do Nordeste e, por via de conseqüência, do Brasil e das Américas, devia concentrar-se no triângulo Natal - Recife - Fernando de Noronha.

Para fazer face às possibilidades levantadas de ações do Eixo, o Plano de Defesa do TO Nordeste estabeleceu como missões: impedir o Eixo de estabelecer bases aeronavais no Nordeste; vigiar a costa para assinalar forças do Eixo em tentativas de desembarque e ações corsárias; manter a todo custo as bases aeronavais de Natal e Recife; impedir o Eixo de estabelecer-se em Fernando de Noronha e, manter forte massa de manobra em Campina Grande, capaz de socorrer Natal e Recife.

Para o cumprimento dessas missões, o TO Nordeste foi dividido entre a 10ª Região Militar (MA, PI, CE) e a 7ª Região Militar sobre o Saliente Nordestino (RN, PB, PE., AL e Fernando de Noronha). Esta, ao comando sucessivo dos generais João Baptista Mascarenhas de Moraes e Newton Andrade Cavalcanti e, dispondo da 7ª Divisão de Infantaria articulada nos Estados de Pernambuco e Alagoas, da 14ª Divisão de Infantaria articulada nos Estados da Paraíba e Rio Grande do Norte e, mais, o Destacamento Misto de Fernando de Noronha, composto de tropas de Infantaria, Artilharia (de Costa e Antiaérea), Comunicações e Engenharia ( fração do 4º BE Cmb de Itajubá - MG).

Em caso de invasão e impossibilidade de repelir ou destruir o inimigo, as duas divisões de Infantaria deveriam retardá-lo: A 7ª ao longo dos eixos (Recife - Caruaru - Rio Branco) e (Maceió - União - Garanhuns) e até a linha de resistência (Garanhuns - Glicério - Palmares - Vitória - Limoeiro). A 14ª devia retardá-lo nos eixos (Natal - Santa Cruz) e (João Pessoa -Sapê - Campina Grande) até a linha (Itambé - Cahê - Mamaguape -Vila Nova - Bom Jesus), devendo participar da resistência na linha (Itabaiana -Nova Cruz - Serra Caiada).

A 14ª, ao comando do Gen Bda Gustavo Cordeiro de Farias, que emprestou seu nome ao EGGCF, atual Gráfica do Exército, tinha por missão, caso o inimigo desbordasse Natal, vindo entre Touros e Areia, manter Lages a todo custo.

Em caso de desembarque e vantagem inicial do Eixo, cada núcleo vencido deveria retrair e juntar-se a outro núcleo e, assim por diante, à semelhança do que já havia sido feito ao tempo das invasões holandesas.

Ao Destacamento Misto de Fernando de Noronha competia: impedir qualquer desembarque inimigo, principalmente face à Baía de Santo Antônio; precaver-se contra bombardeios aéreos e navais, e impedir a todo o custo que Fernando de Noronha fosse usada como base aeronaval do Eixo, para operações contra o Continente.

O restante das tropas do Exército do TO Nordeste recebeu missões de vigiar o litoral e defender os portos e bases militares em Fortaleza, Luiz Correia, São Luiz, Aracaju, Salvador, Itaparica, Ilhéus, Canavieiras, Santa Cruz, Porto Seguro, Caravelas, Conceição da Barra, Vitória e Marataízes .

As maiores concentrações de tropa ocorreram em ordem de valor: Recife, Natal, Fernando de Noronha, Fortaleza, Campina Grande (Reserva da 7ª Região Militar), Salvador, Caravelas, Vitória e Aracaju. O resto da tropa foi distribuído por todo o litoral do Nordeste, numa linha tênue e descontínua.

Várias unidades do Exército foram deslocadas em missões de guerra, do interior para a vigilância do litoral, onde passaram longos e intermináveis dias padecendo saudades da família e solidão.

Nos restantes TO criados, houve problemas menores no tocante a operações que se concentraram na proteção de portos, bases militares e vigilância do litoral, daí, no final da guerra, haver sido editada lei que passou a ser conhecida como Lei da Praia, que trouxe vantagem de mais uma promoção na reserva aos que durante a guerra estavam na Zona de Guerra Brasileira.

O Rio São Francisco mais um vez comprovou ser o rio da unidade nacional, por assegurar a ligação entre o Nordeste e o Rio de Janeiro, no trecho Juazeiro -BA à Pirapora -MG, a salvo da ação de submarinos, razão por que foi incluído na Zona de Guerra.

O dispositivo de defesa do TO Nordeste foi desenvolvido e aperfeiçoado até meados de 1943, quando ficou reduzida a ação do Eixo no norte da África e com inexpressiva ação de submarinos no nosso litoral, a partir de agosto de 1943.

Milhares de militares do Exército cumpriram, por quase um ano, na solidão e desconforto das praias do imenso litoral brasileiro, a missão de guerra que lhes foi imposta. Felizmente, a guerra não atingiu o território do Brasil!.

O Sistema de TO não funcionou. Os comandantes do Exército, Marinha e Aeronáutica resolveram, de forma conjunta e harmônica, os problemas surgidos.

O Dec. 4.098, de 6 de fevereiro, criou, aproveitando o clima emocional do ataque japonês de Pearl Harbour, o Serviço de Defesa Passiva e Antiaérea, a ser coordenado por uma Diretoria Nacional. Ela promoveu alguns exercícios de alerta e black-out, mas não mereceu a compreensão popular, que não sentia ameaça iminente, e, como não possuía recursos e leis coercitivas, tornou-se até alvo de desprestígio, em função de campanha movida contra ela. É um problema a ser levado a sério no futuro, particularmente na era dos mísseis intercontinentais.


Força Expedicionária Brasileira (FEB)

 

Participou da Campanha da Itália no Teatro do Mediterrâneo, de 6 de julho de 1944 a 2 de maio de 1945, integrando o V Exército dos EUA, ao comando do Gen Mark Clark e subordinado ao seu IV Corpo de Exército, ao comando do Gen Willis Crittenberger.

Lado a lado com o V Exército, lutava o VIII Exército inglês, comandado pelo Marechal Montgomery, que depois foi substituído pelo Gen Lease.

O comandante supremo do Teatro do Mediterrâneo foi o Marechal Sir Alexander. Foi neste contexto de chefes veteranos famosos que a FEB combateu com um efetivo de 25.334 brasileiros, ao comando do Gen Div João Baptista Mascarenhas de Moraes, que também acumulou o comando da Força operacional da FEB, a 1ª Divisão de Infantaria Expedicionária (1ª DIE).

A FEB foi idealizada no encontro de Natal, em 28 de janeiro de 1943, dos presidente Getúlio Vargas (do Brasil) e Franklin Delano Roosevelt (dos EUA), no retorno deste de Casablanca. Ela decorreu da resolução 16 da Comissão Mista de Defesa Brasil-EUA e foi criada pela Portaria MG nº 47/44, de agosto de 1943.

Integraram a FEB os seguintes generais-de-brigada: Zenóbio da Costa, comandante da Infantaria Divisionária (ID) e subcomandante da FEB; Osvaldo Cordeiro de Farias, comandante da Artilharia Divisionária (AD) e Olympio Falconiere da Cunha, como comandante dos elementos da FEB não integrantes da 1ª DIE que incluía um Depósito de Pessoal de cerca de 5.000 brasileiros, destinados ao recompletamento imediato de elementos da 1ª DIE feridos ou mortos em ação.

A FEB seguiu para a Itália em cinco escalões, em navios de transportes dos EUA e escoltada inclusive por navios da Marinha de Guerra do Brasil.

O maior feito da FEB, de repercussão estratégica, foi a captura, em função da manobra de Collechio – Fornovo, de 2 divisões do Eixo, num total de 20.573 prisioneiros, dos quais dois generais.

A FEB esteve em contato durante suas operações com as seguintes grandes unidades alemãs: 42ª e 114ª Divisões Jaeger; 94ª, 148ª, 232ª e 334ª divisões de Infantaria, 29ª e 90ª divisões Panzer Granadier, e com o Corpo de Pára-quedistas Blindado Herman Goering, além das divisões italianas Monte Rosa, São Marcos e Itália, ou equivalente a 13 divisões. Suas vitórias mais expressivas foram os combates de Monte Castelo, Castelnuovo, Montese e Collechio-Fornovo. Perdeu em ação 443 brasileiros do Exército, dos quais 13 oficiais e 430 praças.

Caíram prisioneiros 35 homens, o que contrasta com os 20.573 do Eixo que capturou.

Além dos citados, integraram a FEB a Inspetoria Geral, Seção de História, Serviço de Saúde, Banco do Brasil, Pagadoria Fixa, Seção Brasileira de Base (Depósito de Intendência e Serviço Postal), Conselho Superior de Justiça, etc.

O Estado-Maior da FEB foi o mesmo da 1ª DIE e assim constituído: Chefe, Cel Floriano de Lima Brayner; 1ª Seção - Pessoal, Ten Cel Thales Moutinho da Costa; 2ª Seção - Informações, Ten Cel Amaury Kruel; 4ª Seção Logística; Maj Aguinaldo Senna Campos, mais tarde historiador militar de Logística, e a 3ª Seção Operações, o Ten Cel Humberto Castelo Branco, oficial de escol, com curso de Estado--Maior nos EUA, futuro líder da Contra-Revolução Democrática de 1964 e seu primeiro Presidente da República, além de pensador militar fecundo.

Traduz exata e sinteticamente o que foi a contribuição da FEB ao esforço aliado o seu Comandante General Mascarenhas de Morais, natural de São Gabriel/RS, ex-comandante da Escola Militar do Realengo e que acabara de comandar a defesa territorial do Saliente Nordestino Brasileiro, como comandante da 7ª Região Militar. Chefe que viria a ser promovido a marechal vitalício pelo Congresso Brasileiro, além de consagrar-se historiador militar, ao escrever dois livros focalizando a atuação da FEB. Disse ele sobre a Vitória, ao anunciá-la:

"A Força Expedicionária , que representou o Brasil nesta sanguinolenta guerra, cumpriu galhardamente a missão que lhe foi confiada, mercê de Deus e a despeito de condições e circunstâncias adversas: Num terreno montanhoso, a cujos píncaros o homem chega com dificuldades; num inverno rigoroso que a totalidade da tropa veio enfrentar pela primeira vez e contra um inimigo audacioso, combativo e muito bem instruído.Podemos dizer assim mesmo, e por isso mesmo, que os nossos bravos soldados não desmereceram a confiança que neles depositavam os seus chefes e a própria Nação Brasileira.

Após oito meses de combates constantes, em que, como todos os exércitos, sofremos pesados revezes e obtivemos brilhantes vitórias, o balanço de uns e outros é ainda favorável às nossas armas. Desde o dia 16 de setembro de 1944, a FEB percorreu, conquistando ao inimigo, às vezes palmo a palmo, cerca de 400 Km, de Lucca e Alessandria, pelos vales dos rios Sércchio, Reno e Panaro e pela planície do Pó. Libertou quase meia centena de vilas e cidades; sofreu mais de 2.000 baixas, entre mortos, feridos e desaparecidos; fez o considerável número de mais de 20.000 prisioneiros, vencendo pelas armas e impondo a rendição incondicional a duas divisões inimigas. É um registro deveras honroso e de vulto para uma Divisão de Infantaria. Um dia se reconhecerá que o seu esforço foi superior às suas possibilidades materiais, porém plenamente consentâneo com a noção de dever e amor à responsabilidade, revelados pelos nossos homens em todos os degraus e escalões de hierarquia, e em todas as crises e circunstâncias da Campanha que neste instante acabamos de encerrar.

Regressamos com feridos ainda sangrando dos últimos encontros, mas nunca, pela nossa atuação, o prestígio e nome do Brasil periclitaram ou foram comprometidos. É bem verdade, e vale a pena afirmar, que preço bem alto pagamos por esse resultado.

O sangue dos nossos bravos camaradas tingiu de vermelho essas belas verde - escuras montanhas dos Apeninos, e algumas centenas dos nossos companheiros já não retornarão à Pátria conosco, porque dormem o sono eterno, sob as terras úmidas e verdejantes das planícies da Toscana.

Não foram muitos os meses que aqui passamos: Muitos foram, entretanto, os triunfos que incorporamos ao rico patrimônio e às nossas tradições militares. Camaiore, Monte Prano, Bargano no vale de Serchio, Monte Castelo, La Serra, Castelnuovo , no vale do rio Reno; Montese, Zocca, Marano , Panaro no vale do rio Panaro; Collechio e Fornovo do Taro - na rica planície do rio Pó.

Esses nomes se inscreverão, por certo, dentre aqueles que recebem o culto de gerações patrícias, porque na Itália, como nos campos de batalha sul-americanas, o Exército Brasileiro mostrou-se digno do seu passado e à altura do conceito que os seus chefes e soldados de outrora firmavam com a espada e selaram com sangue dos seus legítimos e sempre venerados heróis. "

 

Ao término da guerra, o general Mark Clark, Comandante do V Exército dos EUA e atualmente general honorário brasileiro e homenageado no nome do Estádio da Academia Militar das Agulhas Negras em Resende - RJ, enviou a seguinte mensagem ao comandante da FEB:

"Mostrou-se essa Força, sob seu comando (do general Mascarenhas de Moraes), ser capaz de enfrentar problemas novos, treinar e disciplinar-se para o combate no qual desempenhou parte relevante.

A FEB refletiu as altas qualidades da Nação Brasileira, que enviou seus melhores filhos, para lutar em solo estrangeiro, longe da pátria, pela implantação dos princípios de justiça e de liberdade."

O General Willis D. Crittenberger, comandante do IV Corpo de Exército dos EUA, ao qual a FEB integrava, assim se manifestou ao comandante da FEB:

"Os feitos da Força Expedicionária Brasileira, sob o vosso comando, durante a campanha do IV Corpo na Itália, terão um lugar proeminente quando for escrita a história da Segunda Guerra Mundial."

A dissolução da FEB ocorreu em função do aviso 217-185, de 6 de julho de 1945, do Ministro da Guerra.

A participação da FEB na campanha da Itália ao lado dos aliados, particularmente ingleses e americanos, em defesa da Democracia e da Liberdade Mundial, aproximou ainda mais estes povos. A FEB foi composta de brasileiros de todos os cantos do Brasil, conforme diz a Canção do Expedicionário:

"Você sabe de onde eu venho? Venho do morro do Engenho. Das selvas dos cafezais. Venho das praias sedosas, das montanhas alterosas, do pampa, do seringal, das margens crespas dos rios, dos verdes mares bravios, da casa branca da serra, do luar do meu sertão, da terra da Senhora Aparecida e do Senhor do Bonfim."

Enfim do Brasil inteiro!


Divisão de Infantaria Divisionária 1ª (1ª Die)

 

Foi a parcela combatente da FEB e também comandada por Mascarenhas de Moraes. Foi integrada por:

Infantaria Divisionária (ID), ao comando do Gen Zenóbio da Costa, composta pelos regimentos de Infantaria - 1º RI (Regimento Sampaio - Rio de Janeiro), ao comando do Cel Aguinaldo Caiado de Castro, 6º RI (Regimento Ipiranga - Caçapava-SP), ao comando do Cel João Segadas Viana, futuro ministro da Guerra 1961-62, 11º RI (Regimento Tiradentes - São João del Rei), ao comando do Cel Delmiro Pereira de Andrade. Comandou ao final da guerra o 6º RI o Cel Nelson de Melo, futuro ministro da Guerra em 1962. O 1º RI teve ação destacada na conquista de Monte Castelo, em 21 de fevereiro de 1945, além de em outras ações. O 6º RI teve papel destacado na conquista de Castelnuovo e rendição em Fornovo, em 29 de abril de 1945, da 148º Divisão de Infantaria Alemã e de remanescentes da divisão italiana, Itália. O 11º RI teve atuação destacada no combate de Montese, em 14 de março de 1945, além de em outras ações.

Pela Artilharia Divisionária (AD), ao comando do Gen Osvaldo Cordeiro de Farias e composta dos grupos de Artilharia I-GO-105 (Grupo de São Cristóvão – Rio), ao comando do Ten Cel Levy Cardoso, II-GO-105 (Grupo Monte Bastione, de Campinho – Rio), ao comando do Cel Geraldo Dacamino, sendo o primeiro a entrar em ação na Itália, III-GO-105 (Grupo Bandeirante de Quintaúna, em São Paulo – SP), ao comando de Ten Cel José de Souza Carvalho, IV- GO-155 (Grupo Montese), ao comando do Ten- Cel Hugo Panasco Alvim, 1ª Esquadrilha de Ligação e Observação (1º ELO da FAB), sob controle operacional da FEB; 9º Batalhão de Engenharia de Combate, de Aquidauana-MS), ao comando do Ten Cel José Machado Lopes; 1º Batalhão de Saúde de Valença – RJ), ao comando do Maj Bonifácio Borba; Esquadrão do Reconhecimento, atual Esquadrão Ten Amaro de Valença – RJ), ao comando inicialmente do Cap Franco Ferreira e depois do Cap Plínio Pitaluga atual ( em 2.000) acadêmico emérito da Academia de História Militar Terrestre do Brasil . Tropa especial (Companhia de Transmissões, Companhia de Manutenção Leve, Companhia de Intendência, Companhia do Quartel General, Banda de Música e Pelotão de Polícia organizado à base da mobilização de policiais da Guarda Civil de São Paulo.

A 1ª DIE foi organizada à base de uma Divisão de Infantaria do Exército dos EUA,ou seja, com 14.254 homens (734 oficiais e 13.520 pracinhas, expressão que passou a denominar os expedicionários brasileiros e que até hoje perdura) e equipada com 66 obuses (54 de 105mm e 12 de 155mm),144 morteiros (90 de 60mm e 54 de 80mm), 500 metralhadoras (87 submetralhadoras 4,5, 175, . 30 e 237, .50), 11.741 fuzis (5.231 carabinas e 6.510 fuzis todos .30), 1.156 pistolas cal 45, 2.387 armas anticarro (13 canhões de 37mm e 57 de 57mm, além de 585 lança - rojões 2.36 e 1.632 lança - granadas) e 72 dectores de minas anticarro e máscaras contra gases para todo o efetivo.

Possuía 14.358 viaturas motorizadas, das quais 13 carros blindados M8 e cinco de meia - lagarta. Isso permitia à 1ª DIE transportar de uma só vez um terço de seu efetivo, o que ocorreu na perseguição no rio Panaro.

Os 47 botes de assalto e passadeiras permitiam à divisão realizar pequenas transposições de cursos d'água. Seus 736 telefones, 42 telégrafos, 592 estações de rádio e 10 aviões Piper Cub de ligação, proporcionavam-lhe ampla capacidade de observação e ligação. Com essa organização, a 1ª DIE tinha possibilidade de atacar numa frente de até 6 Km e defender uma frente de cinco a 10 Km, depois de adaptação em montanha que ocorreria na região dos Apeninos. O adestramento da 1ª DIE iniciou no Brasil com apoio de 115 regulamentos americanos (210.874 exemplares) traduzidos e coordenados pelo Estado - Maior da FEB do interior, que funcionou na Casa de Deodoro e que prestou grande concurso à mobilização complexa da FEB sob a chefia do Gen Anor Teixeira dos Santos. Concorreram para esse adestramento vários oficiais com estágio no Exército dos EUA.

Assim, em 25 de maio de 1944, aniversário da Batalha de Tuiuti, a 1ª DIE desfilou em moldes americanos, ou seja, motorizada, pelas ruas do Rio de Janeiro.

Na Itália, tão logo recebida pelo Gen Mark Clark, comandante do V Exército dos EUA, ele determinou pessoalmente o adestramento da divisão em operações de montanha, pois ela teria de enfrentar os Apeninos e no inverno, com gelo, paisagem desconhecida e sequer imaginada pelos pracinhas brasileiros, acostumados aos trópicos.

A mobilização da 1ª DIE foi tarefa complexa e hercúlea, que passou pela convocação de civis, policiais de São Paulo, reservistas de tiros-de-guerra, operários da fábrica de fechaduras para serem transformados em armeiros, enfermeiras, médicos aproveitados como oficiais de outras especialidades, e expressivo número de oficiais de nossos CPOR e NPOR.

Houve muita criatividade e adaptabilidade do homem brasileiro às atividades baseadas particularmente na motorização e nas comunicações de rádio, que exigiram muitos especialistas. Enfim, foi tornado possível o que era necessário.

De retorno, a 1ª DIE foi semeada por todo o Exército, contribuiu significativamente, pela transmissão de sua gloriosa experiência operacional, para a modernização de todo o Exército, quer seja nas escolas, quer seja na tropa.

A atuação da FEB na Itália, partindo do Rio de Janeiro, se constituiu na segunda expedição militar extracontinetal do Brasil, pois em 1648, expedição naval e terrestre, partida do Rio de Janeiro e nucleada pelo atual regimento Sampaio, havia libertado Angola do longo domínio holandês (13 anos). Do armamento, a 1ª DIE já travara conhecimento no Brasil com os obuses 105 e 355. Na Itáli, familiarizou-se com os fuzis Garand automático M1 e Springfield de repetição, submetralhadoras Thompson M1A1 e carabinas, além das metralhadoras Browning média e pesada e canhões anticarro.

Na Itália, depois do primeiro ataque brasileiro a Monte Castelo, em 29 de novembro de 1944, ficou evidenciado que o adestramento da 1ª DIE havia sido insuficiente e que no Brasil e na Itália não havia completado o ciclo padrão que era reservado às divisões americanas.

Durante o inverno, o treinamento foi completado e os combatentes puderam minorar as agruras da guerra, através de visitas à retaguarda, em Roma e Florença, proporcionadas pelo Serviço Especial da FEB.

A DIE refletia na sua composição a predominância dos seguintes contingentes fornecidos pelos estados: Rio de Janeiro (8.036h); São Paulo (3.889); Minas Gerais (2.947); Rio Grande do Sul (1.880)... Portanto, os cariocas e fluminenses representaram juntos cerca de 32% da FEB.


Operações da 1ª DIE/FEB

 

Essa divisão brasileira foi uma das 20 divisões e 16 brigadas aliadas compostas de canadenses, sul - africanos, indianos, neozelandeses, marroquinos, argelinos, além de franceses, italianos, poloneses livres e, particularmente, ingleses e americanos que integraram, no final da Batalha dos Apeninos, o IV Grupo de Exércitos aliados destinado a libertar a Itália do jugo nazi - fascista, bem como a fixar importantes efetivos alemães dos XIV Exército e Exército da Ligúria, para impedir que atuassem nas frentes da Operação Overlod (invasão aliada da Normandia, em 16 junho de 1944) e da Operação Anvil e depois Dragoon (invasão aliada pelo sul da França, em 15 de agosto 1944). Para a última, foram rocadas algumas divisões francesas, cuja falta na Batalha dos Apeninos a 1ª DIE/FEB veio de certa forma minorar.

Os brasileiros entraram em combate em 18 de setembro de 1944 na proporção de um terço de seus efetivos e com o nome de Destacamento FEB, antes que houvesse completado o ciclo de instrução normal previsto pela doutrina americana.

Eles atuaram na região da boca do cano da bota que a Itália representa. O destacamento foi lançado ao norte do rio Serchio para combater os alemães estabelecidos na Linha Gótica (280 Km), entre os mares Tirreno e Adriático.

A 1ª DIE/FEB teve seu batismo de fogo através de seu Destacamento em 18 de setembro na conquista de Camaiore, seguida de Monte Agudo e Monte Prano, em 26 de setembro. O destacamento foi rocado mais para a direita no vale do Serchio onde conquistou Fornaci e Barga.

Em 11 de outubro, lançou-se sobre Galicano que conquistou e consolidou. Daí lançou-se, em 30 de outubro, sobre Castelnuovo de Garfagna onde foi repelido e retraiu sobre Galicano, tendo conhecido o seu primeiro insucesso, fato comum em tropas estreantes.

Mas progrediu em 15 dias 40 Km, capturou uma fábrica de peças de aviões, em Fornaci, fez 208 prisioneiros do rio Reno, onde recebeu uma frente de 15 Km, muito ampla, sobre a estrada 62, ao norte de Porreta Terme e que era dominada pelo Monte Castelo que impedia o prosseguimento do V Exército sobre Bologna.

Monte Castelo, defendido com unhas e dentes pelo inimigo, foi alvo de cinco ataques. O primeiro e o segundo ataques foram executados em 24 e 25 de novembro pela Força Tarefa 45 (Task Force 45) integrada por brasileiros e americanos. Os ataques não foram bem sucedidos, mas resultaram na conquista temporária de monte Belvedere.

O terceiro ataque foi feito pela 1ª DIE/FEB; um dia após, contra-ataque alemão que reconquistou Belvedere dos americanos, fato negativo no ataque brasileiro que foi flanqueado por Belvedere, ponto onde o inimigo concentrou o esforço de defesa por ser a chave de acesso à rica planície do rio Pó. Ataque realizado com chuva, lama e céu encoberto, do que resultou mais um insucesso brasileiro.

À noite, em conferência no Passo de Futa - QG do IV Corpo, seu comandante precipitou-se e colocou em dúvida a capacidade de combate dos brasileiros e quis saber a razão do insucesso. A resposta do comandante brasileiro foi dada por escrito. Ele argumentou:

"Que tropas veteranas americanas também foram obrigadas a recuar de Monte Belvedere naquela frente, face à forte resistência inimiga; que a missão atribuída à 1ª DIE/FEB de defender numa frente de 20 Km e de atacar numa frente de 2 Km era exorbitante para uma divisão de Infantaria e que ela não havia, por culpa do governo no Brasil e do V Exército na Itália, tido o período de treinamento padrão mínimo previsto para as divisões americanas e que ela estava recebendo missão de tropa de montanha sem sê-lo".

Passo de Futa foi o ponto de inflexão de alguns insucessos iniciais de uma tropa bisonha para as vitórias de uma tropa veterana e bem comandada e assessorada por um Estado - Maior competente. O inverno, iniciado logo após, obrigou a uma estabilização da frente por 70 longos dias.

Então, os brasileiros vindos de um país tropical, padeceram rude e rigoroso inverno, com temperaturas variando de -15º a -4º e, sobretudo, tenso, face às responsabilidades de enfrentar veteranos alemães acostumados àquelas condições de tempo e terreno e em posição.

A 1ª DIE/FEB ressurgiu do inverno, o mais rigoroso dos últimos 50 anos, aguerrida, disposta e veterana. Suas ações estrategicamente até o fim se incluem na Batalha dos Apeninos, que foi muito cruenta e penosa. Os Apeninos foram acidente capital estratégico para o inimigo, por impedir o acesso dos aliados à rica planície do rio Pó. E após conquistados os Apeninos, seria a vez dos Alpes, o que significaria a decisão da guerra na Itália.

A chave para a conquista dos Apeninos era a cidade de Bologna. O acesso a esta era a Estrada Nacional 64 que era dominada pelas elevações de Monte Belvedere, Monte Castelo Castelnuovo, etc.

Foi nestas elevações que os alemães de 232ª Divisão de Infantaria, ao comando do experimentado Gen Barão von Eccart von Gablenz, que comandara o XXVI Corpo de Exército alemão na Batalha de Stalingrado, concentraram seu esforço defensivo, particularmente em Monte Belvedere, pivô de defesa inimiga nos Apeninos e que possuía dominância de fogos e vistas sobre Monte Castelo.

É importante este entendimento de que as dificuldades de conquista de Monte Castelo encontravam-se bem mais no seu flanqueamento por Belvedere, onde o inimigo concentrou seu esforço defensivo, do que nele próprio, e que para conquistar Monte Belvedere os americanos usariam uma unidade especializada, a 10ª Divisão de Montanha.

Terminado o inverno, o próximo passo da 1ª DIE/FEB foi cooperar com o Corpo de Exército na conquista de saliente dos Apeninos em sua zona de ação, cortado pelo rio Marano, que integrava a Linha Defensiva Gengis-Kan e dominava A ESTRADA 64 (Porreta Terme-Bologna), essencial ao abastecimento de 10 divisões do V Exército.

Para a conquista do saliente no maciço onde se situavam as posições alemãs de Belvedere, Monte Castelo, Soprassaso, Castelnuovo, Gorgolesco, Mazzancana, Della Torracia, La Serra, Santa Maria Viliana, Torre de Nerone, Montese e Montelo, foi elaborado o Plano Encore a ser executado pela 10ª Divisão de Montanha americana e 1ª DIE/FEB.

O plano visava expulsar o inimigo do Vale do Reno e após perseguí-lo no vale do rio Panaro.

Os brasileiros deviam sucessivamente: capturar Monte Castelo com auxílio da 10ª de Montanha que devia capturar Belvedere e Della Torracia; limpar o inimigo do vale do Marano; apossar-se de Santa Maria Viliana e capturar Torre de Nerone e Castelnuovo. O último, chave para liberar as comunicações do V Exército nos vales dos rios Silla e Reno.

Em 20 de fevereiro, a 10ª de Montanha conquistou Gorgolesco e Mazancana. O último, com auxílio de pilotos brasileiros do 1º Grupo de Caça( o Senta a pua!). Em 21 de fevereiro, a 10ª de Montanha e a 1ª DIE/FEB atacaram simultaneamente Della Torracia e Monte Castelo, objetivos que conquistaram sucessivamente.

O primeiro foi Monte Castelo, pelos brasileiros. A conquista brasileira de Monte Castelo foi o episódio mais emocionante e afirmativo da capacidade de combate do brasileiro e de sua maturidade operacional.

Em 23 e 24 de fevereiro, os brasileiros travaram o encarniçado combate de La Serra. Em 5 de março, caiu pela manobra contra Castelnuovo, o falado, traiçoeiro e famigerado saliente na rocha - Soprassasso, o responsável pelas maiores perdas da FEB no inverno. Ele era o objetivo dos nossos pracinhas que o conquistaram com grande gana. Depois dele, veio a conquista pela 1ª DIE/FEB de Castelnuovo, base para a montagem de um ataque do V Exército sobre Bologna.

A seguir, teve curso a Ofensiva da Primavera, de 14 abril-2 de maio, para libertar o norte da Itália e desfechada pelo XV Grupo de Exército Aliado. À 1ª DIE/FEB coube inicialmente conquistar, em 14 de abril, as alturas de Montese, Cota 888 e Montelo, com forte apoio de Artilharia e Blindados e geradores de fumaça americanos.

A reação da Artilharia alemã ali concentrada antes de ser destruída, para não cair em poder dos aliados, foi de grande e inusitada intensidade. Foi um duríssimo e disputado combate, o que é atestado pelas 426 baixas brasileiras (34 mortos, 382 feridos e 10 extraviados).

Em Montese, a 1ª DIE/FEB ajudou a romper a defensiva alemã nos Apeninos e conquistou a chave de acesso ao vale do rio Panaro o que facilitou ao V Exército derramar-se sobre a planície do rio Pó, em Aproveitamento do êxito e logo a seguir em Perseguição..

Sobre a conquista de Montese, referiu o comando do IV Corpo aliado:

"Ontem só os brasileiros mereceram as minhas irrestritas congratulações. Com o brilho de seu feito e seu espírito ofensivo, a 1ª DIE/FEB está em condições de ensinar às outras divisões como se conquista uma cidade".

A conquista de Montese ajudou a desmantelar a Linha Gengis - Can. A 1ª DIE/FEB, em aproveitamento do êxito, conquistou o vale do médio Panaro em 19 de abril e, Zocca, no rodoviário que ofereceu forte resistência em 20, Marano e Vignola em 23, onde foram recebidos os brasileiros aos brados de "Vivam nossos libertadores!" (Liberatori)!

A partir daí, teve início a Perseguição. Em solução singular, mas de grandes dividendos táticos, a 1ª DIE/FEB iniciou a Perseguição com a Infantaria embarcada em veículos de sua Artilharia Divisionária e protegendo o flanco direito do V Exército. Em 24 de abril, ela alcançou S. Paulo d' Enza. De 27-30, no vale do rio Taro, combateu com o inimigo em Collechio e em Fornovo di Taro, após o que executou manobra envolvente contra os alemães reunidos em Respício, onde eles receberam ultimatum para rendição incondicional aos brasileiros.

O inimigo rendeu-se em Gaiano na região de Fornovo di Taro. Rendição que se caracterizou como ação de nível e repercussão estratégica. Rendição recebida do experimentado Gen Otto Fritter Pico, veterano de diversos teatros de operações e comandante da Divisão Bersaglieiri, Itália, e, ainda, de sobras da 90ª Divisão Panzer.

Foram capturados 20.573 homens, dos quais 894 oficiais, e entre eles muitos veteranos do África Korps, além de copioso material bélico.

Sobre este feito dos brasileiros, comentou o Gen Mark Clark, agora no comando do XV Grupo de Exércitos:

"Foi um magnífico final de uma atuação magnífica ! "

 

De 28-30 de abril, enquanto tinha curso a rendição alemã, Benito Mussolini foi morto em 28.Em 29, os russos entraram em Berlim. Em 30, Adolf Hitler se suicidou. A 1ª DIE/FEB ocupou Alexandria em 30. Em 1ª maio, ocupou Casale, Solero, Salvarote e Costeleto, dia em que o Alte. Doenitz assumiu o poder na Alemanha. Em 2, ocupou Turim, terra natal do Ten Gen Carlos Napion, patrono do Serviço de Material Bélico do Exército Brasileiro, e estabeleceu ligação com a 27ª Divisão Francesa em Susa.

Nesse dia, houve rendição incondicional das tropas alemãs na Itália.

Dia 8 de maio - Dia da Vitória Aliada na Segunda Guerra Mundial. A 1ª DIE/FEB foi a primeira tropa aliada a estabelecer contato com a operação Dragoon, em Susa.

De 8 de maio - 3 de junho, a 1ª DIE/FEB atuou como tropa de ocupação das regiões de Piacenza e Alexandria.Depois, concentrou-se em Francolise, para retornar ao Brasil, o que se verificou em 14 de junho na cidade do Rio de Janeiro, onde foi recebida vitoriosa e triunfalmente pelo Brasil, e passou sob um arco do triunfo encimado pela legenda:

"A cidade às Forças Armadas Brasileiras".

A atuação da 1ª DIE/FEB na Itália foi dividida em quatro fases pelo seu oficial de operações, Ten Cel Humberto de Alencar Castelo Branco:

I- Campanha do Destacamento FEB no vale do rio Arno; 2- Campanha da margem oriental do rio Reno; 3- Ofensiva sobre as defesas dos Apeninos; e, 4- Rompimento da frente e Perseguição.

A 1ª DIE/FEB integrou o IV Corpo com mais três divisões americanas: a 10ª de Montanha; a 1ª Blindada (Os tigres) e 34ª de Infantaria (os cabeças -de - boi).

Atesta também o valor do soldado brasileiro cruz encontrada após o combate de Castelnouvo e com esta inscrição expressiva em alemão:

"Aqui jaz um herói brasileiro".


Pesquisas da ECEME sobre a FEB em 1962

 

Em 1962, o terceiro ano da Escola de Comando e Estado - Maior do Exército produziu a valiosa pesquisa "O Comportamento do combatente brasileiro na Itália", com vistas dela tirar valiosos ensinamentos de Engenharia Humana. Combatente que se fez representar na FEB por cerca de 74%, de cariocas e fluminenses(32%), paulistas(15,5%), mineiros(11,7%), gaúchos (7,5%) e paranaenses (6,1).

A pesquisa histórico-crítica, baseada em ampla bibliografia então disponível e depoimentos de veteranos, chegou a interessantes e relevantes considerações ou conclusões, que não podem ser desconhecidas do planejador, pensador e chefe militar do Exército Brasileiro.

Por exemplo: A pesquisa conclui que na FEB "o combatente brasileiro não se adaptou e mesmo reagiu a normas disciplinares rígidas," confirmação de pesquisas anteriores sobre o mesmo tema na História Militar do Brasil. E, mais, "que ele se submete a liderança afetiva dos chefes que o comandam pelo exemplo, e não aos ausentes espiritualmente e insensíveis às esperanças, aspirações, imaginação e sentimentos de seus homens. "

Como fatores concorrentes para o bom desempenho do combatente brasileiro na Itália e que contribuíram para ele sentir-se valorizado socialmente, alinhe-se:

  1. Lutar no V Exército dos EUA, que dispensava grande atenção e valor à vida e ao bem-estar dos seus soldados e onde o prêmio e o castigo eram distribuídos com isenção e sem favores, além de que com presteza e oportunidade;
  2. Lutar em território com uma população histórica e tradicional, mas então vencida, dominada, submissa, torturada pela fome, desemprego e corrupção e com emotividade semelhante à brasileira;
  3. Sentir-se alvo de orgulho no Brasil, de estímulos de sua Mídia, de atenções das madrinhas de guerra, de desvelo familiar e dos brasileiros e atenções dos superiores;
  4. Ser alvo agora de interesse geral, boa assistência médica, alimentação jamais sonhada, dinheiro farto, roupa variada e farta e assistência religiosa;
  5. Lutar e ser bem sucedido contra o considerado melhor soldado do mundo; e
  6. Desenvolvimento de fortes laços de camaradagem, na adversidade da guerra, com reflexos no moral elevado, disciplina consciente e sentimento de honra e de dever. Influíram no combatente na Itália:

Em resumo:

Sentimento de autodefesa, expressiva rusticidade biopsíquica; limitada confiança; nítida tendência de subordinação por afetividade; temor reverencial ao desconhecido; agradável surpresa pela forma como foi assistido e administrado; submissão ao considerado insuperável.

O Tenente General Dwight Eisenhower (IKE) em 7 ago 1946 ,em visita a Escola Militar de Resende (e AMAN desde 1951 ) e que fora o comandante Supremo das Forças Aliadas na Europa ,incluindo a FEB ,assim se referiu aos oficiais e cadetes da Escola em formatura em sua homenagem :

 

"Desta Escola Militar de Resende ,tão bem aparelhada so poderá sair produto ótimo ,capaz de prosseguir na luta pelos grandes ideiais ( De Liberdade e Democracia ) pelos quais o Brasil foi à guerra , e onde oficiais egressos da Escola Militar do Realengo foram padrões vivos de glória de competência e de heroismo ,deixando assim gravada a gratidão eterna no coração dos americanos do Norte ."

Completou dando um hurrah ! Ao Brasil e ao seu Exército .

Ao que o Corpo de Cadetes a ordem de Fora de forma! Bradaram em unissono e em alto e bom som : "IKE !!!