MUNICÍPIO DE CANGUÇU-RS: FORMAÇÃO HISTÓRICA

Cláudio Moreira Bento

Sumário

1- Canguçu localização e significação indígena do nome

2- Canguçu o 22o município gaúcho a ser criado e distrito de Piratini

na Revolução Farroupilha

3- Os primeiros funcionários de Canguçu em 1857

4- Exploradores e povoadores das terras de Canguçu

5- As terras de Canguçu atual nas invasões de 1763 e 1773/744

6- Em Canguçu bases de guerrilhas de Rafael Pinto Bandeira contra os espanhóis

7- Patrício Corrêa Câmara e seus Dragões percorrem Canguçu em 1776

8- As terras de Canguçu em 1784 , em mapa de Demarcação de limites

9- A sede da Real Feitoria do Linhocânhamo, origem de Canguçu Velho

10- A origem da cidade de Canguçu, povoado transferido de Canguçu Velho

11- Raízes históricas da Economia de Canguçu

(Linhocânhamo , pecuária, caminho de tropas para as charqueadas e trigo)

12- Visita do Bispo do Rio de Janeiro a Canguçu freguesia em 1815

13- Expansão atual da fronteira agrícola em Canguçu com descendentes de alemães

14- Razões militares da fundação de Canguçu em 1800

15- O Corpo de Cavalaria da Guarda Nacional de Canguçu na Guerra do Paraguai

16- Canguçu na Guerra Civil 1893-95 e na Revolução de 1923

17- O primeiro historiador de Canguçu J. Simões Lopes Neto em 1912 e as fontes de História de Canguçu de hoje.

 

Canguçu localização e significação indígena do nome

Canguçu está incrustado na Serra dos Tapes a qual forma junto com a Serra Herval a região fisiográfica gaúcha Serras do Sudeste. Serras divididas pelo rio Camaquã que limita ao norte o município e que se constituem dos solos mais antigos do Estado, como parte do Escudo Rio-Grandense de formação no Período Arqueano.

A denominação de Canguçu deriva da palavra indígena Caa-guaçu, significando mata grande ou mato grosso, de igual forma que já foi denominada primitivamente a região onde se situa a célebre Avenida Paulista em São Paulo, bem como outros locais, segundo se conclui ou lê-se em descrições mais antigas.

Caa- guaçu era uma alusão a milenar mata grande que encobriu primitivamente a encosta da Serra dos Tapes voltada para a Lagoa dos Patos e que daria o nome a ilha de Canguçu, mais tarde chamada de ilha da Feitoria como parte da estância Feitoria depois de adquirida por esta.

Os primitivos habitantes de Canguçu foram os índios Tapes, tapuias, guaranizados e subordinados aos guaranis e que deram seu nome a região onde Canguçu se assenta. Vestígios deles ainda são encontrados nos traços de habitantes do Posto Branco, Canguçu Velho e Herval.

 

Canguçu o 22 o município gaúcho a ser criado e distrito de Piratini

na Revolução Farroupilha

 

Canguçu foi o 22º município gaúcho a ser criado, por desmembramento do de Piratini do qual " foi o distrito de1831-57 e o de " mais perigo e mais farrapo durante a Revolução Farroupilha ", segundo Francisco Pedro de Abreu ou Moringue.

Então Canguçu teve grande participação e projeção. Pois as tropas que integraram a Brigada Liberal de Antônio Neto que o apoiaram em 10 set 1836 na vitorioso combate do Seival e no outro dia na proclamação da República Rio-Grandense, era constituída por canguçuenses na proporção de cerca de ¼.

Ao ser instalada a República Rio-Grandense em Piratini, em 6 novembro de 183,6 quem carregou o pavilhão tricolor pela primeira vez foi o canguçuense Major de Lanceiros Joaquim Teixeira Nunes – o Coronel Gavião, considerado pelo General Tasso Fragoso como a maior lança farrapa e que 7se tornou célebre no comando do Corpo de Lanceiros Negros Farroupilhas. Personagem abordado com grandeza e simpatia na minisérie A Casa das sete mulheres pelo ator Douglas Simon ao que fornecemos a seu pedido diversos subsídios sobre este grande guerreiro farrapo.

Canguçu foi palco de dois combates denominados de Canguçu, respectivamente em 25/26 de outubro e 6 de novembro de 1843 e nos locais Pedra das Mentiras e Cerro do Ataque, nos fundos do atual Colégio N. S. Aparecida em ambas as margens do arroio. E ambos combates vitórias imperiais de Chico Pedro.

Foi em Canguçu que o maior cronista farrapo – Manoel Alves da Silva Caldeira, veterano farrapo, escreveu cartas-depoimentos aos historiadores Alfredo Varela Alfredo, Ferreira Rodrigues, Alcides Lima e a Piratinino de Almeida que lhes permitiram resgatar expressivamente a memória do Decênio Heróico.

A vila de Canguçu em momentos difíceis da Revolução abrigou por diversas vezes Bento Gonçalves da Silva até agosto de 1843,conforme se concluiu de ofício do Barão de Caxias ao Ministro da Guerra.

Isto até que Canguçu fosse ocupado pela Ala Esquerda do Exército ao Comando de Caxias, de setembro de 1843 em diante. Comandou a referida Ala Esquerda o célebre guerrilheiro farrapo, Francisco Pedro Buarque de Abreu , o futuro Barão de Jacuí, cuja vida e obra resgatamos pioneiramente em Porto Alegre Memória dos sítios Farrapos e da administração do Barão de Caxias.Brasilia:EGGCF,1989.

Canguçu foi criado município junto com Passo Fundo e por sugestão do simbolista farrapo Major Bernardo Pires, autor do desenho da Bandeira da República Rio - Grandense, e desde 1891, adotada como a do Rio Grande do Sul, conforme estudamos em Autoria dos símbolos do Rio Grande do Sul subsídios para a sua revisão histórica tradicionalista e legal.Recife:UFRPE,1971.

 

Os primeiros funcionários de Canguçu em 1857

 

Os primeiros funcionários públicos de Canguçu em 1857 foram José Ignácio Moreira, Vicente Ferrer de Almeida e Antônio Joaquim Bento. Os dois primeiros , ex funcionários dos ministérios farrapos e respectivamente da Justiça e da Câmara Municipal de canguçu e trisavós dos ex-prefeitos Gilberto Moreira Mussi e Odilon Almeida Mesko que deram grande impulso à cultura local e representaram o município na Assembléia do Estado. E Antônio Joaquim Bento professor régio de meninos e pai do ex intendente de Canguçu de 1905/17 Cel GN Genes Gentil Bento e avô do ex prefeito Conrado Ernani Bento 1932/35,1935/37 e 1952/56 e trisavô do vereador Conrado Ernani Bento Neto.

 

Exploradores e povoadores das terras de Canguçu

 

Da fundação portuguesa do Rio Grande do Sul em 1737, com o desembarque do Brigadeiro Silva Pais na cidade do Rio Grande atual, e até a criação do município de Canguçu o seu povoamento por Portugal, teve início após a conquista dos Sete Povos das Missões pelos exércitos de Portugal e Espanha, em 1756, ao final da Guerra Guaranítica.

Após eliminada a reação indígena as terras de Canguçu passaram a ser trilhadas por grupos militares, nas ligações das bases militares portuguesas em Rio Grande, estabelecida em 1737, e a de Rio Pardo em 1752.

Onde se ergue a cidade Canguçu, desde então passou a ser ponto obrigatório de passagem para quem procedente do norte do rio Camaquã demandasse a então Vila do Rio Grande. Isso por ser o local um nó orográfico onde possuem nascentes os cursos d’ água que deságuam nos rios Piratini e Camaquã e Lagoa dos Patos.

 

As terras de Canguçu atual nas invasões de 1763 e 1773/744

 

Com a invasão do Rio Grande em 1763, pelos espanhóis ao comando do Gen. D. Pedro Ceballos, governador de Buenos Aires e conseqüente domínio espanhol da Vila de Rio Grande por cerca de 13 anos (1763-1776), as terras de Canguçu, cujo povoamento já havia sido iniciado no vale do rio Piratini, passaram a servir de bases de guerrilhas portuguesas contra os espanhóis dominando o Forte de Santa Tecla que estabeleceram próximo de Bagé atual em 1774..

Guerrilhas ao comando do legendário Major Rafael Pinto Bandeira, foram enviadas para Canguçu atual, desde o Rio Pardo, para espionar e ferretear os espanhóis em Rio Grande, pela retaguarda, no corte do Canal São Gonçalo.

Em 1773-74, a frustada invasão do Rio Grande pelo Governador de Buenos Aires, o mexicano D. Vertiz y Salcedo, após derrotado em Santa Bárbara e Tabatingai e detido face Rio Pardo – A Tranqueira Invicta, foi obrigado a retirar-se, sob forte pressão guerrilheira de Rafael Pinto Bandeira , para a base militar espanhola mais próxima, que era Rio Grande.

Nesta ocasião ele atravessou com seu Exército(Armada) as terras do atual município de Canguçu, após difícil travessia do passo do Camaquã, desde então conhecido por Armada, em alusão a Real Armada de Espanha, designação na época de exército, e que por ali passou, quando deveria ter feito em melhores condições pelo passo do Camaquã de Baixo e atual Vao dos Prestes.

Um dos objetivos do mexicano D. Vertiz era eliminar as bases de guerrilhas portuguesas nas Serras do Sudeste.

 

Em Canguçu bases de guerrilhas de Rafael Pinto Bandeira contra os espanhóis

 

Na Serra dos Tapes, ao sul do rio Camaquã, na Encruzilhada do Duro, atual Coxilha do Fogo, foram estabelecidas guerrilhas capitaneadas por Rafael Pinto Bandeira e local para onde convergiam para o Sul os caminhos que atravessavam os passos do rio Camaquã.

Na Serra do Herval foram estabelecidas as guerrilhas capitaneadas por Francisco Pinto Bandeira, pai de Rafael e após pelo paulista Cipriano Cardoso e baseadas na Guardas da Encruzilhada, atual cidade de Encruzilhada do Sul, e que ali preveniam ataques sobre o Rio Pardo partidos de Rio Grande, através de Canguçu atual e do rio Camaquã. Ou pelo Sul, a partir de Montevidéu.

Estas guerrilhas incursionavam fundo nos territórios sob controle de Espanha, os atuais Uruguai, províncias de Corrientes e Entre Rios, Sete Povos das Missões e distrito de Entre-Rios ( entre os rios Uruguai, Ibicuí, Santa Maria e Quaraí ).

Incursões em operações militares denominadas arreadas que botavam abaixo instalações pecuárias espanholas naqueles territórios e ao mesmo tempo retiravam dos possíveis caminhos de invasão ao Rio Grande, o gado cavalar e vacum que encontravam.

Mapa da época assinala a região da atual cidade de Canguçu como depósito de bovinos, cavalares e muares arreados por Rafael Pinto Bandeira e seus homens e que ali também vigiavam os movimentos dos espanhóis na vila de Rio Grande a partir de 1763, tendo pouco antes o atual território de Canguçu atravessado pelos Dragões do Rio Grande em Rio Pardo, que dali foram transferidos ao comando do Cel . Thomaz Luiz Osório para erigirem e defenderem a Fortaleza de Santa Teresa, no atual Uruguai, e que na ocasião foi conquistada pelos espanhóis.

Érico Veríssimo em sua trilogia O Tempo e o Vento focaliza com base histórica as aventuras de Rafael Pinto Bandeira, mas não o local da mesma em grande parte feitas em Canguçu, ou partir dele, e inclusive a partir de 1774 na vigilância ali, da Fortaleza de Santa Tecla, então erigida pelos espanhóis e somente arrasada cerca de 2 anos após pelos majores Rafael Pinto Bandeira que estudamos em Comando Militar do Sul –quatro décadas de História 1953-1895 ( Porto Alegre: Ed.Palotti,1996) e Patrício Corrêa da Câmara, conforme o abordamos em detalhes em nosso livro 3a Brigada de Cavalaria Mecanizada Brigada Patrício Corrêa da Câmara.(Porto Alegre: Ed. Pallotti,2002).

 

Patrício Corrêa Câmara e seus Dragões percorrem Canguçu em 1776

 

A Patrício Corrêa da Câmara se deve a primeira descrição do caminho que percorreu em Canguçu atual, e que reproduzimos no livro citado da 3a Brigada de Cavalaria Mecanizada quando deslocou-se da conquistada fortaleza de Santa Tecla , junto com seus Dragões do Rio Grande em Rio Pardo, para ocupar posição no Taim que poderia ser atacada pelo agora Vice Rei do Prata, General D. Pedro Ceballos após este haver invadido e dominado a Ilha de Santa Catarina em 1777 para a seguir, depois de impedido de reconquistar Rio Grande por sua frota haver sido dispersada por uma tempestade,conquistar em definitivo a Colônia do Sacramento e de lá expulsar os portugueses doa quais muitos deslocados vieram se estabelecer em terras de Canguçu atual.

Rafael Pinto Bandeira e seus guerrilheiros foram os primeiros a reconhecer e a explorar Canguçu e durante a Guerra de 1763-76, quando ele teria estado à morte no local da atual cidade de Canguçu, onde coordenava a ação de seus guerrilheiros nos vales dos rios Piratini e Camaquã.

Ao final da guerra, depois de expulsos os espanhóis de São Martinho, Santa Tecla e Vila de Rio Grande, as terras de Canguçu se reabriram ao povoamento português que fora interrompido com a invasão espanhola em 1763.

Os povoadores iniciais de Canguçu foram guerrilheiros das tropas de Rafael Pinto Bandeira , bem como deslocados portugueses de Colônia do Sacramento que passou definitivamente ao domínio de Espanha, após quase um século de acirrada disputa diplomática e militar com Portugal e açorianos e descendentes mandados vir em migração oficial para povoarem os Sete Povos das Missões e que com a guerra permaneceram nas regiões litorâneas de Mostardas, Estreito, São José do Norte e em Povo Novo e no vale do Jacuí.

 

As terras de Canguçu em 1784 , em mapa de Demarcação de limites

 

A Comissão de Demarcação de Limites do Tratado de Santo Ildefonso de 1777,pelo qual Canguçu foi fronteira de fato entre Portugal e Espanha por cerca de 24 anos, de 1777-1801, percorreu até 1884 as vertentes do rio Piratini e as encontrou bastante povoadas e, no espaço em branco hoje ocupado por Canguçu registrou em mapa o Cerro Partido, acidente geográfico característico de Canguçu que mergulha nas nascentes do arroio Pantanoso, no local conhecido como Banho do João Paulo( Duarte).

Localizou mais ao sul a estância de Luiz Marques de Souza, estabelecida antes da invasão de 1763 e que durante a dominação espanhola serviu de base de guerrilha contra os espanhóis em Rio Grande e cujas ruínas nós identificamos com auxílio da historiadora Marlene Barbosa Coelho em 1972, conforme publicamos sob o título Tropeada Cultural à Zona Sul, no Diário Popular de Pelotas de 12, 19 e 26 de março de 1972.

 

A sede da Real Feitoria do Linhocânhamo, origem de Canguçu Velho

 

De 1783-89 funcionou em Canguçu, com sede em sobrado de pedra em Canguçu -Velho, a Real Feitoria do Linhocãnhamo do Rincão do Canguçu. Suas terras se estendiam da Lagoa dos Patos pela encosta da Serra dos Tapes acima, até as nascentes do Arroio das Pedras ( atual Arroio Grande ) abrangendo o Rincão do Canguçu, situado entre este arroio e o de Correntes e sem abranger as terras hoje conhecidas como Ilha da Feitoria, conforme provamos com base em mapa da mesma feitoria existente na Seção de Manuscritos da Biblioteca Nacional e artigo na Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (v.340. jul/set 83) e mais tarde na plaqueta Real Feitoria do Linhocânhamo do Rincão da Canguçu 1883-89. Localização ( Canguçu:Prefeitura/ACANDHIS,1992).

Ele funcionou com escravos vindos da Fazenda Real de Santa Cruz no Rio de Janeiro e outros apreendidos num contrabando, cujos nomes publicamos em sua maioria em nosso livro O negro na sociedade do Rio Grande do Sul. Porto Alegre:IEL,1975.

Esta iniciativa que durou cerca de 6 anos deu bons frutos e foi a única bem sucedida no Brasil, tendo produzido linho, item estratégico essencial para a navegação marítima para o fabrico do velame e cabos das embarcações e de cujo fornecimento Portugal dependia da Inglaterra.

Por razões desconhecidas até hoje a Feitoria foi transferida para São Leopoldo atual, numa das interinidades no governo do Rio Grande do agora Brigadeiro Rafael Pinto Bandeira. Suas instalações em São Leopoldo em 1824, iriam abrigar os primeiros imigrantes alemães para o Rio Grande do Sul.

 

A origem da cidade de Canguçu, povoado transferido de Canguçu Velho

 

Em torno do abandonado local da Real Feitoria em Canguçu, haviam-se condensado alguns moradores que deram origem ao povoado Canguçu que passou a ser Canguçu - Velho depois de 11 anos, com a criação, em 180,0 da atual cidade de Canguçu, como capela curada em invocação a N. S. da Conceição de Canguçu.

Estudo de ruínas da Real Feitoria em Canguçu Velho levou um pesquisador a confundi-la com a primeira missão jesuítica no Rio Grande, equívoco que explicamos em artigos no Diário Popular de Pelotas sob o título – Canguçu primeira redução guaranítica? Para tal consultamos especialistas jesuítas no assunto no Seminário Cristo rei em São Leopoldo. O artigo é de 22 de novembro de 1970.O citado conferencista confundiu a região entre os rios Icamaquã e Piratini nas Missões ,junto ao rio Uruguai, com os rios Camaquã e Piratini afluentes das bacias das lagoas dos Patos e a Mirim. E tomou as ruínas da sede da Real Feitoria do Linhocânhamo como sendo a da 1a missão jesuítica que em realidade foi a de São Nicolau. E que trabalho nos deu para desenraizar esta falsidade da memória de Canguçu produzida por uma historiografia de amadores.

 

Raízes históricas da Economia de Canguçu

(Linhocânhamo , pecuária, caminho de tropas para as charqueadas e trigo)

A economia de Canguçu teve início com a iniciativa oficial da Real Feitoria, que além do linho desenvolveu a pecuária bovina para a extração de couros e graxa e a lavoura de subsistência que incluía estopa para a confecção de roupas aos escravos.

Abordamos fotos que retiramos das ruínas na Real Feitoria. do sobrado e do mangueirão de pedra quadrado em nossos livros O Negro e descendentes na Sociedade do Rio Grande do Sul 1635/1975.(Porto Alegre:IEL,1975.p.96/106) e em Canguçu reencontro com a História.(Porto Alegre:IEL,1983.p.25/29).

Com o estabelecimento das charqueadas em Pelotas, a população de Canguçu beneficiou-se da proximidade das mesmas para onde conduzia o gado que produzia ou, da exploração da infra-estrutura comercial de apoio aos carreteiros, viajantes e tropas de gado que por ali passavam demandando Pelotas e provenientes de diversas regiões do Rio Grande .

E entre o final da Guerra do Paraguai em 1870 e até a revolução de 93, tropas de gado provenientes das Missões e de Cima da Serra , aproveitando a ponte do rio Jacuí acima de Cachoeira do Sul que foi incendiada por forças do governo para impedir o acesso de federalistas ao norte do Jacuí.

Foi deste tempo o estabelecimento em Canguçu, abaixo do Colégio N.S Aparecida de uma afamada Indústria de carros e carruagens puxadas por cavalos que eram encomendas por tropeiros e que as levavam quando de volta das charqueadas de Pelotas para seus compradores. Eu recordo dos vestígios da mesma atras de casa de D.Semira Guerra bem como das casas de seus operários ferreiros e marcineiros etc situadas na frente dela o local onde a Prefeitura retirava terra para reparar as ruas .Local hoje defronte o Quartel da Brigada Militar.

Este foi o período áureo da economia de Canguçu . Data deste tempo a Mangueira Enterrada da Lacerda, feita de pedra. E era ela um equipamento esperado com ansiedade pelos tropeiros que ali encerravam o gado e tinham uma folga das repetidas noites de ronda, para prevenir em campo aberto estouros da boiada. É um monumento mudo daquela época.

E deste tempo de grande movimento de viajantes por Canguçu que surgiu a lenda da Pedra das Mentiras, na Coronilha .Este local era muito disputado para pousos, pela boa aguada e proteção dos ventos oferecidas pelas pedras.

Lenda colhida em 1912 por J. Simões Lopes Netto na Revista do Centenário de Pelotas nº 4 que reproduzimos na Revista dos 200 anos de Canguçu.Resende-RJ:ACANDHIS,2000.p.155/156 etc

 

Visita do Bispo do Rio de Janeiro a Canguçu freguesia em 1815

O trigo sempre foi muito cultivado em Canguçu. 0 5 o Bispo do Rio de Janeiro D. José Caetano da Silva Coutinho, passou em Canguçu nos dias 25,26 e 27 de novembro de 1815 . Entre outras coisas observou que a freguesia de Canguçu produzia 1000 a 2000 alqueires de trigo, o que a fazia uma das mais notáveis da Capitania neste particular e supunha que o próprio vigário padre Tourem fosse um grande plantador de trigo.

Na Revolução Farroupilha Canguçu forneceu considerável quantia de trigo para alimentar a Brigada Liberal do General Antônio Netto ocupando Pelotas depois de conquistá-la e aquartelada no Teatro 7 de Abril. Fato que seu sobrinho General revolucionário Zeca Netto repetiria por algumas horas na Revolução de 1923, com força constituída de vários canguçuenses como ele filho da canguçuense Rafaela Mattos, irmã do Ten Cel Honorário do Exército que comandou um Corpo de Cavalaria da Guarda Nacional de Canguçu na Guerra do Paraguai.

O Gen. Zeca Netto, que estudamos na Revista do Clube Militar sob o título: Gen Zeca Netto –traços do seu perfil militar ,jan/fev 1984,p.31/33, ouviu de seus ancestrais da família Matos da Armada, em Canguçu, que antes que aqueles campos fossem povoados de gado o foram plantados com trigo que era vendido no Passo Rico e depois Passo dos Negros no Canal São Gonçalo em Pelotas

A abertura dos Portos do Brasil, 1808, provocou a entrada no Rio Grande de trigo a melhores preços proveniente dos EUA, o que junto com a ferrugem determinou o quase abandono desta cultura para concentrar o esforço na criação de gado vacum para produzir o charque para alimentar as concentrações de escravos em Pernambuco, Bahia, Rio de Janeiro, e guarnições de navios etc.

Canguçu é considerado o município brasileiro com maior número de minifúndios e também como possuidor do maior Sindicato Rural.

 

Expansão atual da fronteira agrícola em Canguçu com descendentes de alemães

 

Sua fronteira agrícola em expansão foi liderada por descendentes alemães pomeranos que se irradiaram da Colônia de São Lourenço fundada em 15 de janeiro de 1857,por Jacob Rheingantz e 13 dias antes da criação dos municípios gêmeos de Canguçu e Passo Fundo, pela Lei Provincial n o 340 .

Canguçu por diversas vezes tem ocupado a posição de maior produtor de batata e milho do Rio Grande do Sul . Seria o único local onde se observa em seus cerros pedregosos a ocorrência do espinho de cruz, que em verdade deveria figurar em seu brasão e bandeira. Cerros pedregosos que inspirou o historiador gabrielense do passo do Ivo, Osório Santana Figueiredo a denominar Canguçu de "A magnífica dos cerros."

Entre a Guerra contra Oribe e Rosas (1852) e a Revolução de 93, foi que Canguçu recebeu imigrantes alemães e descendentes. Alemães vindos da Pomerânia, próximo a Polônia, com características de linguagem e costumes bem como nível cultural, bastante diferenciados dos colonos vindos para São Leopoldo em 1824.

Isolados, sua Cultura aos poucos se descaracterizou e estão a merecer um estudo urgente. Outro contingente foi o italiano que se fixou na Colônia Maciel.

Ambos os núcleos tiveram grande expansão vertical e têm muito contribuído para grandesa do município. Mas ambos estão à merecer um estudo mais apurado com apoio no que conseguimos colher e que consta do 2 o volume dos originais de Canguçu reencontro com a História, com exemplares na ACANDHIS, Biblioteca do Colégio N.S Aparecida, Casa de José Moreira Bento etc

 

Razões militares da fundação de Canguçu em 1800

 

Canguçu foi fundado em 30 de dezembro 1799 pelo governador do Continente, o Ten. Gen. Sebastião Xavier da Veiga Cabral que como coronel havia tido destacada atuação na reconquista da Vila de Rio Grande em 1º de abril 1776.

Governou o Rio Grande por cerca de 20 anos e comandou de seu leito de morte, em Rio Grande, a vitoriosa Guerra de 1801, da qual resultou a incorporação definitiva dos territórios das Missões, do Piratini ao Jaguarão e do divisor do Tratado de Santo Ildefonso até o rio Santa Maria.

Canguçu foi criado dentro de um contexto estratégico, com vistas a ali aprofundar o bloqueio em Piratini iciada a povoar como Vila dos Casais em 1789 do novo e projetado caminho de invasão ao Rio Grande, a partir do recém fundado Forte de Cerro Largo (atual Mello), via Herval, Pinheiro Machado, Piratini e Canguçu atuais por via seca. Caminho que de Canguçu poderia o invasor infletir, ou para o Rio Grande ou para Rio Pardo, as principais bases militares de Portugal do litoral e na campanha.

Os povoadores de Canguçu nesta guerra prestaram valioso concurso operacional e logístico. O comandante da expansão ocorrida entre os rios Piratini e Jaguarão, foi o Marechal de Campo Manoel Marques de Souza, o maior proprietário ao Sul de Canguçu atual, nas regiões de Cerro Pelado , Vila Freire no atual município de Cerrito que pertenceu a Canguçu por um século 1857/1957.

Grande proprietário em Canguçu foi o seu subcomandante o Cel. Jerônimo de Azambuja que foi o 1º inspetor da criada Capela de Canguçu e contribuiu com a maior quantia para a sua construção conforme abordamos na obra Os 200 anos da Igreja Matriz N. S. da Conceição de Canguçu. ( Resende-RJ:ACANDHIS,200)

Em nossas lutas externas de 1812, 1816-17, 1825-5-28 e 1851-52 na fronteira sobre o atual Uruguai, Canguçu concorreu com soldados mas foi poupado de envolvimento, dada a sua posição no interior e em serra.

 

O Corpo de Cavalaria da Guarda Nacional de Canguçu na Guerra do Paraguai

 

Na Guerra do Paraguai Canguçu enviou um Corpo de Cavalaria da Guarda Nacional ao comando do já citado Ten Cel. Teófilo de Souza Matos.

De retorno foi homenageado em cerimônia cívica no cerro, desde então da Liberdade, com a libertação de duas escravas menores, tendo interpretado o sentimento da comunidade o que fora o 1º professor régio do município Antônio Joaquim Bento, orador da Sociedade Libertadora local, no âmbito da Maçonaria.

O Cerro da Liberdade, monumento natural e belíssimo, em data recente foi arrasado para fornecer aterro para a Estrada da Produção Sul e Super Porto de Rio Grande.

Nas revoluções Canguçu teve envolvimento intenso na Farroupilha, conforme abordado, ao ponto de ser considerado por Chico Pedro ou Moringue, "como o distrito de mais perigo e mais farrapo."

 

Canguçu na Guerra Civil 1893-95 e na Revolução de 1923

 

Na Revolução de 93 não foi atingido direto pelas operações, mas a ele ligam-se, por laços de família, as suas maiores lideranças militares.

Gumersindo Saraiva era neto e filho de canguçuenses e foi batizado na Vila Freire e o General Honorário do Exército Hipólito Pinto Ribeiro era canguçuense

Hipólito foi o comandante governista da maior batalha da Revolução a de Inhanduí e o comandante superior da tropa que em Campo Osório frustou , com a morte do Almirante . Saldanha da Gama, a última esperança de restabelecimento do Império.

Canguçuenses integrantes da Cavalaria Civil ao serviço dos governos federal e estadual foram vítima de degola junto com o seu comandante Coronel Maneco Pedroso de Piratini , por parte de mercenários platinos a serviço de federalistas conforme abordamos em artigo: O massacre federalista de Rio Negro em Bagé em 28 nov 1893. Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro.v.154,n o 378,jan/mar1993,p.55/88 e na História da 3a Região Militar 1889-1953(Porto Alegre:Ed.Pallotti,1995

Conseguiram escapar deste triste e trágico fim o Cel Bernardino Mota por estar guarnecendo um posto em Candiota e o Ten Cel João Paulo Prestes que conseguiu escapar do cerco ,mas encontraria a morte no combate de Passo do Mendonça na Revolução de 1923 , na margem direita do rio Camaquã .

Na Revolução de 23 Canguçu foi cenário nas operações capitaneadas pelo General Zeca Netto que se defrontou com outro canguçuense ilustre o Coronel Juvêncio Lemos, no combate de Canguçu Velho de 14 de agosto de 1923, nas terras da antiga Real Feitoria do Linhocãnhamo.

Em Porto Alegre o canguçuense Cel. G. N. Genes Gentil Bento, como Notário do 3º Ofício, foi encarregado de organizar a Guarda Republicana para defender Porto Alegre dos revolucionários.

Na 2º Guerra Mundial Canguçu concorreu com o pesado tributo em vidas representado por 10 % dos mortos gaúchos da Força Expedicionária Brasileira – FEB os soldados Hortêncio Rosa e Izidro Matoso

No Cerro dos Borges, na cidade de Canguçu, de onde há mais de 200 anos Rafael Pinto Bandeira vigiava o inimigo, hoje abriga a estratégica instalação do Sindacta 2 ( Sistema Nacional de Defesa Aérea e de Controle do Tráfego Aéreo). Canguçu foi chamado pelo professor alemão Eduardo Wilhelmy de " jóia incrustada na Serra dos Tapes" e em data recente pelo historiador Osório Santana Figueiredo, de " A magnífica dos cerros", conforme já referido .

 

O primeiro historiador de Canguçu J. Simões Lopes Neto em 1912 e as

Fontes de História de Canguçu

 

O primeiro historiador de Canguçu foi em 1912, J. Simões Lopes Neto na Revista do Centenário de Pelotas n o 4 com apoio em elementos que lhe foram fornecidos pelo Intendente Genes Gentil Bento e Carlos Noberto Moreira, observadores e divulgadores da memória local oral.

Obra continuada por Conrado Ernani Bento, filho do primeiro e genro do segundo que legou-nos valiosa documentação que vinha preservando e que a usamos em nossa pesquisa de mais de 25 anos e que traduzimos na obra:

BENTO Claudio Moreira, Cel. Canguçu reencontro com a História. P. Alegre, IEL, 19836 ( com prefácio de Luiz Carlos Barbosa Lessa).

Esta obra indica a localização de exemplares da pesquisa original bem ampla de que o livro se constituiu um resumo devido o alto custo

Foi uma vida dedicada ao resgate da memória local a professora Marlene Barbosa Coelho, hoje nome da Casa da Cultura de Canguçu pela qual lutou.

Sua obra se traduz na criação e desenvolvimento do Museu Municipal Cap. Henrique José Barbosa, seu ancestral que morreu na Guerra do Paraguai, de onde enviou cartas à família com riquíssimas informações históricas de natureza militar.

Para dar continuidade a este esforço de resgate, culto e divulgação da História de Canguçu, foi criada em 13 de setembro de 1988 a Academia Canguçuense de História (ACANDHIS) tendo como patrono Conrado Ernani Bento que não sendo historiador teve a sensibilidade de colecionar e preservar por mais de 50 anos documentos históricos da maior importância para restauração da história de Canguçu que realizamos com grande esforço e amor, sobretudo à terra natal e em memória dos nossos ancestrais das famílias Gomes, Silveira, Vaz, Borba, Matos, Oliveira, Moreira e Bento, povoadoras de Canguçu.

As duas últimas chegadas com a criação do município em 1957 , com Ignácio José Moreira, primeiro funcionário da Justiça em Canguçu e que fora uma espécie de chefe de gabinete do Ministério do Interior da Republica Rio Grandense e de Antônio Joaquim Bento, o primeiro professor régio para meninos de Canguçu e filho do Alferes Antônio Joaquim Bento que chegara ao Brasil como integrante da Divisão de Voluntários Reais de Portugal que incorporou o atual Uruguai ao Brasil de 1821/28 como Província Cisplatina.

Desmobilizado Antônio Joaquim em Piratini ele e seu amigo Vicente Ferrer de Almeida casaram com duas filhas do português natural de Guimarães e nosso tetravó José de Mattos que instalou em Piratini um moinho que deu o nome do arroio do Moinho e que construiu a 1a igreja de Piratini .Arroio a margem do qual se instalou a primitiva Vila dos Casais, conforme abordamos em nossa plaqueta Piratini um sagrado símbolo gaúcho farrapo.Resende-RJ:IHTRGS/ACANDHIS,2.000.

Como farrapo Antônio Joaquim Bento(pai) teria sido o primeiro professor de Alegrete e Vicente Ferrer oficial do Corpo de Lanceiros Negros e funcionário do Ministério da Guerra e da Marinha, segundo concluímos da leitura do jornal O Povo da República Rio Grandense.

E pensar que toda esta história aqui restaurada estava completamente esquecida pela comunidade por coberta pela patina do tempo, a qual com paciência, persistência a removemos com nossas pesquisas iniciadas em 1957,Centenario do Município de Canguçu.

Como canguçuense me sinto orgulhoso e realizado .E espero que outros continuem este trabalho e que não mais permitam que Canguçu pelo desconhecimento de seu passado se torne de novo uma nau sem bússola, perdida no meio de uma tempestade sem saber de onde é que veio , onde é que esta e para onde é que esta indo.

Cabe aqui ressaltar os resgate genealógico de povoadores de Canguçu que conseguimos em Petropolis-RJ ,com o grande genealogista Carlos Grandmasson Rheingantz e que publicamos em Canguçu reencontro com a História e bastante ampliados pelas notáveis genealogistas Ilka Guittes Neves em Canguçu - RS primitivos moradores, primitivos batismos1800/1915(Pelotas:UFPel,1998) por nós apresentado e por Alda Maria de Moraes Jaccottet .Cadernos de Genealogia -Obstinadas famílias de Canguçu-RS Livro n o 1 B de batismos 1813-19.Pelotas,1999 e mais de Adolfo Fetter Junior . Os Vetter/Fetter 170 anos de Rio Grande do Sul e Brasil. Pelotas: Edição do autor,1997.

Obra que contou com nossa colaboração as p.6,485,486(nota) e com obras nossas relacionadas a p.517, em que esclarecemos a participação na Revolução Farroupilha, do Sargento Jacob Fetter que inclusive viveu em Canguçu como comandado de Chico Pedro ou Moringue.

Não podem serem esquecidas as atas de sessões da Academia Canguçuense de História em seus mais de 10 anos de funcionamento, primorosamente registradas pela secretária professora Aliete Ribeiro e que estão em processo de digitação pelo acadêmico Cairo Moreira Pinheiro, podendo brevemente serem difundidas pela INTERNET.

Eis ai um valioso conjunto de fontes sobre as história de Canguçu e de sua gente para se levar avante a idéia de pesquisar, preservar, cultuar e divulgar a História, a Tradição e o valores culturais e históricos de Canguçu .

Tarefa muito relegada talvez por Canguçu não ter antes possuído historiadores para realizar esta tarefa como aconteceu com outras cidades e que as projetaram no cenário estadual.

Não se pode esquecer a contribuição do canguçuense Major Angelo Pires Moreira que copiou de jornais antigos na Biblioteca Pública de Pelotas , notícias sobre Canguçu as quais incorporamos na Revista Canguçu 200 anos e que constam, em encadernação por nós mandada fazer, do Arquivo de Conrado Ernani Bento com a sua nora Professora Yonne Maria Sherer Bento, vice presidente da ACANDHIS.

Com esta síntese e as fontes históricas nela indicadas pode o perquisador e leitor interessado aprofundar e mesmo desenvolver a História de Canguçu.